Hoje, vivemos num mundo, ameaçado por guerras fratricidas (uma verdadeira terceira guerra mundial aos pedaços, como diz o nosso Papa Francisco), em risco de destruição, pela potência e qualidade das armas que a ciência, a tecnologia e a florescente e rentável indústria de armamento espalha pelos quatro cantos do planeta, já atingido, também, pelas tremendas alterações ecológicas que o podem tornar inabitável.
Porém, parece-nos que o perigo fundamental vem do desprezo pela ética nas relações humanas e pelo esquecimento total da dignidade da Pessoa, tornada peça de máquina e puro e simples elemento de produção. Num mundo assim, algo é urgente mudar.
«Infelizmente, nos nossos dias – enquanto sobressai cada vez mais a riqueza descarada que se acumula nas mãos de poucos privilegiados – frequentemente acompanhada pela ilegalidade e a exploração ofensiva da dignidade humana – causa escândalo a extensão da pobreza a grandes setores da sociedade no mundo inteiro», disse o Papa Francisco no Dia Mundial dos Pobres. E tudo isto atravessa o nosso tecido social nacional, agravado por anos de uma austeridade que sacrificou as classes médias e mais pobres, numa falaciosa tentativa de resolver os nossos graves problemas económicos e financeiros.
E porque Setúbal não é uma ilha imune a estes riscos e perigos, mas é, pelo contrário, uma das zonas mais frágeis do país, atravessada nas últimas décadas por crises bem específicas, ainda longe de devidamente saradas, mais urgente se torna, para nós , esse afã de mudança para algo de melhor e que seja bálsamo para as feridas existentes que a maioria sente dificuldade em cicatrizar.
“Se desejarmos dar o nosso contributo eficaz para a mudança da história, gerando verdadeiro desenvolvimento, é necessário escutar o grito dos pobres e comprometermo-nos a erguê-los do seu estado de marginalização.” (P. Francisco). E a Igreja, Povo de Deus congregado em Diocese, em redor do nosso terceiro Bispo, distingue-se de alguma maneira deste panorama trágico do mundo e do País? Não estarão esquecidas, por todo o lado, as nossas raízes judaico-cristãs?
A realidade é que a força do Cristianismo foi diminuindo e perdendo capacidade de mudança, milénio a milénio. Foi pujante num primeiro milénio, foi amplamente contaminado num segundo, pelos vícios e doenças do mundo civil, deixou-.se atingir por um formalismo tremendo e anquilosou-se em fórmulas sem vida, em ritos sem penetração no coração dos fieis, esquecendo-se daqueles por quem Deus se fez homem em Jesus Cristo: os pobres, os marginalizados, os doentes, os velhos não produtivos, os refugiados etc., etc.. Nem as várias tentativas de intervenção dos Papas, com encíclicas sobre os problemas sociais (um conjunto conhecido por Doutrina Social da Igreja – DSI), magníficas, algumas, verdadeiramente, revolucionárias, nem mesmo os muitos documentos do Concilio Vaticano II, em boa hora convocado por João XXIII, consciente da urgência da tal mudança, provocaram uma reversão dos males da nossa sociedade. E no Ocidente notou-se mesmo um verdadeiro retrocesso das adesões verdadeiras a Jesus Cristo. “Não podemos amar com palavras, mas com obras” diz Francisco, mas tal é pouco visível na nossa vida do dia-a-dia.