Em duas épocas, foi campeão e bicampeão europeu, o que contraria quem não acreditava nas suas potencialidades
“No andebol somos todos uma família. O apoio entre todos é essencial”. Foi esta a forma que Dylan Santos encontrou para descrever a sua equipa da União Desportiva para a Inclusão (UDI), da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Setúbal.
Apesar de não saber ao certo há quantos anos joga, o jovem de 25 anos diz ter “a noção de que é já há algum tempo”. “Devia de ter uns 18 ou 19 anos, talvez. Comecei por brincadeira, por sugestão do Miguel Veiga e do Marinho, dois colegas. Fui experimentar, num jogo normal, e não parei mais”, revela.
Em cerca de sete anos, evoluiu de tal forma que tem sido, desde 2016/2017, convocado todas as épocas para a selecção nacional de andebol adaptado. “Além disso, também já fui campeão e bicampeão europeu de andebol adaptado. Eu e a minha equipa sentimo-nos muito felizes. Damos tudo por tudo. Quando ganhamos comemoramos à séria”, descreve.
Para atingir esses resultados, e com a ambição de se tornar “o melhor do mundo”, Dylan, diagnosticado com deficiência intelectual, explica que teve de “treinar muito, assim como os colegas o tiveram de fazer, com o apoio do professor da UDI”.
“Só a prática nos faz alcançar estes resultados”, sublinha, sendo que, para tal, faz “questão de ir a todos os treinos”, mesmo que por vezes “seja complicado conciliar com o trabalho”.
“Temos treinos às segundas, às 19 horas, nas Manteigadas, às quintas, às 17h30, e às sextas-feiras, também às 19 horas, no Clube Naval Setubalense. Antes, cumpro o meu horário no Montado Hotel & Golf Resort, onde faço várias coisas, como aparar a relva e apanhar o lixo. Depois vou para o ginásio, fico lá uma ou duas horas, e, nos dias em que há treino, vou treinar”.
Selecção portuguesa leva jovem a revisitar país onde nasceu0
O que surgiu por mero acaso, já levou o jovem de 25 anos à Polónia e a França, país que tem especial significado para Dylan. “Fui a França pela selecção nacional e senti-me muito bem porque é o país onde nasci. Foi duplamente bom, jogar por Portugal no meu país de origem”.
Sobre ter sido escolhido para vestir as cores de Portugal, o atleta confessa que “não estava nada à espera”. “Fiquei em choque. Percebi nesta altura que o andebol se estava a tornar numa coisa séria”.
Até porque, sublinha, “nunca tinha imaginado que o percurso seria neste desporto”. “Quando fui àquele jogo por brincadeira, nem sequer pensei nisso. Só joguei. Aliás, foi a primeira vez que joguei andebol. Nem sequer sabia como se jogava. Do nada comecei a gostar daquilo e a coisa foi acontecendo”, confessa.
Foi com tempo e prática que foi “aprendendo todas as técnicas”. “No andebol as jogadas são difíceis. Quando o colega faz o passe, temos de estar com muita atenção. A intenção é não perder a bola. É um desporto que requer muita atenção e estratégia”.
Competitivo por natureza, além de “trabalhador e esforçado”, o jovem garante que “faz de tudo para ganhar”. “Vamos sempre para os jogos com o pensamento de que vamos vencer. Tem de se lutar pela equipa e fazer de tudo para ganhar o jogo. Adoro ganhar. É uma sensação indescritível”.
No entanto, se a equipa perder, “é continuar a trabalhar”. “Ficamos mal, mas depois passa nos. É puxarmos mais por nós para melhorarmos”.
Reconhecimento é ‘chapada de luva branca’ em quem duvidou
Para Dylan, o sucesso que tem tido é como que uma ‘chapada de luva branca’ naqueles que lhe foram dizendo “que não conseguiria nada na vida”. “A minha infância foi boa e má ao mesmo tempo. Foi má porque os professores não me davam muita atenção e não me explicavam quase nada, e até por causa dos colegas”.
Em 2014, explica, teve uma professora que lhe chegou a dizer que “não valia a pena continuar na escola, porque não iria conseguir aprender mais nada”.
Foi nessa altura que entrou no mercado de trabalho. “Devia de ter uns 17 ou 18 anos. Fui para o café Manaites, em Palmela. Depois trabalhei na Câmara Municipal de Palmela, com os electricistas. Não tinha experiência nenhuma, mas fui aprender. Entretanto passei para a SUMA, a apanhar lixo da rua, e segui para o Montado Hotel & Golf Resort, onde estou actualmente, desde há seis meses”.
Já jogava andebol quando tentou ainda tirar um curso de jardinagem, no Viso, que acabou por não concluir. “Houve problemas por lá. Fiquei en- tão com o 9º ano adaptado. Nem sequer penso, por enquanto, em continuar a escola. Estou bem no meu actual trabalho”.
Família dá apoio, mas não acompanha tanto quanto o desejado
Foi em Algeruz, concelho de Palmela, que a família de Dylan se instalou depois de imigrar. “Vim para cá muito pequenino. Viemos para Algeruz e já estive em Brejos do Assa. Entretanto também morámos no Lau e acabámos por regresso a Algeruz. Tenho um irmão, o Alexandre, e ainda moro com ele e com os meus pais”.
Nas competições, é da família que Dylan diz sentir mais saudades. “Acompanham o meu percurso e dizem-me que tenho de ter paciência, mas não me acompanham tanto quando eu gostaria. Não o fazem porque têm de trabalhar”.
Apesar de ser “uma pessoa que prefere não sair”, em casa o atleta opta por fugir um pouco à rotina. “Gosto de jogar PlayStation e PS4. Também adoro dançar, tocar flauta e principalmente pintar. Normalmente desenho em papel o que me vem à cabeça, mas quando não tenho ideais vou ao Youtube, faço alguma pesquisa e pinto o que me interessar”.
As excepções são a praia ou a piscina, onde gosta de ir “nos tempos livres”, a par do basquete, que pratica “só por diversão”.
Dylan Santos à queima-roupa
Idade: 25 anos
Naturalidade: França
Residência: Algeruz, Palmela
Área: Desporto (andebol)
Competitivo por natureza, além de trabalhador e esforçado, ganhar é o que lhe dá vida e uma sensação indescritível