Apoios insuficientes. “Se não houver do Estado uma aproximação aos 50% dos custos reais das Misericórdias, vamos continuar a ter prejuízos”, diz o provedor Miguel Canudo
Nestes dois últimos anos a Santa Casa da Misericórdia de Alhos Vedros acumulou um prejuízo total de cerca de 675 mil euros. Depois dos resultados líquidos negativos de 450 mil euros registados em 2023, a instituição prevê fechar 2024 com um défice na ordem dos 225 mil euros. Mas, a sustentabilidade da Misericórdia, que conta 524 anos de existência, não está em risco, assegura o provedor Miguel Canudo.
“O prejuízo [este ano] será inferior [ao de 450 mil euros de 2023]. Terá uma redução de cerca de 50 por cento. A Santa Casa, em termos de sustentabilidade, não está em risco. Tem meios que suportam todas as despesas, não tem é [capacidade de] tesouraria, mas isso é outra coisa”, diz Miguel Canudo, para reforçar de seguida: “Garanto que não está em causa a sustentabilidade da instituição.”
O valor das comparticipações financeiras da Administração Central tem ficado muito aquém das necessidades das instituições particulares de solidariedade social e esse cenário agravou-se com o aumento do salário mínimo. O envelope financeiro do Estado para apoiar os serviços prestados não acompanhou a actualização salarial, determinada por lei, nem o aumento do custo de vida verificado, com os quais as Misericórdias – tal como outras instituições que apresentam o mesmo tipo de valências e beneficiam de apoio – se deparam. E o sentimento de asfixia é cada vez maior.
“Os acordos que temos com a Segurança Social, o Estado, são a parte fundamental. Aquilo que pagam é insuficiente para as necessidades não só desta mas de todas as Misericórdias, em termos nacionais. As comparticipações são manifestamente insuficientes. E, relativamente a esta matéria, a União das Misericórdias está em conversações com o Estado Central”, afirma o provedor, que só vê uma solução para o problema de desequilíbrio financeiro da Santa Casa de Alhos Vedros e outras.
“Se não houver por parte do Poder Central uma aproximação aos 50% dos custos reais das Misericórdias, nós vamos continuar a ter prejuízos.”
Câmara reduz apoio ao plano de actividades
Sentida também foi a redução do apoio da Câmara Municipal da Moita ao plano de actividades da Santa Casa. “Não foi cortado o apoio à Misericórdia. O que foi feito foi um ajuste em 2022. Normalmente, o apoio da Câmara Municipal ao plano de actividades andava na ordem dos 32 mil a 35 mil euros por ano, o que recebemos agora é à volta de cinco mil euros. Achamos que essa redução foi significativa, era muito importante para nós. Mas, foi a opção da Câmara, não podemos questionar se bem, se mal, não está em causa. A Câmara continua a apoiar a Misericórdia dentro daquilo que foram as regras estabelecidas. Achamos que é pouco, mas é uma questão de opção”, esclarece Miguel Canudo.
O provedor realça, de resto, a parceria com o município. “Consideramos que a Câmara Municipal é o nosso parceiro privilegiado e mantemos boas relações. Mantemos a parceria do projecto ‘Casa Mais Feliz’, antigo Eco-Lar, projecto que era comparticipado pelas juntas de freguesia, pela Câmara e por nós. Em 2022, as verbas que as juntas pagavam no âmbito desse projecto foram assumidas pela Câmara e continuamos a receber o mesmo que recebíamos. Por aí, não houve nenhuma perda e os apoios às obras mantêm-se”, explica.
António Carlos Pereira, vereador responsável pela Divisão de Intervenção Social, Saúde e Habitação da Câmara da Moita, admite que o apoio financeiro à Misericórdia passou a ser de cinco mil euros, mas apresenta uma contabilidade diferente. “Não se reduziram apoios no cômputo geral em relação às actividades da Santa Casa. Não há decréscimo dos apoios, pelo contrário, os apoios até têm sido superados”, defende.
O autarca sustenta que “devem ser contabilizados” todos os apoios no seu conjunto, alguns dos quais indirectos “mas que têm o seu peso”. E destaca o projecto “Casa Mais Feliz”, que no total “em três anos vai beneficiar de um apoio de 113 mil euros”. “Se não apoiássemos, o projecto terminava”, afirma, ao mesmo tempo que aponta outros exemplos de apoios garantidos à instituição, como “a cedência de um apartamento para acolhimento das pessoas em situação de sem-abrigo e a loja social numas instalações do município”. “Para nós, tudo isto integra o plano de actividades da Santa Casa”, salienta.
“O município tem cerca de 120 instituições a apoiar e tem de gerir os apoios de forma equilibrada”, lembra, a finalizar.
Peso Três lares, duas creches, cuidados continuados, 400 trabalhadores e 800 utentes
A Santa Casa da Misericórdia de Alhos Vedros tem, actualmente, 400 trabalhadores, seis equipamentos e dá resposta desde a infância à terceira idade a cerca de 800 utentes. Além dos três lares de que dispõe, apresenta duas creches e uma unidade de cuidados continuados, a que se juntam ainda os serviços de Apoio Domiciliário e Centro de Dia. A actual conjuntura financeira não impede a Misericórdia de manter de pé alguns projectos. O provedor Miguel Canudo salienta um investimento que está na calha e que, considera, será “muito importante para concelho e para o distrito de Setúbal”. “Queremos recuperar o hospital desactivado para o transformar numa clínica de hemodiálise, numa parceria com a União das Misericórdias”, aponta. O provedor e a sua equipa têm mais dois anos de mandato pela frente. As eleições para os órgãos sociais da instituição só deverão realizar-se em finais de 2026.