Confira as reações. “Montijo com Visão e Coração” conquistou a Câmara, perante ascensão meteórica do Chega e derrocada do PS. CDU fez o pior de sempre e PSD/IL teve derrota agridoce
A nova configuração autárquica no Montijo, resultante da noite eleitoral de domingo, pode resumir-se em cinco partes: uma vitória inédita; uma ascensão meteórica; uma derrocada; uma hecatombe; e uma derrota agridoce.
Inédito foi o facto de um movimento independente (“Montijo com Visão e Coração”) – embora com os apoios de BE e CDS – se ter apresentado a votos e, além disso, ter cantado vitória, com a conquista da Câmara Municipal e de três das cinco juntas de freguesia.
Meteórica foi a ascensão do Chega, que ficou a 615 votos de arrebatar a Câmara, mas que venceu a contagem para a Assembleia Municipal e uma junta de freguesia, passando a ser a primeira força político-partidária no concelho (se não se considerar como tal o movimento independente, vulgo grupo de cidadãos).
Derrocada foi o que teve o PS, que perdeu a Câmara e ficou reduzido à expressão mínima de um eleito no executivo (tinha três), além de ter perdido ainda as quatro juntas de freguesia que detinha e de se ver relegado de primeira para quarta força política mais votada na Assembleia Municipal.
Hecatombe foi o que aconteceu à CDU, que quase desapareceu do mapa autárquico montijense: pela primeira vez desde 1976, o PCP – que suporta a coligação – ficou sem representatividade no executivo da Câmara (perdeu os dois vereadores que tinha); a par disso, perdeu a única junta de freguesia que conquistara em 2021, assistindo à candidata que lhe havia valido o triunfo de há quatro anos a celebrar de novo, mas agora com “Visão e Coração”. Pior ainda foi o resultado da CDU no cômputo geral, que se traduziu num mínimo histórico, ou seja, apenas na eleição de três autarcas – um mandato para a Assembleia Municipal e dois para assembleias de freguesia –, passando de terceira para quinta força política mais votada.
Agridoce (mas mais amarga do que doce) foi a derrota da coligação PSD/IL, que não evitou a perda de um dos dois vereadores conseguidos nas autárquicas anteriores pela coligação entre PSD, CDS e Aliança, mas que, como “prémio de consolação”, festejou a conquista de uma junta de freguesia. Acresce que, para a Câmara Municipal, o PSD, a solo ou em coligação, nunca havia baixado do “pódio”, como agora aconteceu ao passar de segunda para quarta força política mais votada.
Câmara Municipal
Liderado por Fernando Caria, o movimento “Montijo com Visão e Coração” (MVC) venceu a Câmara Municipal com 6440 votos (27,48% da votação). O resultado traduziu-se em três mandatos para os independentes (presidente e dois vereadores), ou seja, numa maioria relativa.
O Chega foi a segunda força mais votada, registou 5825 votos (24,79%), que comparam com os 1320 (6,60%) arrecadados há quatro anos, e elegeu pela primeira vez para o executivo (dois vereadores).
O PS, que detinha o poder há 28 anos, averbou 4049 votos (17,24%) – o pior resultado de sempre em número de votos e percentagem (ainda assim, uma votação superior à alcançada para a Assembleia Municipal) – e ficou com um vereador. Nas eleições anteriores havia somado 5897 votos (29,49%) e conseguido três mandatos.
A coligação PSD/IL elegeu um vereador com 3917 votos (16,67%), ao passo que em 2021 a coligação PSD/CDS/A conseguira 5547 (27,74%), obtendo então dois eleitos, e a IL, a solo, registara 871 votos (4,36%).
Já a CDU, que não elegeu, quedou-se pelos 1694 votos (7,18%): há quatro anos alcançara 3879 (19,40%) e dois vereadores.
Com esta distribuição de mandatos, se o MVC quiser ter garantida estabilidade governativa terá de chegar a entendimento com um vereador da oposição. Nesse contexto, a atribuição de pelouro(s) a um eleito de uma força política adversária deverá ser a solução, sendo que o vereador do PSD levará vantagem na preferência, já que o PS foi de onde Fernando Caria se desvinculou e existem feridas por cicatrizar e o Chega, para o novo presidente da Câmara, é carta fora do baralho.
