Foi aprovado em votação final global o Orçamento do Estado, na passada sexta-feira de manhã. Foi visível a triunfal satisfação do PS, do Presidente da República e dos representantes do grande patronato.
Da discussão e votação do Orçamento do Estado para 2022 podemos retirar três conclusões.
Primeira – a confirmação, para quem ainda tivesse dúvidas: o PS quis eleições para se desfazer da intervenção do PCP, e as primeiras consequências da maioria absoluta são estão bem à vista.
Segunda: a maioria absoluta do PS, ao recusar soluções para valorizar salários e pensões, ao afastar o controlo de preços de bens essenciais, é responsável por um corte de facto nos salários e nas pensões, pela especulação e empobrecimento que se abate sobre as populações do país e da região. Confirmou-se – a retórica do “orçamento mais à esquerda de sempre” mais não era do que uma piada de mau gosto.
Terceira: a maioria absoluta do PS não enfrenta – pior ainda, abraça – os interesses dos grupos económicos. E claro que aí não está sozinho: é sintomático que na rejeição das propostas que colocam em causa os interesses dos “senhores do dinheiro”, o PS tenha tido como aliados o PSD, a IL e o Chega.
Há uma enorme distância entre este Orçamento e os orçamentos anteriores, que confirma que os avanços alcançados nos últimos anos só foram possíveis, pela nossa persistência, e tantas vezes contra a vontade do PS.
Naquilo que é decisivo para o País, fica o PS com um Orçamento aprovado – mas os problemas dos trabalhadores e do povo não terão nele resposta.
O PS recusou valorizar os salários dos trabalhadores, como o PCP propôs, permitindo que uma inflação galopante se transforme em corte salarial.
O PS recusou o aumento extraordinário de todas as pensões em 5,3% e no mínimo de 20 euros, como o PCP propôs, impondo à larga maioria dos reformados perda de poder de compra em contraste com os últimos 5 anos.
O PS recusou a adoção de medidas para controlar e fixar preços nos alimentos, nos combustíveis, na eletricidade, e no gás, como o PCP propôs, deixando intocáveis a especulação e os lucros dos grupos económicos.
O PS recusou a implementação do regime de dedicação exclusiva e o alargamento da atribuição de incentivos para a fixação de profissionais de saúde em zonas carenciadas, como o PCP propôs, o que responsabiliza o Governo por mais de 1,3 milhões de portugueses sem médico de família, pelo adiamento de consultas, cirurgias, tratamentos e exames, pela continuada sangria de profissionais de saúde do SNS e pela transferência de recursos públicos para o negócio da doença de que vivem grupos privados, quando deveriam ser canalizados para investimento no SNS.
O PS recusou responder ao grave problema em que se transformou o acesso à habitação, optando por deixar as famílias e os jovens desprotegidos e à mercê de um mercado liberalizado que exclui uma grande parte da população de aceder a uma casa.
O PS recusou a criação de uma rede pública de creches e o alargamento da gratuitidade da creche, para finalizar o processo iniciado com a proposta do PCP.
A retórica das “contas certas” esconde o desastre das contas das famílias, quando os salários e as pensões não chegam até ao final do mês.
Contas certas, como vimos nestes meses, são os milhões de euros de lucros da GALP, da EDP, da SONAE, da Jerónimo Martins, da generalidade da banca privada. São esses os interesses que este OE defende. Esta é a realidade que deveria inquietar o Governo: um país mais injusto, desigual e dependente.
À hora em que o Orçamento era aprovado na Assembleia da República, os trabalhadores dos sectores públicos e privados faziam erguer a sua voz frente ao Palácio de São Bento, numa jornada de luta organizada pela CGTP-IN.
Os trabalhadores sabem que continuam a poder contar com esta força que não desiste de lutar por um Portugal com futuro. Mas já agora, convém que não falte a memória.