Uma das minhas actividades preferidas é a caminhada.
Um dos meus troços preferidos é precisamente o que se encontra interdito à circulação, ou seja, o que está compreendido entre o túnel da Figueirinha e a praia da Arrábida.
Muitas vezes, deixo o automóvel por ali e lá vou eu alegremente por essa estrada fora, apreciando o mar e a paisagem ímpar desta nossa magnífica região.
E já que nos encontramos na zona, permitam-se uma sugestão, esta bem mais fácil de resolver.
No troço situado entre o túnel da Figueirinha e Galápos existe um conjunto de árvores junto à estrada, do lado de fora (pinheiros mansos e alfarrobeiras) que se encontram perigosamente inclinados na direcção do mar.
Se se cortassem os ramos mais pesados que se encontram virados precisamente para o mar, aligeirava-se a sua carga e permitiríamos o seu reequilibro.
Vamos então ao assunto que aqui me traz.
Em termos geológicos, a Serra da Arrábida formou-se há cerca de sete milhões de anos, decorrente da colisão das placas Africana e Euro-Asiática, num processo que deu também origem ao mar Mediterrâneo.
A Serra da Arrábida estende-se segundo uma direcção Este –Oeste, desde o morro de Palmela até ao Cabo Espichel, numa área aproximada de 35 km de comprimento por 6 km de largura.
Na nossa zona possui duas vertentes; a vertente Norte sobranceira a Azeitão, muito mais estável e a vertente Sul, de orografia instável, irregular e abrupta, caindo a pique junto às nossas praias.
A serra da Arrábida é constituída essencialmente por calcário, que é uma rocha algo friável, ou seja, desagrega-se com a passagem do tempo e dos agentes erosivos.
E é aqui que a situação se complica.
Se observarmos com atenção toda a extensão da orla marítima, desde o Outão até ao Creiro, constatamos que se encontra pejada de pedregulhos, de dimensões variadas que se soltaram da vertente Sul e que foram rolando encosta abaixo, até ao mar, ao longo dos sucessivos séculos.
Essa vertente apresenta nesta extensão uma apreciável instabilidade, com inúmeros pedregulhos que estão posicionados para caírem.
Estamos, portanto, perante um dilema.
Sabemos que Troia, para os setubalenses, é um assunto encerrado. A antiga ligação umbilical entre Setúbal e uma das suas praias de eleição, terminou.
A última vez que lá fui, já foi há bastante tempo.
O preço individual dos ferrys é de 5,50 euros; automóvel ligeiro de passageiros (um passageiro), 21 euros; cada passageiro a mais, 5,50 euros.
Quanto aos catamarans, duas viagens custam 9,30 euros, pelo que uma família setubalense de quatro pessoas, para ir à praia paga 37,20 euros.
Somente transporte; fora o resto.
O desvio do ferry para a zona dos fuzileiros e os preços proibitivos que se praticam para fazer a travessia, foram determinantes para o afastamento dos setubalenses.
Resta-nos esta zona compreendida entre a Albarquel, Comenda, Figueirinha, Galápos, Galapinhos, Praia dos Coelhos e Arrábida.
Foi precisamente em Fevereiro de 2023 que, por razões de segurança, a Câmara Municipal de Setúbal determinou o encerramento deste troço, em virtude de haver o risco de queda sobre a estrada de um bloco rochoso com cerca de mil toneladas, localizado em terrenos propriedade da empresa Secil e em pleno Parque Natural da Arrábida.
Portanto, estamos a falar de dois anos consecutivos com os acessos proibidos.
Foi também recentemente anunciado pelo Governo um investimento de 20,2 milhões de euros em obras prioritárias de protecção do litoral, estando a minimização de risco desta zona, entre os investimentos governamentais.
Para a resolução deste problema complexo, temos três entidades directamente envolvidas, a saber: Ministério do Ambiente, Câmara Municipal de Setúbal e a Secil.
Sabendo de antemão que o problema não se circunscreve somente ao pedregulho em questão, mas a toda a área envolvente, urge que se tome responsavelmente um conjunto de acções que permitam restabelecer não somente a circulação rodoviária, mas também o usufruto balnear, bem como outras formas de actividade lúdica.
Sobretudo, deixar de empurrar as responsabilidades para outrem, a fim de possibilitar que estas três entidades possam trabalhar articuladamente, para a resolução deste problema complexo.
O que não podemos é continuar a estar indefinidamente impedidos de frequentar uma das nossas zonas mais bonitas e aprazíveis desta nossa bela região de Setúbal.