Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa destaca crescimento maior em Setúbal e progressos em Sesimbra e Almada
Em entrevista a O SETUBALENSE, Vítor Costa, presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa (ERT-RL), faz um retrato do turismo na região de Lisboa e na Península de Setúbal desde 2019 até ao presente, e partilha que “Setúbal, apesar da quebra comum a todas as regiões e a todos os países, provocada pela pandemia, revelou uma resiliência muito considerável”.
Com os olhos postos no futuro, considera que os dados disponíveis expressam uma evolução favorável com crescimento para a região, “o que nos permite estar optimistas, ainda que moderadamente porque a situação de guerra na Europa é sinónimo de incerteza e imprevisibilidade”.
Que retrato é possível fazer no presente do turismo na Região de Lisboa e na Península de Setúbal?
A região de Lisboa no seu conjunto teve um grande desenvolvimento turístico até 2019. Dentro dos destinos europeus urbanos, Lisboa foi o que cresceu mais em termos europeus e nacionais e no conjunto nacional o desenvolvimento do turismo foi bastante significativo. Subimos a quota de mercado de Lisboa até aos quase 26,5 por cento, tendo as dormidas como critério, aquele que nos é o mais desfavorável. Devido aos nossos produtos, se fôssemos contar outros critérios, como hóspedes estrangeiros ou receitas, estaríamos em vantagem. Nesse mesmo período, na Península de Setúbal implementámos uma estratégia diferente com a criação da ERT-RL na sua configuração actual, desde 2013. Sabemos que a base de partida é mais baixa em termos quantitativos e, portanto, o crescimento percentual não significa que haja um crescimento quantitativo maior. A cidade de Lisboa, por exemplo, representa cerca de 70 por cento do peso do conjunto da região. Na Península de Setúbal, verificamos crescimentos acima da média nalgumas zonas, nomeadamente Setúbal, e, não sendo igual, também em Sesimbra e Almada se registou essa tendência de crescimento. No último ano, no ranking dos municípios da região, Setúbal já foi o quarto destino em termos de dormidas: Lisboa, Cascais, Sintra e Setúbal.
E que razões podem estar na origem deste crescimento?
Fizemos um plano estratégico que contemplava uma posição diferente relativamente ao caminho estratégico dos anos anteriores. No fundo, uma contribuição da Península de Setúbal, juntamente com a parte norte da região, para um conjunto de um destino regional que se torna único pelas componentes diversas que tem, que inclui não só o city break mais tradicional como também a gastronomia, os produtos ligados ao mar, à natureza, ao vinho, entre outros. Passámos a ter no mercado internacional uma oferta muito diferenciadora. Nenhuma capital europeia e sua região tem o que Lisboa e a sua região podem oferecer e isso também beneficiou de alguma forma o crescimento verificado na Península de Setúbal, sendo certo que nalguns municípios a base de partida era muito baixa e alguns continuam ainda a ser até por falta de oferta. Não podemos ter um desenvolvimento turístico se não houver também oferta turística. Também o aspecto do investimento deve ser tomado em conta, para além deste conceito de destino turístico integrado, forte e diversificado com vários pólos, que fez sempre parte da nossa estratégia. Não é tudo igual e dentro de um destino regional desta dimensão há pólos diferenciados para os quais há estratégias específicas e eu considero que os números mais recentes são esmagadores em relação ao resultado que se verificou até 2019.
Em 2020, inicia-se a pandemia, pela qual o turismo foi uma das áreas mais abaladas. Como foi vivenciado esse momento?
Com a pandemia, a região no seu todo perdeu mais que as outras cidades europeias pelos seus produtos. As pessoas privilegiaram durante algum tempo destinos ligados ao campo, a locais em que não houvesse aglomerados urbanos. Mesmo na região a quebra não foi igual para todos. A cidade de Lisboa teve a queda maior dada a sua natureza de produto estritamente urbano. Outros destinos na Península de Setúbal mais ligados ao mar e à natureza registaram uma quebra muito menor, os efeitos não foram tão fortes como em Lisboa, Cascais e Sintra, mais consolidadas e dependentes do mercado internacional e não eram, pelo menos no caso de Lisboa, uma oferta de lazer ou ligado ao mar ou à natureza. Enquanto o conjunto da região quebrou 71 por cento no primeiro ano, em Setúbal, onde os produtos são aqueles que no quadro da diminuição global de procura foi o que as pessoas privilegiaram durante aquele período, registou-se cerca de 46 a 48 por cento. Para isto também contribuiu a acessibilidade aérea. Em termos de mercados internacionais turísticos a única forma de aceder a Lisboa é por via aérea. Durante a pandemia foram proibidas as viagens, ou fortemente limitadas, e enquanto para outras cidades concorrentes as pessoas podiam ir por outras vias para Lisboa simplesmente não vinham. Chegámos a uma quota de 20 por cento, face a 26 antes da pandemia, resultado também relacionado com o mercado nacional, muito exíguo. Somos apenas dez milhões e mesmo as pessoas dentro da região privilegiaram outros locais.
