11 Dezembro 2023, Segunda-feira
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Maria O’Neill, uma mulher socialista na 1ª República

“O seu cadáver foi lançado ao mar nas alturas de Pernambuco, com o ritual que é costume empregar-se em casos desta natureza” [contava O Setubalense, 04/04/1932, pág.8].

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Assim desapareceram os restos mortais de uma figura ímpar do feminismo português, falecida aos 59 anos de idade, quando viajava de barco do Brasil para Lisboa.

O seu nome era Maria O’Neill.

Salientou-se no «Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas», uma associação feminista fundada em 1914 (que acabaria dissolvida pela ditadura de Salazar).

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Fez parte da comissão organizadora do 1º congresso feminista em Portugal (em 1924) e da Liga Abolicionista, uma associação (fundada em 1926) que pugnava pelo fim da prostituição.

Escritora e de família abastada, até correspondia à imagem mais visível do feminismo europeu da época, protagonizado por intelectuais de classe média, particularmente minoritário num país como Portugal – onde cerca de 80% das mulheres eram analfabetas.

Mas a 1ª República recusou o direito de voto às mulheres. E esta desilusão levou Maria O’Neill a seguir um caminho diferente: em 1919 aderiu a um partido operário e marxista – o antigo Partido Socialista Português.

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Dizia ela que “A mulher portuguesa trabalhou activamente na implantação da república, esperando que raíasse para ela uma aurora de libertação. Enganou-se e enganaram-na”. Na luta contra a monarquia, “a voz da mulher serviu na propaganda pública, a sua acção fez-se sentir no trabalho clandestino, mas, aproveitada como um instrumento, não lhe reconheceram capacidade para defender os seus direitos” [O Combate, 20/02/1920, p.1].

Perante esta desilusão, Maria O’Neill concluia que “não há nenhum programa de partido político, em Portugal, que reconheça plenamente os seus direitos senão o do partido socialista, e nenhum onde as ideias sejam mais justas, amplas e humanitárias”, o que a leva a afirmar que “o futuro da mulher está, pois, no socialismo” [ibidem, 29.04.1919, p.3].

Além deste âmbito partidário, a ligação de Maria O’Neill ao movimento operário passou por conferências em diversos sindicatos e também em associações como A Voz do Operário – na qual  terá sido, em 1926, a primeira mulher eleita para os corpos sociais, como membro da comissão de instrução, educação e arte.

Assumiu também algumas responsabilidades no âmbito do Ministério do Trabalho. Foi  vogal (e única mulher) de uma comissão de promoção do mutualismo. E foi presidente da «Bolsa de Trabalho Feminino de Lisboa»: uma experiência de centro de emprego especificamente para mulheres.

N’O Setubalense

Entre 1921 e 1930, além de alguns poemas, O Setubalense publicou um artigo de Maria O’Neill em destaque na primeira página.

Aludia a uma proposta de lei sobre trabalho feminino, apresentada seis meses antes pelo governo. Mostrava-se descrente e desiludida. Alegava que já vários projectos haviam aparecido para ficar na gaveta. E mesmo os que chegavam a ser lei “não passam, a maior parte das vezes, de letra morta” [O Setubalense, 14/06/1921, p.1].

A 1.ª República portuguesa não era um caso isolado. A historiadora espanhola Gloria Nielfa assinala o “alto grau de incumprimento que se registou em diferentes países” à época, em matéria de legislação sobre trabalho feminino.

“Se nuns casos esse incumprimento se devia ao desejo de burlar a lei por parte dos patrões”, noutras situações a falha estava na “própria desconformidade” de leis em cuja elaboração as mulheres “não tinham tido nenhum tipo de participação e que muitas vezes não respeitavam os seus interesses” [Nielfa (2006), “La regulación del trabajo femenino”, p.346].

Perante esta realidade, o que Maria O’Neill expressou no O Setubalense foi um apelo no sentido das próprias mulheres se associarem e agirem em defesa dos seus direitos.

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