A socialista reconhece que a sucessão a Nuno Canta na presidência surgiu numa altura crítica do mandato, mas mostra-se confiante na avaliação dos montijenses ao trabalho realizado. Defende a equipa que a acompanha, arrasa o vereador João Afonso (PSD) e diz que a CDU devia ter memória do que não fez quando geria os destinos do município
Frontal e humilde a reconhecer que o mandato não fica isento de “erros ou omissões”, próprios da condição humana, a “nova” presidente da Câmara Municipal do Montijo faz um balanço positivo ao trabalho desenvolvido pelo PS no concelho. Em entrevista a O SETUBALENSE e à rádio Popular FM, a socialista refuta críticas da oposição e espreita, embora mais à defesa, o futuro do partido nas próximas eleições autárquicas. “A lista do PS deve ser rejuvenescida, com gente que não esteja ligada aos projectos antigos”, considera. E assume que o seu futuro político terminará no final do mandato.
Que balanço faz a este mandato atípico, face à saída de Nuno Canta da presidência do executivo?
É mais um mandato do PS na continuidade do trabalho que tem vindo a desenvolver e do qual nos orgulhamos. É efectivamente uma situação atípica, mas as circunstâncias são as que são e é sobre elas que temos de trabalhar. Temos um programa eleitoral, temos vindo a cumpri-lo, algumas situações estão ainda por cumprir, outras serão finalizadas até final do mandato e outras por circunstâncias várias não conseguiremos concretizar. Mas estou certa de que os cidadãos terão orgulho na obra do PS, obviamente com erros e omissões – os homens e as mulheres cometem erros e omissões e, certamente, que nós também as teremos cometido. No entanto, o balanço é positivo.
Com que olhos acha que o eleitorado viu ou vê a saída de Nuno Canta para a AMARSUL, numa altura crítica do mandato?
Efectivamente, é uma altura crítica. Acho que haverá sempre uma faixa do eleitorado que vê mal, que não aceita, por considerar que o [ex-]presidente deveria ter cumprido o mandato até ao fim. Mas, nós somos pessoas e sabemos que todos temos expectativas. Não poderia recandidatar-se, por força das disposições legais, foi-lhe feito um convite e ele, perante as suas expectativas profissionais e pessoais, conversou comigo e resolveu aceitar o desafio.
O vereador João Afonso acusa a gestão PS de não funcionar, que a presidente está em part-time na autarquia e que os vereadores do PS são incapazes de gerir os pelouros. Sente condições para levar a “nau a bom porto” até final do mandato?
Até final só Deus saberá se terei saúde para o concretizar. Mas, não reconheço ao vereador João Afonso capacidade para fazer uma análise nem a mim nem aos vereadores do PS. Para o vereador ninguém presta, é um discurso populista, daqueles que atacam os políticos. Mas o vereador tem de ter consciência de que: primeiro, foi eleito por um partido político; e, segundo, não há democracia sem partidos políticos. Em relação a mim, não estou em part-time. Tenho um problema de saúde crónico, mas sei o que o vereador pensa sobre quem tem problemas de saúde ou quem tem necessidades educativas. Ele acha que essas pessoas deviam estar isoladas, fechadas num espaço, que ninguém as visse. Não é esse o nosso entendimento, todos têm lugar na sociedade e não será a doença crónica que tenho que me impossibilitará de continuar a gerir os destinos da autarquia. Primeiro, porque tenho confiança extrema nos dirigentes autárquicos; segundo, os vereadores [do PS] José Santos e Marina Birrento são pessoas competentes, capazes. Não é o vereador que vem agora determinar quem é ou não é competente.
Ficou sentida pela argumentação utilizada por João Afonso?
Fiquei. Quando temos um problema de saúde tentamos minimizá-lo, tentamos encontrar a melhor estratégia para o ultrapassar. Acho que é de uma grande leviandade, de uma grande falsidade, a forma como o vereador abordou esta temática. Em política não vale tudo. Tenho família e estas questões também tocam as nossas famílias. Acho que foi de uma grande desonestidade essa posição do vereador. Fiquei muito sentida e acho que qualquer pessoa na minha situação não perdoaria ao vereador ter trazido à colação a minha saúde como arma de arremesso político.
Sente-se uma mulher de coragem?
Sim. Tenho demonstrado isso ao longo da minha vida. O meu médico já me disse: “A senhora não se cansa”. Respondi que não. Quando estou a trabalhar estou menos cansada do que quando estou sem fazer nada. Porque o faço por vontade, por opção e por decisão. Podia ter feito outra opção. Até podia estar de baixa médica estes dois anos de mandato, podia ter suspendido o mandato, podia ter renunciado, podia ter optado por várias situações, mas nunca tive isso em mente, mesmo enquanto vereadora, portanto também não enquanto presidente. Assim as forças me permitam que chegue ao final do mandato.