Neste período de retoma e recuperação, de que forma o sector se está a adaptar?
Nos mercados internacionais, a marca Lisboa está com muita força e desejo e nas alturas com maior abertura durante a pandemia percebemos imediatamente uma resposta dos mercados. As pessoas estavam com desejo de viajar, mais até do que antes. Entre Janeiro e Fevereiro deste ano, começámos novamente a notar um crescimento muito significativo relativamente ao ano anterior, ainda muito abaixo de 2019. Sobre Março ainda não temos os dados definitivos, mas as previsões de quem está no terreno são no sentido de um crescimento muito grande. Estimamos que podemos chegar ao fim deste ano com 80 a 85 por cento dos valores de 2019 e que em 2023 possamos já atingir esses valores.
Quais as expectativas para este ano e para um futuro próximo?
Estamos esperançados, ainda que com nuvens no horizonte, tendo em conta a situação de guerra na Europa que mais tarde ou mais cedo trará impactos económicos. Além da exiguidade do mercado nacional e da nossa região, com excepção de alguns locais, Sesimbra, por exemplo, que podem ser considerados destinos de férias, Lisboa, onde se concentra um terço da população, não é percebida como destino de férias. O nosso forte é o turismo internacional. O plano estratégico que entrou em vigor em Janeiro de 2020 reflectia a nossa realidade de termos de facto um destino grande, internacional, com grande dimensão e vários pólos e produtos transversais dentro desse mesmo destino. Com a pandemia, suspendemo-lo. Navegámos à vista durante esse período, tentando aproveitar oportunidades. Neste momento está em curso um trabalho de olhar para esse plano e ver que alterações eventualmente se justificam. Dentro de pouco tempo teremos novamente um plano estratégico actualizado para continuarmos o trabalho de desenvolvimento que não muda esta estratégia no seu essencial. Acredito que vai ser uma retoma para todos. Com certeza que Lisboa cidade vai continuar a ser a âncora e o chamariz, mas existem muitos projectos em curso e em intenção. É também necessário o investimento privado, nomeadamente na oferta. É preciso que apareçam mais hotéis e a questão da mobilidade interna, que não depende do sector do turismo e na qual tem havido uma evolução, nomeadamente através da AML, também tem de ser trabalhada. Quando dizemos que o Tejo é um dos nossos principais activos em termos turísticos é necessário que as pessoas possam ter acesso às duas margens de uma forma fácil e cómoda. A mobilidade e a acessibilidade interna são fundamentais para a coesão da região, não só turística, mas globalmente considerada para os cidadãos que nela residem e trabalham, sem esquecer a mobilidade externa, com a questão aeroportuária.
O atraso na construção do novo aeroporto de Lisboa é também motivo de preocupação?
Continuamos à espera de decisões e a verificar constrangimentos no acesso à região. Existem opiniões diferentes, mesmo a nível das entidades que integram a ERT-RL, mas é consensual que a solução actual é insuficiente para o nosso desenvolvimento e é preciso encontrar uma solução aeroportuária à altura de uma capital e da sua região com esta localização geográfica. Não nos deixa de preocupar que, neste momento, o aeroporto parece já não ser uma grande preocupação para o Governo, sabendo nós que existe em curso um processo de avaliação ambiental e já desde os anos 1960 se discute esta questão. As pessoas querem vir, e vêm apesar dos incómodos, mas a infra-estrutura actual não chega para tudo e não é só o turismo que a procura, também residentes, nómadas digitais e outros. Também a TAP tem uma operação do hub que ocupa metade do aeroporto, da qual apenas uma parte é turista, outra são pessoas que se deslocam de África, América Latina e outros locais e param em Lisboa para fazer uma conexão com destino à Europa. Para além disso, a TAP encontra-se a promover uma ponte aérea de Lisboa para o Porto com 50 ligações. Isto significa que as pessoas do Porto não têm ligações para os seus destinos, têm de vir para Lisboa, a 300 quilómetros de distância, onde o aeroporto está a ser ocupado com estas ligações, já para não falar dos impactos ambientais. Tudo isto junto torna claro que a situação actual não nos permite um grande desenvolvimento.