Assembleia Municipal
Para a Assembleia Municipal, o triunfo eleitoral pertenceu ao Chega, que passou de 1470 votos (7,35%) para 6 046 votos (25,78%). Porém, o MVC, com menos votos – 8002 (25,56%) – acabou por averbar mais mandatos no órgão deliberativo. É que o Chega somou seis mandatos mais um por inerência de uma presidência de junta conquistada (sete deputados municipais); e o MVC junta aos cinco mandatos que arrecadou três inerências pelas presidências de junta alcançadas (oito deputados). O Chega nas autárquicas anteriores tinha alcançado um mandato.
Na coligação PSD/IL foram contabilizados 4023 votos (17,14%), que comparam com os 5303 (26,52%) obtidos em 2021 pela coligação PSD/CDS/A. A coligação PSD/IL elegeu agora quatro membros mais um por inerência (cinco deputados). Há quatro anos a coligação PSD/CDS/A conseguira sete e a IL, a solo, um eleito.
O PS caiu de primeira para quarta força mais votada com 4015 votos (16,90%) e ficou-se por quatro mandatos. Há quatro anos, os socialistas, fruto de 5857 votos (29,29%), haviam eleito sete deputados municipais mais quatro por inerências das juntas (11 no total).
Já a CDU quedou-se pelos 1799 votos (7,82%) – nas eleições anteriores teve 3772 (18,86%) – e passou de cinco mandatos (um era por inerência) para, agora, apenas um.
E o Livre, que se estreou em eleições autárquicas no Montijo, alcançou 1031 votos (4,38%) e conseguiu eleger um deputado municipal.
A Mesa da Assembleia Municipal (presidente, 1.º e 2.º secretário) será eleita no dia da tomada de posse, logo após a instalação do órgão e da subsequente primeira reunião que permitirá a votação dos membros do órgão deliberativo.
Estes resultados foram atualizados face à recontagem de votos que terminou ao início da tarde desta sexta-feira.
Freguesias MVC ganha três e Chega e PSD/IL uma cada
O MVC venceu três juntas de freguesia, o Chega uma e a coligação PSD/IL outra. O PS perdeu as quatro que detinha e a CDU deixou escapar a que (re)conquistara em 2021.
Por dez votos de diferença para o Chega, o MVC conquistou a União das Freguesias de Pegões (Carla Pereira é a nova presidente), que era detida pelo PS. O MVC conquistou ainda a União das Freguesias de Montijo e Afonsoeiro (passa a ser presidida por Vasco Fernandes, que sucede no cargo a Fernando Caria, eleito em 2021 pelo PS), e a Junta de Freguesia de Sarilhos Grandes (Dinora Caetano foi reeleita presidente), que pertencia à CDU.
O Chega ganhou a União das Freguesias de Atalaia e Alto Estanqueiro-Jardia (passa a ser presidida por Pedro Araújo) com uma margem de 78 votos de diferença para o PS, que era poder.
E a coligação PSD/IL arrebatou, também ao PS, a Junta de Freguesia de Canha (Henrique Gomes é o novo presidente) por 34 votos de diferença para os socialistas. Todas as juntas têm maioria relativa.
REAÇÕES
Fernando Caria: “Pelouros? Tenho ‘linhas vermelhas: o Chega é o único partido antidemocrático”
Fernando Caria diz não se ter debruçado ainda sobre a questão da estabilidade governativa, mas descarta desde já qualquer tipo de entendimento com o Chega, através da atribuição de pelouros.
“Só depois da tomada de posse é que iremos ver os cenários possíveis. Vamos conversar com todos os partidos democratas. Há ‘linhas vermelhas’ que tenho. O Chega é o único partido que considero antidemocrático. Não temos nenhuma hipótese em cima da mesa [para atribuição de pelouros]. Deixo a porta aberta a quem queira trabalhar connosco em prol do Montijo”, disse o recém-eleito presidente da Câmara Municipal do Montijo.
Quanto ao triunfo alcançado, Fernando Caria não esconde que “seria melhor ganhar com maioria absoluta”, porém, foi “claramente um bom resultado”.
“Ganhámos, foi aquilo a que nos propusemos, para se fazer a mudança que o Montijo precisa. O melhor resultado seria ganhar com maioria absoluta. Ainda assim, estamos satisfeitos pela confiança que os montijenses depositaram em nós e estamos preparados para cumprir com aquilo que propusemos aos montijenses”, concluiu.
Nuno Valente: “Não queremos lugarzinhos, queremos reformas e um Montijo com futuro”
Fernando Caria não equaciona sequer atribuir pelouros ao Chega, mas do lado do partido de André Ventura também ninguém os quer aceitar. Quem o garante é Nuno Valente, que foi cabeça de lista à Câmara Municipal do Montijo pelo Chega, acabando eleito para a vereação, ao mesmo tempo que promete liderar a oposição no executivo com sentido de responsabilidade.
