26 Junho 2024, Quarta-feira

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Vereadora renuncia ao mandato e arrasa Nuno Canta

Vereadora renuncia ao mandato e arrasa Nuno Canta

Vereadora renuncia ao mandato e arrasa Nuno Canta

Bronca no seio do PS. “A gestão da Câmara do Montijo tornou-se centralizada, fechada, opaca, que resulta da vontade e decisão unilateral”, diz Sara Ferreira

 

O processo de substituição da vereadora e vice-presidente Maria Clara Silva – que pediu suspensão de mandato por 30 dias por motivos de doença – na gestão socialista da Câmara Municipal do Montijo rebentou como uma bomba nas mãos de Nuno Canta, presidente da autarquia. O chefe do executivo partiu do pressuposto que Sara Ferreira aceitaria o cargo, a tempo inteiro, e fez constar essa informação nas duas propostas, para o efeito, que integraram a ordem de trabalhos da reunião desta quarta-feira, sem antes ouvir a socialista. Resultado: Sara Ferreira, que nas últimas duas sessões já havia substituído Clara Silva, renunciou ao mandato e, em carta aberta aos montijenses, enviada hoje à redacção de O SETUBALENSE, arrasa o comportamento do presidente.

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As duas propostas estão datadas de 22 de Maio e foram integradas na ordem de trabalhos que chegou às mãos dos vereadores no dia 26, mas Sara Ferreira só foi chamada a reunir-se com Nuno Canta no dia 29 (segunda-feira passada). Nesse encontro não houve “fumo branco” e a socialista comunicou a renúncia no dia seguinte, 30, véspera da sessão de câmara que seguiu no canal do município no YouTube. E as explicações dadas pelo presidente, no decurso da sessão, ao vereador João Afonso (PSD) não caíram bem a Sara Ferreira, que reagiu com fortes críticas ao líder do executivo.

“Esta é a realidade e ela é lamentável de constatar, um presidente de câmara que falta à verdade à Câmara Municipal e a todos os montijenses não só é lamentável como é indigno institucionalmente. Entendo que os cargos políticos devem ser exercidos num quadro de cooperação, de diálogo, de lealdade, de transparência e de respeito para com os pares, o que é bom de ver que não acontece na Câmara Municipal do Montijo”, atira Sara Ferreira, na missiva dirigida aos montijenses que fez chegar a O SETUBALENSE.

No documento, a socialista sublinha que “não está em causa o cumprimento do enquadramento legal para a especificidade da situação”. “Está em causa, sim, a forma, o comportamento adoptado pelo presidente Nuno Canta (…) que, na minha opinião, diz muito sobre o estado actual da gestão da Câmara Municipal do Montijo, que se tornou centralizada, fechada, opaca, que resulta da vontade e decisão individual e unilateral”, dispara.

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“Gravidade extrema” e “trapalhada”

Sara Ferreira vai mais longe e deixa algumas questões, retóricas, quanto à forma como Nuno Canta liderou o processo de substituição.

“Mas alguém acredita que perante uma situação desta natureza, um presidente de câmara não fale, não exponha, não informe, não cuide de saber da disponibilidade e de informar sobre as tarefas que pretende que o substituto venha a desempenhar atempadamente? Mas alguém compreende que um presidente de câmara trate as pessoas como se coisas fossem à sua disposição e que pense poder decidir e assumir compromissos por terceiros? Acredita pelo menos o presidente Nuno Canta, caso contrário não estaríamos perante esta lamentável situação.”

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A concluir, a socialista afirma que o “episódio é de extrema gravidade, indigno no plano institucional e pessoal e bem demonstrativo de como a Câmara Municipal do Montijo é governada actualmente”.

Na reunião de câmara, a situação foi debatida, mas sem ter absorvido muito tempo e sem ter gerado discussão acalorada. João Afonso contestou as alterações feitas às propostas iniciais, já que o nome de Sara Ferreira teve de ser substituído por o de Emanuel Martins, que se seguia na lista de candidatos do PS à autarquia em 2021 (ver caixa). O social-democrata considerou que se estava na presença de novas propostas, mas Nuno Canta defendeu tratarem-se de propostas “aperfeiçoadas”.

