O presidente da autarquia, que se candidata a um segundo mandato, admite que a concessão do estacionamento tarifado por 40 anos tem os dias contados. Tece críticas a Fernando José e Dores Meira e realça a passagem da gestão da água para o município
Habitação, saúde e educação estão entre as prioridades de André Martins para o próximo mandato. Em entrevista a O SETUBALENSE e à Rádio Popular FM, o cabeça-de-lista da CDU elenca alguns dos investimentos que pretende concretizar, afirma que a DataRede não tem cumprido com todas as suas obrigações e debruça-se sobre a situação financeira da autarquia.
Quais são as prioridades da CDU para o próximo mandato, o que vai ter de novo para apresentar ao eleitorado?
Continuar sempre a melhorar a qualidade de vida de Setúbal, do nosso território e das populações. Temos esta oportunidade de, neste mandato, criar as condições para fazer um investimento no território, que desde o 25 de Abril a Câmara de Setúbal nunca teve. Estamos a falar de 200 milhões de euros de investimento público em candidaturas, em investimento do Orçamento Municipal, em empréstimos que conseguimos realizar.
O compromisso que temos é o de continuar a investir na habitação, na saúde – embora a saúde não seja uma responsabilidade da Câmara, assumimos um compromisso de construir três novos centros de saúde –, na educação, com o maior investimento de sempre em curso. Estamos a construir agora uma nova escola no centro da cidade, um passo significativo para acabar com os regimes duplos nas escolas, na procura da escola a tempo inteiro.
Mas também do investimento no património e na cultura: acabámos a obra do Convento de Jesus, com a instalação do museu, e está agora a decorrer um concurso para a requalificação da Casa Luísa Todi, projecto que vinha sendo adiado há muitos mandatos.
Portanto, habitação, saúde, educação, cultura…
… Também a área da mobilidade, dos espaços verdes, do ambiente, e a área do desporto. Temos grandes espaços verdes, que fomos criando ao longo do tempo. Mas, neste momento, temos três grandes espaços verdes em construção. O parque da Várzea, que tem 19 hectares, um parque verde na Quinta da Amizade, com 6 hectares, e outro, na freguesia do Sado, com 4 hectares.
Um dos compromissos que assumimos neste mandato foi o de passar a gestão da água para o município. Isso aconteceu e, também como nos comprometemos, o preço do metro cúbico de água baixou 20% em média para todos os munícipes. E decidimos passar a gestão dos resíduos sólidos urbanos para os Serviços Municipalizados, que criámos em 2023.
Na área da mobilidade, finalmente conseguimos estabilizar as questões do transporte público [rodoviário] no concelho. Mas há aqui um caminho muito importante, que temos vindo a reivindicar junto dos governos: a questão do comboio, que faz a ligação de Lisboa a Setúbal. É preciso ter mais frequência de comboios, novos horários, e que se prolonguem até ao Politécnico, até às Praias do Sado. Outra reivindicação muito forte e muito justa, que temos feito, é encontrar uma solução que sirva melhor os setubalenses na ligação [fluvial] a Troia.
O investimento na área do desporto é para manter?
Sim. Neste mandato, o nosso compromisso é requalificar dois campos de futebol para a formação. Estamos a construir um pavilhão desportivo e a requalificar um outro, que não tinha condições para ser utilizado com toda a capacidade que tem, por causa de infiltrações.
No próximo mandato é necessário construir outro pavilhão desportivo, em Azeitão, que foi prometido e que não avançou. Mas, o grande projecto é para a zona ribeirinha: o Centro Náutico. Tem vindo também a ser adiado ao longo de mandatos, neste não houve condições para o fazer. É uma grande aposta para o próximo mandato.
Um dos temas mais controversos neste mandato tem sido o estacionamento tarifado, no âmbito de uma concessão à DataRede. Já disse que o acordo com a empresa tem de ser reavaliado, mas até agora não se conhece nenhuma decisão concreta. Em que pé está?
Um contrato por 40 anos, com cerca de nove mil estacionamentos tarifados, envolve dezenas de milhões de euros e a Câmara Municipal tem a responsabilidade de, quando tomar decisões, prejudicar o menos possível o município e os setubalenses.
Não correr riscos de ter de pagar uma indemnização avultada…
A empresa não tem executado o contrato nos termos em que ele existe. E isso é um problema. Por isso é que a Câmara já decidiu aplicar penalizações à empresa. Dizer que a empresa interpôs uma providência cautelar e que o tribunal não lhe deu razão. Só por aí se vê que a empresa, das duas, uma: ou não está interessada ou não tem capacidade para desenvolver este contrato tal como ele foi aprovado.
