A greve é um direito constitucional, mas tem restrições que decorrem da necessidade de defesa de outros direitos constitucionalmente garantidos. Nas doutas palavras do Professor José João Abrantes, a greve é um meio de pressão dos trabalhadores, um instrumento da sua autotutela perante quaisquer instâncias que adotem decisões suscetíveis de os afetar, por terem a ver com o seu estatuto de trabalhadores assalariados.
É, segundo o Tribunal Constitucional italiano, um meio idóneo “para remover os obstáculos que impedem de facto a igualdade dos cidadãos e a participação dos trabalhadores na vida política, económica e social”.
A questão dos limites do direito de greve é, pois, fundamentalmente uma questão de concordância prática com outros bens e valores constitucionais.
A isso se reconduz o critério diferenciador da sua regulamentação nos chamados serviços essenciais: um conflito de direitos fundamentais, os quais são objeto de garantia na exclusiva medida em que o seu exercício requeira a manutenção desses serviços.
Obrigação de Serviços mínimos, um conceito determinado na legislação laboral e que perante necessidades sociais impreteríveis, reflete um dos mais significativos limites ao exercício do direito de greve, expressão da inevitável compatibilização com os restantes direitos fundamentais. Está-se perante os chamados “limites externos” desse direito como afirma o Professor Monteiro Fernandes, ou sejam, as fronteiras do seu exercício, balizadas no respeito pelos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade, a partir do imperativo de respeito de outras garantias constitucionais que com ele podem entrar em contacto.
Ora, sendo legitimo o protesto dos professores, é inegável que em alguns casos esse protesto ficou manchado pela radicalização da expressão, intolerante, violenta e racista, na qual a larga maioria não se revê.
Com efeito, uma classe que contribui para valorização da escola pública e na educação de excelência de milhares e milhares de crianças e jovens, não pode ver as suas justas reivindicações manchadas no chamado caso dos cartazes.
Por outro lado, e como supra descrito, o direito à greve tem limites quando confrontado com outros direitos, também eles constitucionais, que ao serem afetados impulsionam a ativação da obrigação de prestação de serviços mínimos e dos meios humanos para os assegurar, visando assegurar precisamente esses direitos.
Ora, o direito à educação é um direito constitucional, que sendo afetado pelo legítimo exercício do direito à greve, deve ser assegurado através de uma definição de serviços mínimos.
Na proteção da aprendizagem dos alunos, razão primeira e última para a existência de escolas e professores, e no desígnio comum de valorização da escola pública, o direito à educação não deve ser relegado para segundo plano, nem utilizado como arma de protesto, ainda para mais numa geração afetada pela fase mais difícil da nossa vida coletiva.
Chegados aqui e reconhecendo como válidas as reivindicações do pessoal docente e não docente, extensíveis e devidamente enquadradas em toda a administração pública, temos de ter a capacidade de perceber o caminho trilhado desde 2015.
Um caminho que continua a ser densificado e que tem o seu reflexo nas negociações entre Ministério da Educação e Sindicatos representativos de pessoal docente e não docente ou no acordo plurianual assinado entre Governo e sindicatos, em outubro de 2022, e que entre muitas outras medidas tem a valorização dos rendimentos dos funcionários públicos como um dos objetivos principais.
A reposição das 35 horas de trabalho da administração pública, a devolução dos cortes salariais e dos subsídios de Natal e férias, o descongelamento das progressões nas carreiras e a regularização de milhares de vínculos precários na administração pública são marcas da Governação do Partido Socialista num caminho de diálogo e concretização de medidas com efeito direto positivo na vida dos trabalhadores da administração pública, na qual se incluem os professores e o pessoal não docente.
E agora, uma vez mais, em diálogo e na busca de um consenso alargado, o Governo já fez aprovar um conjunto de medidas que dão passos assertivos na resposta às justas reivindicações dos professores.
O descongelamento das carreiras e recuperação do tempo de serviço em termos proporcionais à Administração Pública; o Acelerador de progressões para os professores mais prejudicados durante o congelamento, repondo a legítima expectativa de atingirem os escalões mais altos da carreira; a Vinculação extraordinária de mais de 14.000 professores nos últimos anos; a Redução da burocracia; o Novo modelo de colocação dos professores nas escolas, a iniciar em 2024/2025, pondo fim a uma vida de “casa às costas”; a Vinculação dinâmica permitiu colocação inédita de mais de 10.500 professores num ano; a Regularização da situação profissional dos docentes de artes visuais das escolas artísticas; a Contagem do tempo de serviço prestado em creche pelas educadoras para efeitos de concurso; a Criação de dois índices remuneratórios para professores contratados e a Vinculação dos professores das escolas portuguesas no estrangeiro e dos professores de educação tecnológica até aqui impossibilitados de entrar na carreira, são exemplos dessas medidas que seguem o caminho iniciado em 2015.
Podemos sempre afirmar serem poucas as respostas e exigir mais. Podemos sempre usar da critica e do protesto sem recurso à ofensa. Podemos continuar a negar os avanços alcançados nas negociações porque insuficientes.
Mas será injusto não reconhecer o caminho trilhado até aqui. Um caminho enquadrado numa agenda para o trabalho digno e de acordos em sede de concertação social, na valorização da escola pública, no combate à precariedade laboral, na valorização salarial e na conciliação entre a vida profissional e familiar.