E criticou a gestão do processo por parte do socialista. “A vereadora [Sara Ferreira] foi a última a saber disto. Nós soubemos no dia 26 e ela diz que só no dia 29 foi informada pelo presidente do processo de substituição. Uma trapalhada das grandes”, observou o autarca do PSD. Porém, Nuno Canta deixou implícito que a socialista foi alertada anteriormente. “Manifestou-me, pessoalmente, na reunião [de dia 29] que queria renunciar. Até lhe disse: ‘pense lá um bocadinho’… Mas nós no dia 22 convocámos a vereadora para isso”, afirmou o presidente. Sara Ferreira nega ter recebido qualquer comunicação nesse dia.

Já Joaquim Correia, vereador da CDU, fez saber que a coligação não se opunha à alteração das propostas para substituição e para ‘atribuição de pelouros’ na reunião, mas lembrou que a vereadora também aludiu “a razões políticas” como justificação para renunciar ao mandato, na comunicação que enviou à Câmara. “Porventura haverá [razões políticas]. Não sei se vai mudar para outro partido”, retorquiu Nuno Canta, a finalizar. Mas, esse, apurou O SETUBALENSE junto de fonte socialista, é um cenário completamente “infundado e descabido”, tal como, de resto, Sara Ferreira também deixa explícito na carta aberta dirigida aos montijenses.

Substituto Emanuel Martins assume pelouros

Face à renúncia de Sara Ferreira, Emanuel Martins assumiu, pelo período de suspensão da vereadora Maria Clara Silva, um lugar na vereação e os respectivos pelouros, à excepção das finanças que ficaram a cargo do vereador José Manuel Santos, o qual passa a vice-presidente. Emanuel Martins fica responsável pelas divisões de Gestão de Recursos Humanos, Educação, Desenvolvimento Social e Promoção da Saúde, além da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens e da Associação para a Formação Profissional e Desenvolvimento do Montijo. As propostas para a assumpção da vaga e a tempo inteiro foram aprovadas com os votos favoráveis de PS e CDU e do vereador independente Ilídio Massacote (eleito do PSD). João Afonso absteve-se.

O SETUBALENSE publica abaixo, na íntegra, a carta dirigida por Sara Ferreira aos munícipes do Montijo.

Carta aberta aos montijenses

A Verdade e o Montijo Primeiro!

Caras e Caros Montijenses,

«Sou nascida e criada no Montijo, tenho 43 anos e desde cedo que o amor à terra que me viu nascer, levou-me a participar ativamente na vida da comunidade.

Sou também uma democrata e militante do Partido Socialista desde 1998. Aderi ao Partido Socialista com 18 de anos em razão das minhas convicções que até à data se mantêm inalteradas.

Tive o privilégio e a honra de ter servido a minha terra, no desempenho de um cargo político, tendo sido Vereadora na Câmara Municipal do Montijo, no mandato autárquico compreendido entre 2017-2021 e mantenho a certeza que estive, estou e estarei sempre disponível para servir o Montijo e jamais servir-me dele.

Por essa mesma razão entendo ser meu dever dirigir-me a todos os montijenses para prestar esclarecimento público acerca do processo de substituição de eleito local, que ocorreu na Câmara Municipal do Montijo recentemente.

No passado dia 28 de abril, a Sra. Vereadora Maria Clara silva, apresentou um período de ausência inferior a 30 dias, por questões de saúde, que decorreu entre o dia 24 de abril e 22 de maio de 2023. Nesse intervalo de tempo realizaram-se duas reuniões de câmara, dias 3 e 17 de maio respetivamente, às quais compareci por entender ser esse o meu dever, dada a delicadeza da situação. De seguida, a Sra. Vereadora Maria Clara Silva, entregou um pedido de suspensão de mandato por um período de 30 dias, a iniciar-se no dia 22 de maio de 2023, o que obriga à substituição do vereador na Câmara Municipal do Montijo, nos termos da Lei.

Fui, novamente contatada, via email, pelos serviços da Câmara Municipal do Montijo, no dia 24 de maio de 2023, a propósito do envio de nova convocatória para comparência na reunião de câmara, a realizar-se no dia 31 de maio, sendo que a convocatória enviada pela Câmara Municipal referia solicitar a comparência para eventual preenchimento da vaga. Em resposta a esta comunicação, informei no dia 26 de maio que iria estar presente na reunião de câmara, com o objetivo de dar a conhecer a minha posição e decisão sobre este processo que, desde já, é bom de ver, se desenvolveu de uma forma atípica e ao arrepio da conduta aceitável de quem tem responsabilidades políticas, no caso, do responsável pela condução do processo, o Presidente Nuno Canta, mas já lá iremos.

