Foram ainda incluídas na lista trabalhadoras da cozinha e da lavandaria. No total, cerca de 20 pessoas, fora dos grupos prioritários
A vacinação contra a covid-19 a utentes e profissionais da Santa Casa da Misericórdia de Canha, que receberam a primeira dose a 23 de Janeiro último, abrangeu funcionárias das áreas de cozinha, lavandaria e pelo menos três pessoas que estavam em teletrabalho. No total, foram vacinadas cerca de 20 que não se enquadrariam nos critérios que definiam os grupos prioritários a vacinar naquela primeira fase, além do provedor e de mais quatro elementos da mesa administrativa.
Ao contrário destes cinco elementos que foram inoculados com sobras, no final do processo, o conjunto de cerca de 20 funcionários foi incluído na lista enviada às autoridades de saúde.
O provedor José Rodrigues – que em declarações anteriores a O SETUBALENSE já havia assumido e explicado a vacinação dos mesários – não nega que estas cerca de duas dezenas de funcionários tivessem sido vacinados. E recorda: “A Direcção-Geral da Saúde (DGS) pediu-nos uma lista de utentes e funcionários. E isso foi o que nós mandámos. Se eles sancionaram essa lista ou não, não é problema nosso. As pessoas que foram incluídas na lista são funcionários da instituição que andam dentro e fora [do edifício]”.
O responsável entende que não houve ninguém vacinado indevidamente e reforça que “foi enviada uma lista de acordo com a ‘bolha’ da instituição”.
“Foi vacinada toda a gente que estava dentro da ‘bolha’ e todos os nomes foram enviados, com [respectivas] funções, para a DGS, que veio e vacinou. Não disseram que não vacinavam este ou aquele, por um ou outro estar três dias em teletrabalho e vir cá [à instituição] nos outros dois dias”, defende. Ao mesmo tempo faz notar que os, pelo menos, três funcionários mesmo em teletrabalho não podiam abdicar de ir à Santa Casa, até porque havia “trabalho a fazer na instituição”.
“As pessoas todas as semanas iam lá. Mesmo em teletrabalho iam lá buscar as documentações. Isso é tudo falso. Desde que tivemos o surto [em Abril passado] que contei com todos”, afirma.
Além disso, tal como havia salientado da primeira vez, realça o facto de a instituição funcionar como uma única célula. “Não temos serviços administrativos separados… somos um todo. Quem conhece a instituição sabe que esta tem uma só célula. A cozinha, a lavandaria, a unidade de cuidados continuados, está tudo no mesmo edifício.”
Críticas à tutela na gestão do processo
Para José Rodrigues o processo, a nível geral, foi mal gerido pela tutela desde o início. O provedor passa até a responsabilidade da aplicação dos critérios de grupos prioritários para as autoridades de saúde. Apesar de as listas serem elaboradas pelas instituições. E reitera: “O que foi enviado foi exactamente aquilo que nos foi pedido – a ‘bolha’ da instituição, utentes e funcionários. Mais nada. Tivemos o cuidado de não ir buscar funcionários que estavam de baixa profissional, porque não vinham à instituição.”
Mas as críticas à DGS não se ficam por aí. O responsável revela ainda que a tutela foi questionada pela instituição sobre a vacinação, que considera que não devia ter acontecido naquele momento.
“Por que é que vieram vacinar um lar que acabara de passar por um surto há menos de 50 dias? Porquê vacinar 68 utentes e 50 funcionários que estiveram infectados? Agarrámos na norma 21/2020 de 23 de Dezembro e dissemos que não compreendíamos porquê. Deram-lhe alguma resposta a si? Olhe, a nós não deram”, atira. Na norma a que José Rodrigues aponta pode ler-se em nota de rodapé que “num cenário em que a disponibilidade das vacinas é ainda limitado devem ser priorizadas as pessoas com maior risco/vulnerabilidade de contrair a infecção por SARS-CoV-2, pelo que a vacinação não deve ser priorizada para as pessoas que recuperaram da covid-19, nos termos da Norma 004/2020 da DGS”.
E a concluir, deixa uma garantia: “Não fomos vacinados sem um documento enviado para a DGS que nos defendesse.”
“Há pessoas à volta da instituição que querem derrubar estes corpos sociais”
O provedor dispara ainda noutro sentido. Considera que o caso só chega à Comunicação Social por “denúncia” de quem tem objectivos muito claros. “Temos pessoas à volta da instituição que têm procurado que estes corpos sociais, que foram eleitos, sejam derrubados”, indica, antes de dar outros exemplos ocorridos. “Desde Janeiro que a maldade na instituição tem sido grave. Nesse mês tivemos a visita de uma equipa da Segurança Social por uma denúncia. E logo a seguir tivemos outra denúncia. E todas deram zero”, revela. E aponta até ao presidente da Junta de Freguesia, que diz não ter defendido a instituição quando o surto de covid-19 atingiu o lar.
José Rodrigues mostra-se indignado com todas as situações e confessa: “Só não ponho o meu lugar à disposição porque estão 400 mil euros às minhas costas, com o meu aval pessoal e dos outros que lá estão dentro.” Além disso, sublinha que tem de “lutar por manter 140 postos de trabalho” na instituição todos os dias. “E o que ganho dali? Zero!”
A terminar, o provedor diz que na Santa Casa está já a ser coligida toda a informação sobre o processo das vacinas, tendo em vista o que possa vir aí, numa alusão implícita aos inquéritos abertos pela Procuradoria-Geral da República.