Coisa mais natural deste mundo, o Avante! de 24 passado deu enfâse à vitória de Nicolas Maduro, e a favor dela. Não importa a página, mas, siga-se, na vigésima terceira há uma foto encimada por um título: “Opositores vencem eleições parlamentares no Iraque”, com destaque (que foram os que venceram): “O PCI” (Partido Comunista do Iraque) “apresentou-se às urnas com o movimento do clérigo Moqtada al-Sadr” (longe da maioria absoluta, certo).
Há foto, ainda por cima, com legenda: “Os comunistas iraquianos assinalaram o Dia do Trabalhador, em Bagdad, com os olhos postos nas legislativas”.
Sem culpa nossa, estão chamados de novo à cena – retoma – os intérpretes que se seguem, num arco temporal que nos permite chamar à liça a célebre frase “a história não se repete, gagueja”, porque nela ficou projectada não só a imagem do soldado norte-americano no propósito de cobrir com a bandeira dos USA o rosto da estátua de Saddam Hussein, minutos antes de ser apeada, mas também as palavras que alguém lhe ouviu pronunciar: “Cobrimos-te com toda a nossa vergonha de te ter armado até aos dentes com todo o tipo de armas para atacares o Irão e outros povos, designadamente o curdo!”
Se o soldado falou assim, é porque se confirmou que o Presidente dos Estados Unidos achou por bem enviar para todo o mundo e preferencialmente para o teatro da guerra a carta que Mia Couto lhe dirigira: “Sou um escritor de uma nação pobre, de um país que já esteve na vossa lista negra, enquanto a África do Sul do apartheid, violando de forma flagrante durante décadas os direitos humanos e fazendo de Moçambique uma vítima de agressão, beneficiou da vossa simpatia e mereceu da vossa parte uma atitude mais branda, ao mesmo tempo que o ANC de Mandela esteve também na lista negra como uma ‘organização terrorista!’ Estranho critério que levaria a que, anos mais tarde, os taliban e o próprio Bin Laden fossem chamados de ‘freedom fighters’ por estrategas norte-americanos” (reprodução livre).
Soa ainda a voz da exigência para que os Estados Unidos da América procedessem à eliminação do seu armamento de destruição maciça, com apurado e apertado controlo de uma equipa de inspectores das Nações Unidas deslocados para o país, já que, argumentava o escritor africano de língua portuguesa, “eles foram a única nação do mundo que lançou bombas atómicas sobre outras nações – e a ser condenada por ‘uso ilegítimo da força’ pelo Tribunal Internacional de Justiça. Que treinou e armou fundamentalistas islâmicos os mais extremistas (incluindo o terrorista Bin Laden) a pretexto de derrubarem os invasores russos no Afeganistão – e instruiu a CIA na ajuda ao assassínio de tantos dirigentes legítimos como Patrice Lumunba, preso, torturado e baleado na cabeça antes de o seu corpo ser dissolvido em ácido clorídico. Que apoiou fantoches como Mobutu Sese Seko, conduzido ao poder em troca de facilidades especiais à espionagem americana (de tal modo que o quartel-general da CIA no Zaire tornou-se o maior em África), não tendo a ditadura brutal deste zairense merecido nenhum reparo até deixar de lhe ser conveniente, em 1992 – e a invasão de Timor-Leste pelos militares indonésios, cujas atrocidades já no tempo de Clinton deste vieram a merecer apenas a comedida consideração de ser tratar de um assunto interno da Indonésia. Que albergou criminosos (recusando a sua extradição) como Emmanuel Constant, um dos líderes mais sanguinários do Taiti, responsável directo por forças para-militares que massacraram milhares de inocentes – e em Agosto de 1998 bombardeou no Sudão uma fábrica de medicamentos, designada Al-Shifa, não por engano mas como confessada retaliação dos atentados bombistas de Nairobi e Dar-es-Saalam. Que em Dezembro de 1987 foi o único país (junto com Israel) a votar contra uma moção de condenação ao terrorismo internacional (mesmo assim aprovada por cento e cinquenta e três países) – e em 1953 ajudou a preparar o golpe de Estado contra o Irão na sequência do qual milhares de comunistas do Tudeh foram massacrados”…
“Xiitas e comunistas pretendem implementar um programa assente em três pilares: fim do sistema de quotas, combate ao sectarismo e à corrupção. Além da reforma do regime, entre os objectivos político-sociais estão a convergência de todos os democratas e patriotas para garantir a segurança, o progresso e o primado do Estado de direito, afirma o PCI no texto publicado a propósito”.
Se a carta de Mia Couto tem data – há mesmo que recuar uns anos – este penúltimo parágrafo é do citado Avante! Pareça de um velho mundo, aconteceu agora! Já bastava!!