Como responde à CDU que considera que os sucessivos executivos camarários do PS não souberam fazer crescer a cidade?
A CDU deveria fazer uma análise interna. Quando nós chegámos à Câmara, em 1998, com a dra. Amélia Antunes, tivemos oportunidade de ver as obras que ao longo dos anos foram passando pelos planos de actividades da CDU. O Moinho de Maré andava continuamente em plano para ser efectuado e nunca foi concretizado. Acho e todos os cidadãos vêem que o Montijo não tem nada a ver com aquele que a CDU nos deixou de herança. Não só em termos financeiros, na Câmara.
Chegámos à Câmara com o Cinema Teatro a ser vendido a uma entidade com finalidade religiosa, sem que a gestão da CDU tivesse sobre isso qualquer tomada de posição. Foi a dra. Amélia Antunes e na altura o Ateneu que criou um grupo de apoio ao Cinema Teatro… Foi a Câmara que o adquiriu, sem condições financeiras à época e temos hoje um espaço de cultura muito importante. O Montijo evoluiu de uma forma harmoniosa, muito interessante.
Não há razão para a CDU nos fazer essa acusação. Inclusivamente a Quinta do Saldanha, onde temos hoje a nossa universidade sénior, foi recuperada por nós, um espaço para onde a CDU tinha perspectivado um centro de artes, que nunca se concretizou… nunca fizeram nada, nem uma obra na Quinta do Saldanha.
Montijo tinha até há pouco tempo uma cobertura de 100% na rede pré-escolar e dava boa resposta nos outros níveis de ensino. Como define a actual situação?
Quando chegámos à Câmara, a Escola da Caneira era um barracão de madeira, nem as casas-de-banho podiam ser utilizadas. Lembro-me do professor Francisco Santos, à época presidente da Junta de Freguesia, a chorar quando viu as instalações da Escola da Caneira. Fizemos um grande investimento nos equipamentos, na Educação. Fizemos a carta educativa, que para a cumprir apenas faltam quatro salas, na Escola Básica do Areias (está a ser elaborado o projecto para iniciarmos a obra), e uma escola de 2.º ciclo em Sarilhos Grandes, que à partida será feita antes no Montijo. Tínhamos cobertura de 100% no pré-escolar (rede pública, privada e solidária). Com a questão da “Creche Feliz”” houve associações da rede solidária que optaram por reconverter salas de pré-escolar em salas de creche. Isso reduziu o número de salas de pré-escolar. Este ano propusemos ao Ministério da Educação abrirmos mais três salas de pré-escolar para dar resposta aos fechos na rede solidária. Em Agosto, o Ministério da Educação veio dizer-nos que sim e colocámos na Escola do Areias mais três salas de pré-escolar.
Mas não chega?
Não responde ao que queríamos. Nem em termos de pré-escolar nem de 1.º ciclo. A Área Metropolitana de Lisboa [AML] tem uma grande pressão de alunos, as turmas estão quase todas em supranumerário em todos os graus de ensino. Isto tem a ver com a imigração. E temos de responder a estas necessidades e de nos lembrarmos que no governo da troika fechámos escolas. Há oito anos estávamos a fechar escolas por não termos alunos e hoje temos alunos a mais, felizmente. Iremos encontrar certamente resposta.
E há o Centro Escolar de Pegões, há muito previsto e que finalmente parece ir sair do papel…
… Já lançámos a obra e esperamos começá-la ainda este ano. É muito necessária para as freguesias rurais. Mas não iremos fechar a Escola de Canha nem o Jardim-de-Infância de Santo Isidro.
Além da Casa da Música e do renovado centro de recolha de animais, que outras obras acha que marcam este mandato?
Espero que essas duas marquem. As piscinas municipais, que já estão em obra [de reabilitação], o centro cultural a construir na antiga cooperativa [edifício da antiga Trabatijo], na Rua João Pedro Iça… a Loja do Cidadão, que vamos iniciar a obra. (…) Os montijenses têm falado muito sobre uma nova saída da Ponte Vasco da Gama e já solicitámos uma reunião à Lusoponte para apresentarmos uma proposta de traçado para essa saída.
O que virá a ter o pólo cultural na Rua João Pedro Iça?
Será diferente do Cinema Teatro e da Casa da Música. Já tive conversas com algumas pessoas, inclusive com o director pedagógico do CRAM e a ideia é virar aquele espaço mais para a música. Mas isso decidirá quem vier a seguir.
Vão ficar pelo caminho algumas obras. Uma é a construção do novo estádio de futebol que estava prometida no programa eleitoral do PS.