“Os montijenses podem esperar do Chega e dos nossos autarcas responsabilidade, exigência e coragem nesta função de liderança da oposição. Não seremos força de bloqueio sempre que os interesses dos montijenses estejam em primeiro lugar, não queremos lugarzinhos, queremos reformas, acção e um Montijo com verdadeiro futuro”, disse.
Sobre o resultado obtido pelo partido no concelho, Nuno Valente considera-o “espetacular” e justifica: “Passámos a ser o maior partido político no Montijo e por isso o nosso enorme obrigado aos homens e mulheres que confiaram em nós. Tínhamos dois autarcas em 2021 e passámos a ter 22 em todos os órgãos do concelho com a exceção de Canha.”
O também coordenador da estrutura local do Chega reforça que os eleitos vão assumir funções “com orgulho, brio e muita vontade de trabalhar”.
Ricardo Bernardes: “Os montijenses penalizaram bastante o PS nas coisas que correram menos bem”
O PS sofreu uma pesada derrota no último domingo. Ricardo Bernardes, que encabeçou a candidatura socialista e foi eleito vereador, reconhece que o resultado foi desastroso, apesar de vincar que o aceita humildemente.
“Aceito com humildade democrática o resultado eleitoral e desejo as maiores felicidades a quem venceu. Penso que os montijenses penalizaram bastante o PS e o governo do PS nas coisas que correram menos bem, sobretudo, na área da higiene e limpeza”, afirmou o socialista.
Sobre se irá renunciar ao mandato, Ricardo Bernardes é perentório: “Vou assumir funções, o mandato é para levar até ao fim”.
E em relação à disponibilidade para receber pelouros atribuídos pelo presidente da Câmara, o socialista prefere não abrir o jogo. “Desculpe, mas, por enquanto, escuso-me a comentar”, disse, a finalizar.
Pedro Vieira: “Acordo? Será uma situação que terá de ser avaliada com o partido”
Quem não fecha a porta a um possível entendimento com Fernando Caria, tendo em vista a aceitação de pelouros, é Pedro Vieira, que se candidatou à presidência da Câmara do Montijo pela coligação PSD/IL.
“Neste momento, não há nada em cima da mesa. Qualquer situação, se vier a existir, terá de ser avaliada com o partido”, disse o social-democrata.
O resultado de domingo “não foi o mais desejado”. O objetivo da coligação PSD/IL, admite, era “ganhar a Câmara”. E desdramatiza: “Os resultados não foram maus, face às circunstâncias – só fui candidato a partir de Junho –, até porque ganhámos uma das poucas juntas de freguesia que o PSD conquistou no distrito de Setúbal e conseguimos eleger um vereador”.
Ao mesmo tempo, Pedro Vieira lembra que o PSD partiu em desvantagem. “Conseguimos ultrapassar uma dificuldade que havia no PSD e apresentámos uma candidatura digna, sem entrarmos em ataques pessoais”, frisou.
A terminar, o social-democrata mostrou-se confiante no futuro do partido no concelho. “O PSD continua a ser peça fundamental para o concelho. Já houve momentos políticos em que o PSD teve resultados piores, como em 2017”, rematou.
João Pereira: “Resultados afirmam duas forças emergentes: o movimento independente e o Chega”
Quem também já reagiu foi João Pereira, coordenador do Núcleo Territorial do Montijo da Iniciativa Liberal (IL), que, em conjunto com o vice-coordenador daquela estrutura, Gonçalo Magano, considerou que os resultados “revelam a afirmação de duas forças políticas emergentes no concelho: o movimento independente e o partido Chega”.
“Em contrapartida, os partidos tradicionais registam um forte recuo. A CDU praticamente desaparece, ficando reduzida a um deputado municipal e dois nas assembleias de freguesia – um no Montijo e outro em Sarilhos Grandes – perdendo para os independentes a única freguesia que governava. O PS, o grande derrotado da noite, não vence em nenhuma freguesia, reduz o número de vereadores de três para um e passa de 11 para três mandatos [quatro após recontagem] na Assembleia Municipal”, afirma, em comunicado.
Já sobre a coligação PSD/IL, o liberal destaca a “conquista da Junta de Freguesia de Canha”, mas esquece a eleição de um vereador, que, em relação àquilo que o parceiro de coligação PSD conquistara em 2021, constitui a perda de um eleito no executivo.