Gracinda Oliveira, de 87 anos, é um exemplo dos saudosistas do passado. A simpatia pelo regime do Estado Novo levou a família a romper com ela
Era uma vez um português. Era uma vez um grande influente durante grande parte do século XX. Era uma vez um Chefe de Governo. Era uma vez o homem da Pátria. Era uma vez um homem que enalteceu Portugal. Era uma vez um homem de negócios. Era uma vez “alguém que só ao conhecer, se via a sua grandiosidade”.
É assim que, Gracinda Oliveira, aos 87 anos, descreve Salazar. Adepta inabalável do regime autoritário, afirma com convicção que as críticas ao líder eram injustas, provenientes de quem nunca compartilhou os privilégios de conviver com o homem que idolatrava.
Um dia, ao tentar apanhar o autocarro, viu-se impedida de o fazer devido à agitação que se sentia. Desconcertada, retornou à sua casa, onde, ao ligar o rádio, foi surpreendida pela notícia de que o 25 de Abril havia começado. O mundo de Gracinda desmoronou-se diante dela. “Não era o País perfeito, mas havia ordem. Nós sabíamos o que esperar e havia um sentimento de segurança, o que não há hoje.”, diz.
Gracinda Oliveira dedicou muitos anos da sua vida a trabalhar nos campos, colhendo a essência da terra que a viu crescer. Uma estória de sacrifício e perseverança começou a desenrolar-se quando, finalmente, atingiu a idade suficiente para começar o árduo trabalho de dona de casa.
No entanto, o destino reservou para Gracinda um caminho surpreendente quando ingressou no serviço doméstico de um senhor, amigo íntimo de Salazar. Recorda com nostalgia os dias em que se cruzava com o líder, testemunhando o que quase ninguém viu.
Gracinda, a mulher que viu para além da Revolução, agora vê-se entre dois mundos. Uma defensora ardente do passado, testemunha as mudanças que se desenrolam diante dos seus olhos. “O que se passa hoje, com Salazar não acontecia nem metade”, lamenta.
Uma história de descobertas e reviravoltas, faz com que Gracinda se relembre das dificuldades enfrentadas, mas também dos valores que eram cultivados. “A juventude de hoje não compreende aquela época, não era perfeito, mas dava uma estabilidade ao País que não temos agora”.
Filha de uma família tradicional, viu-se envolvida num dilema que dividia a sua casa, a discordância política durante o regime de Salazar.
Enquanto os seus familiares eram contra o governo autoritário, Gracinda mantinha uma visão distinta, apoiando as políticas em vigor. Essa divergência foi marcada por escolhas difíceis e uma quebra de laços que perdura até aos dias de hoje, “nunca me compreenderam” [silêncio].
Bruno Marques e Jéssica Dias * Estudantes de Jornalismo da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal