9 Maio 2024, Quinta-feira

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Contributo para a preservação e autenticidade das tradições populares de Sesimbra

Contributo para a preservação e autenticidade das tradições populares de Sesimbra

Contributo para a preservação e autenticidade das tradições populares de Sesimbra

Terminadas as celebrações do Carnaval no nosso concelho, momento de grande folia e diversão das massas, cabe-me trazer uma reflexão, no seguimento do trabalho de aprofundamento, pesquisa e investigação para o Grupo Folclórico de Sesimbra, sobre as tradições populares do concelho de Sesimbra e sua região dos finais do século XIX e inícios do século XX com recurso à etnografia e transmissão oral dos costumes das nossas gentes.

Entrudo ou Carnaval? São ambas designações, de terminologia popular, que fazem referência ao mesmo período, os três dias que antecedem a Quaresma. É perfeitamente compreensível que este período, em tempos mais remotos, fosse tempo de excessos, expressões satíricas, de comida e bebida fartas, já que se ia entrar num período mais austero até à Páscoa. Todas essas manifestações preservaram-se num passado memorável.

Em Portugal, nem sempre as celebrações deste período tiveram o seu foco nas máscaras e nos disfarces, sendo por isso uma festa marcadamente de “rua”. Percebe-se que a Igreja Católica e o espírito renascentista impusessem um comportamento social menos efusivo nas comemorações deste período até ao início da segunda metade do século XX. O trabalho etnográfico revela que o objetivo não foi decerto conseguido. O lado profano deste período foi sempre preservado na ruralidade do nosso país.

Pelo concelho de Sesimbra e por algumas localidades dos concelhos limítrofes, o Carnaval era celebrado nas ruas e nos clubes (casas onde se realizavam os famosos bailes de máscaras para os mais libertinados e endinheirados) de dia e de noite através de “brincadeiras” – era o termo utilizado pelos populares para descrever esses momentos de folia – destacavam-se as cegadas, as contradanças de Entrudo e as cavalhadas, os bailes de roda, meros convívios (familiares ou comunitários) e os jogos de rua (nas tabernas) que hoje consideramos tradicionais. Das brincadeiras de rua, há ainda certamente quem se recorde de esconder ou sujar as aiolas ao proprietário, atirar baldes de água suja, o «badalo» nas portas das casas das moças solteiras, os sacos de farinha ou de feijões que extravasavam este período, entre outras partidas que já na década de 1930 entraram em desuso.

A Terça-Feira «Gorda» era o dia mais efusivo da festa já que a ideia primordial da profanação do Carnaval era tirar a “barriga de misérias” antes do período de abstinência da carne, obrigatório antes da Quaresma que tinha o seu início na Quarta-Feira de Cinzas, dia em que se realizava em algumas localidades do concelho o «Enterro do Entrudo» (julgamento” de um boneco feito de palha ou trapos velhos), associado à punição dos pecados, à expurgação e purificação desta ou daquela comunidade/aldeia, uma vez que se ia dar início a um período de espiritualidade mais intensa).

Há umas décadas atrás, a prática do «Enterro do Entrudo» em Quarta-Feira de Cinzas foi substituída na vila piscatória de Sesimbra pelo «Enterro do Bacalhau». Estou certo de que esta prática “ressurgiu” na vila piscatória por mera confundibilidade da tradição oral. Nos dias que correm, as tradicionais Cavalhadas continuam a encher as ruas de Alfarim. No sentido contrário, as Cegadas e a Contradança têm tido a sombra provocada pela preferência nas Escolas de Samba. Hoje, é imperativa a recuperação desta última tradição (a contradança que era um baile mandado), tarefa que considero estar ao alcance do Grupo Folclórico de Sesimbra, para que seja posteriormente divulgada envolvendo as populações. Não chegam aos dedos de uma mão os grupos de «cegantes» ativos no concelho e apesar de reconhecer o apoio que as autarquias locais lhes têm dado, continua a não ser o bastante para que as estas tradições perdurem na nossa memória coletiva. Acho que deve começar nas escolas a divulgação e o estímulo sobre a nossa história local envolvendo os jovens nestas dinâmicas, explicando-lhes a importância social que tiveram para os nossos antepassados. Com a mesma responsabilidade, devem ser as direções das associações culturais e recreativas a tomar estas iniciativas, criando espaços para a promoção das nossas tradições. O desprezo, e pior, as adulterações às nossas tradições, põem em causa a sua preservação e, por consequência, a perda da identidade do povo sesimbrense.

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