Muito recentemente um colectivo que se autodenomina Equipa Maravilhas com residência no Vale da Amoreira, Concelho da Moita, sempre a conexar reuniões à gastronomia, evocava o que só pode ter raiz popular: «O Poceirão é uma terra de bons vinhos, mas é onde os comboios param para meter água».
Foi quanto bastou para um desafio: «Vamos lá a lembrar. Enquanto paravam, íamos à Junta».
E é verdade, em tempos bem idos um Padre, o Padre Raimundo, ofereceu à Junta de Freguesia do Poceirão uma fotografia de Sebastião Salgado dos militantes dos Sem Terra do Brasil (MST) de punho erguido, e a sua afixação, bem à vista de todos nós naquele espaço público, estando datada do ano de 2000, também não podia de deixar de trazer à baila uma sessão de solidariedade com aquele movimento que o PCP levou a cabo na Junta de Freguesia do Pinhal Novo, não longe do trem-dito-cujo.
«Resgatar valores que foram destroçados pelo capitalismo é o objectivo da Reforma Agrária que queremos implementar no Brasil, cumprindo tão somente a Constituição de 1988», declarou então Rogério Pinto, membro da Coordenadora Nacional do MST, convidado do PCP – não deixando de estabelecer a síncope entre a génese da vila do Pinhal Novo, intimamente ligada à concentração de trabalhadores ferroviários e suas famílias, e a repressão que logo após o golpe ditatorial no Brasil se abateu sobre esta mesma classe, ao dizer: «eles, os coronéis, acabaram com a ferroviária, mas não acabaram com a marcha do trem da história».
Cobrindo a iniciativa, o Avante! sublinhava que «numa freguesia e num concelho, o de Palmela, onde uma ampla recolha de assinaturas em defesa da absolvição de José Rainha Júnior, militante do Movimento e julgado por um crime que não cometeu, teve inusitada adesão, ganhou particular significado o de facto entre os presentes na iniciativa Rogério Pinto ter sido o primeiro subscritor de um abaixo-assinado emanado do Conselho Português para a Paz e a Cooperação (CPPC), a dirigir à Embaixada de Israel em Lisboa reclamando o fim da violência do Exército Israelita sobre o povo palestino».
Não passava então muito tempo sobre a realização do XVI Congresso do PCP, cuja Resolução Política acentuava que «na valorização que o Partido faz da soberania nacional como espaço privilegiado e incontornável da luta de classes, os objectivos e a luta no plano nacional articulam-se dialecticamente com os objectivos e a luta de dimensão internacional cuja crescente importância se reconhece». E acrescentava, por isso, que «é dever dos comunistas e dos revolucionários actuar no sentido de ampliar a dimensão internacional e internacionalista da sua intervenção e procurar os problemas, reivindicações e objectivos gerais comuns susceptíveis de fazer confluir numa ampla frente anti-imperialista sectores sociais e políticos muito diversificados que lutam pela democracia, a independência nacional, a paz, a preservação do meio ambiente, o progresso social e – apresentado como alternativa ao actual rumo da evolução mundial – o socialismo».
A Intifada, como então escrevemos (estamos retomando, certo?), «tem-se feito pagar caro pelos tiros certeiros do exército sionista, sob as ordens em primeira linha de um governo sustentado por um partido filiado na Internacional Socialista, em desrespeito com a Convenção 242 do Conselho de Segurança da ONU. Deslumbra, no sentido épico da palavra, a quantidade de crianças e jovens que perecem na linha da frente. Mas é porque ali não pode ser de outra maneira, quando se confirma a asserção de Marx segundo a qual “são as massas que fazem a história”».
O pequeno acontecimento do Pinhal Novo, terra dos ferroviários, ilustrou que a solidariedade proletária uniu numa noite comunistas, os Sem Terra e os da Intifada. Reescrever que o PCP não perde o Norte – como acontece – acontece em todas as ferrovias donde saímos para chegarmos a todos os Vales do Mundo.