Nesse mesmo dia, 26 de maio, foi-me enviada a ordem de trabalhos da reunião de câmara a realizar no dia 31 de maio, onde constam duas propostas, datadas de dia 22 de maio, sendo que a primeira das propostas, com o número 632/2023 é referente à suspensão de mandato e substituição de eleito local, propondo deliberar a substituição da Sra. Vereadora Maria Clara Silva na minha pessoa. E ainda, a segunda proposta, com o número 633/2023, relativa à fixação de vereadores em regime de tempo inteiro e respetiva renumeração, propondo deliberar designar-me como Vereadora a tempo inteiro e a respetiva atribuição de remuneração para o desempenho das funções.

No dia 29 de maio, fui contatada pelo gabinete do Presidente Nuno Canta, solicitando a minha presença para a realização de uma reunião. Compareci na Câmara Municipal do Montijo, no período da tarde a pedido do Presidente Nuno Canta. Foi neste dia e neste momento que tive o primeiro e último contato com o Presidente Nuno Canta sobre o processo de substituição que se encontrava em curso. Repito e sublinho, o primeiro e único contato realizado com a minha pessoa perante este assunto de tamanha gravidade e de extrema importância, foi no dia 29 de maio. Decorrida a reunião, assumi o compromisso de comunicar a minha decisão ao Presidente Nuno Canta, durante o decorrer do dia seguinte, 30 de maio, o que fiz, renunciando ao mandato autárquico, em razão de motivos de ordem pessoal, profissional e políticos.

Sucede, porém, que o Presidente Nuno Canta, na reunião de câmara realizada a 31 de maio, afirmou que me tinha sido dado a conhecer a situação no dia 22 de maio, mais, referiu que me tinha sido remetida informação sobre o assunto.

Apresentou ainda, exatamente as mesmas propostas para deliberação em reunião de câmara, ou seja, onde constava o meu nome como facto adquirido e concertado, mencionando nesse momento, que iria existir um aperfeiçoamento das propostas em discussão, isto é alteração do nome e da pessoa que na realidade acabou por preencher a vaga, em razão da apresentação da minha renúncia.

Pois bem, chegados aqui, quase que parece que estamos perante uma ficção, mas infelizmente não estamos. Esta é a realidade e ela é lamentável de constatar, um Presidente de Câmara que falta à verdade à Câmara Municipal e a todos os montijenses, não só é lamentável como é indigno institucionalmente.

Entendo que os cargos políticos devem ser exercidos num quadro de cooperação, de diálogo, de lealdade, de transparência e de respeito para com os pares, o que é bom de ver que não acontece na Câmara Municipal do Montijo.

Não está em causa o cumprimento do enquadramento legal para a especificidade da situação, mas, está em causa sim, a forma, o comportamento adotado pelo Presidente Nuno Canta no decurso desse período e o procedimento realizado, que, na minha opinião, diz muito sobre o estado atual da gestão da câmara municipal do montijo, que se tornou centralizada, fechada, opaca, que resulta da vontade e decisão individual e unilateral. Está em causa a gestão da câmara municipal do montijo, não está em causa a gestão da vida particular de cada um.

O processo normal e natural que estou convicta que ocorreria em qualquer canto do País, perante circunstâncias excecionais, seria o da existência de uma análise da situação, de diálogo partilhado e sustentado no coletivo do Executivo.

Mas alguém acredita que perante uma situação desta natureza, um Presidente de Câmara não fale, não exponha, não informe, não cuide de saber da disponibilidade e de informar sobre as tarefas que pretende que o substituto venha a desempenhar atempadamente?

Mas alguém compreende que um Presidente de Câmara trate as pessoas como se coisas fossem à sua disposição, e que pense poder decidir e assumir compromissos por terceiros?

Sim, pelos vistos alguém acredita e aceita. Acredita pelo menos o Presidente Nuno Canta, caso contrário não estaríamos perante esta lamentável situação.

Uma novidade para alguns, vivemos numa Democracia, vivemos em sociedade onde existem regras que têm de ser cumpridas e ninguém está acima delas!

Por considerar que este episódio é de extrema gravidade, indigno no plano institucional e pessoal e bem demonstrativo de como a Câmara Municipal do Montijo é governada atualmente, entendo ser minha obrigação prestar este esclarecimento público aos montijenses, pela verdade e pelo Montijo!

Estarei sempre disponível para servir o Montijo, mas não estarei mais disponível para compactuar com esta forma de agir!

O Montijo merece mais!»

Montijo, 1 de junho de 2023

Sara Ferreira (militante do PS n.º 38639)

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