É verdade. Lamento, porque era muito importante que o Montijo tivesse ido mais além na construção do estádio. Mas, vicissitudes várias – a cedência dos terrenos – atrasaram este processo. Vamos tentar deixar, pelo menos, um projecto para que se possa lançar a obra no próximo mandato.
Na saúde, o PS defendia o alargamento das valências do hospital e a construção de um centro de saúde no Bairro do Areias. Em que pé estão estes investimentos que pretendiam para este mandato?
Queremos construir o centro de saúde no Areias, num edifício que comprámos à antiga cooperativa, e alargar o serviço hospitalar. Já solicitei uma reunião à Saúde para fazermos uma avaliação, porque estamos a passar momentos muito difíceis no distrito. Nós não podemos esquecer que foi Leonor Beleza quem encerrou a maternidade no Montijo e o caminho que este Governo está a seguir não é de forma alguma de valorização do Serviço Nacional de Saúde [SNS] nem da robustez dos hospitais. Por isso solicitámos uma reunião para exigirmos o que gostaríamos que se concretizasse na área da saúde no concelho. Mas, sinceramente, as esperanças são poucas.
Pelo que está a dizer, os serviços prestados no hospital do Montijo podem estar em risco.
Não sei se estão, é isso que quero saber. Mas as propostas que esta ministra tem feito na área da saúde são mais no sentido da privatização do SNS. Só quem viaja por essa Europa fora ou tem conhecimento é que percebe como o SNS português não tem nada a ver com o resto. Para melhor, mesmo funcionando mal.
Que análise faz aos processos de habitação candidatados pelo município ao PRR?
Temos o alojamento local e temporário, temos a revitalização do Esteval Novo e a construção de novos fogos na Caneira e no Esteval, que estão aprovados. O problema é que o IHRU [Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana] parece que parou, deixou de dar resposta, tem lá os processos e não responde. Este Governo chamou uns quantos municípios que entendeu – no distrito, acho que Montijo e Palmela foram os únicos que não foram chamados (mas mesmo que fosse, eu também não assumiria) – para assinarem a construção dos outros fogos mas se viesse parecer negativo [para financiamento] as câmaras assumiriam a construção na sua totalidade. E isso está fora de questão. Até porque, na AML, os municípios que já investiram verbas não estão a ser ressarcidos delas.
A videovigilância pode ser uma solução preventiva, face aos casos de violência registados na baixa da cidade?
Quando assumi a presidência reuni-me com o comandante da GNR, que me disse que na sua área de intervenção não há grandes problemas. No Montijo, estou a aguardar a nomeação do comandante [da esquadra da PSP], porque o actual está de saída, está como interino e não terá uma perspectiva de futuro. E o que importa é encontrar uma estratégia e qual a melhor estratégia. A Câmara está disponível para, em conjunto com as forças de segurança, encontrar uma estratégia para devolver aos cidadãos a sensação de segurança. Não fecho a porta a nenhuma solução.
Considera que o trabalho realizado nas freguesias rurais foi suficiente ao longo destes mandatos?
Tudo feito não está. Não está o Centro Escolar de Pegões, que já deveria estar, e outras situações que as populações desejam. Temos também um problema em Pegões, na área da imigração, que cria a sensação de insegurança na população residente. Por isso, na antiga Escola das Faias vamos construir um centro multicultural e trabalhar em parceria com o Instituto Politécnico de Setúbal para trazer a população imigrante à nossa cultura e aos nossos hábitos.
Qual é o ponto de situação relativamente à revisão do Plano Director Municipal (PDM)?
Teve alguns pareceres negativos de algumas entidades e estamos a tratar, com a equipa que fez a revisão, de corrigir essas situações, para voltarmos a remeter à CCDR.
Como antevê o futuro do PS nas próximas autárquicas no Montijo, tendo em conta que o presidente da Junta de Montijo e Afonsoeiro, Fernando Caria, se prepara para apresentar uma candidatura independente?
Estou convicta de que ele ainda não tem uma decisão tomada. Ainda temos mais um caminho a fazer, o PS tem um trabalho de que se orgulha no Montijo, ainda não tem o candidato à Câmara decidido…
… Não será Ricardo Bernardes, seu chefe de gabinete, ou em última instância Catarina Marcelino?
Não sei. Essa é uma decisão da Comissão Política [Concelhia]. Mas acho que a lista do PS deve ser uma uma lista rejuvenescida, de gente jovem (não me estou a referir à idade, mas a gente que não esteja ligada aos projectos antigos), que se orgulhe do seu passado, mas que perspective o futuro de uma forma que o PS sabe perspectivar.
E esse futuro ainda passa por si ou vai terminar no final deste mandato?
Nunca se diz nunca, mas, à partida, o meu futuro político terminará no final deste mandato.