Por mais esforços que eu faça para não voltar ao tema covid19, os noticiários da TV, seja qual for o canal, não me permitem pôr o tema de lado. A verdade é que os noticiários desde as primeiras horas da manhã até eu decidir ir tentar dormir descansado, os noticiários me enchem os ouvidos com o número de casos em todos os países dos quatro cantos do mundo, bem como o número de mortos, chegando à minúcia de me mostrarem os cemitérios com as covas abertas num espetáculo deprimente. E repetidas as mesmas imagens em todos os noticiários sempre acompanhados de médicos ou técnicos de estatísticas dando opiniões, quantas vezes discordantes – é uma confusão, agravada com cada um a passar as culpas do crescimento da pandemia para os outros – ninguém assume que se está perante algo de novo e que se vai a pouco e pouco conhecendo o “bicho” e os seus comportamentos.
Alem da saturação, longe de me informarem, lançam-me em confusão pelas disparidades de opiniões. Parece que , pelo menos numa coisa todos estão de acordo : devemos usar máscara até nas ruas, devemos lavar as mãos com frequência e….fugir dos outros de quem devemos guardar, pelo menos, uma distância de dois metros. Numa sociedade onde devia cultivar-se a fraternidade, ensinam-me a fugir dos outros. Na minha formação médica aprendi que o homem se forma na convivência com os outros, e na minha formação cristã devo considerar o outro como meu irmão – até o Papa Francisco nos diz que devemos ser “responsáveis pelos outros”, que estamos todos no mesmo barco e que “ninguém se salva sozinho” Eu sou adulto e tenho muitas décadas de vida e sei compreender que o que me pedem é algo de transitório e sei compreender que todos temos a responsabilidade de não contribuir para a propagação da doença, mas as crianças que estão formando a sua maneira de ser e de viver em sociedade, como irão ser quando forem adultos? Que sociedade estamos a construir para as próximas décadas?
E depois todos sabemos que com os problemas graves de saúde ,e de difícil solução, vêm os problemas económicos e sociais. E que os mais pobres se não trabalham morrem de fome e que por isso se revoltam contra os confinamentos e as várias proibições, não só de ter lojas abertas mas também de verem fechados os locais de divertimento como bares, dancings ou cinemas e teatros. Muitas desta proibições são mal compreendidas quando as autoridades permitem ajuntamentos de milhares de pessoas a assistirem a corridas de automóveis ou jogos de futebol – onde está a coerência dos nossos decisores políticos e até dos responsáveis pela saúde pública? Tudo isto põe em destaque a competição entre a saúde e a economia, que sabemos ser o suporte da nossa sociedade.
O Corona vírus tem a virtude de ter posto perante todos nós esta evidência do poder do “deus dinheiro” e secundarizar a saúde do ser humano e de pôr a nu a desvalorização dos mais idosos duma sociedade como a nossa que vai envelhecendo inexoravelmente a par da diminuição da fertilidade dos nossos casais. E com o crescimento da pandemia, cresce o descontentamento dos marginalizados, surge a violência e a repressão das autoridades, tudo pondo em perigo a própria democracia. Na realidade estamos perante um dilema bem complexo de resolver. Há que pensar nele e os “outros” têm de tomar consciência de que têm de lutar pela sua solução. Só é preciso saber quem são os outros que devemos considerar “nossos irmãos”….e não nossos inimigos!!!