Outra questão é que verificamos que este contrato não é adequado ao nosso território. O estacionamento tarifado é importante. Apresentei em 2016 uma proposta para se avançar com o estacionamento tarifado. Nem chegou a ser aprovada. Era uma proposta para um contrato por 15 anos, tinha uma base de três mil lugares tarifados e previa a possibilidade de ao longo dos 15 anos se aumentar até cinco mil, em função do plano de intervenção na via pública que existia. Isto nada tem a ver com a proposta que foi apresentada em 2019 e que depois resultou no contrato de 2021.
Mas a força política que estava no poder era a mesma, a CDU. Só mudaram os protagonistas, Dores Meira e agora André Martins…
… Sim, mas em 2016, enquanto vereador do urbanismo, apresentei, como já disse, uma proposta que, do meu ponto de vista, era adequada à situação na altura. A proposta de 2019 é completamente diferente.
O contrato foi assinado em Junho de 2021 e, portanto, a sua execução passou toda para a responsabilidade deste executivo. E temos feito tudo aquilo que nos parece ao nosso alcance para salvaguardar os interesses da Câmara, dos munícipes. O processo está a ser acompanhado pelos nossos advogados. Quando concluirmos que está na altura de resolver este contrato, isso será feito de imediato. E posso dizer que isso está muito próximo de acontecer.
A Câmara está perto de resolver, de terminar, o contrato?
Até propusemos a constituição de uma equipa de técnicos da Câmara e de técnicos da empresa para se encontrar soluções de forma a ultrapassarem-se problemas que pensamos que podem ser ultrapassados. E temos verificado, desde Janeiro até agora, que a empresa não está devidamente empenhada em fazer esse trabalho. Por isso, digo que está para muito breve a tomada da decisão sobre a resolução do contrato, acompanhada pelos nossos advogados, no sentido de defender os interesses da Câmara, que são os interesses dos setubalenses.
Muito breve quer dizer um mês, dois meses?
Muito em breve.
O município acaba de aprovar um investimento de 16 milhões de euros para a reabilitação e aquisição de habitação pública. Acredita que em 2026 estarão concretizados todos os projetos de habitação que beneficiam de financiamento do PRR?
Esse é um grande desafio que temos pela frente, Setúbal e todos os municípios deste País. Mas estamos a procurar aproveitar essa disponibilidade financeira. Temos 1 700 fogos que vão ser reabilitados, dentro do quadro que está estabelecido. E esta era uma oportunidade única. A Câmara nunca teria condições para estes investimentos, estamos a falar de 140 milhões de euros aprovados no âmbito do PRR. Só para a habitação.
Mas, não estamos só a fazer a requalificação desse património. Fizemos uma hasta pública de um loteamento municipal, adjudicado a uma empresa que está a finalizar os projectos para a construção de 170 fogos para venda a preços controlados. Agora fizemos um empréstimo para adquirirmos 24 fogos para serem colocados no mercado a renda acessível. Continuamos a trabalhar no sentido de podermos construir os 500 fogos novos como nos comprometemos, para os colocar no mercado a renda apoiada, em função do rendimento familiar. O IHRU já iniciou a obra e o compromisso é construir mil fogos com renda acessível.
Portanto, temos aqui um leque muito alargado de oferta de habitação para os próximos anos. Tudo faremos para que em Junho de 2026 estas obras estejam concluídas.
Há outros leques de oferta de habitação também a ocorrer, mas para famílias que têm condições para adquirir habitações aos preços do mercado. Temos, neste momento, em Setúbal, mais de 1 500 fogos em construção para esse tipo de orçamentos.
Esses são investimentos privados…
Claro. Por isso é que falo de 200 milhões de investimento público, nas áreas todas que atrás referi, e depois temos o investimento privado, na parte da indústria, do comércio, da hotelaria, da saúde, de cerca de 2 mil milhões de euros.
O senhor queixou-se da situação financeira da Câmara, que herdou em 2021. Hoje está melhor?
Não é da situação financeira. Digamos que será da situação orçamental e, sobretudo, da situação da tesouraria. Porque a situação financeira, comparativamente com outros municípios, está controlada.
Se assim não fosse, a Câmara não tinha aprovado na última reunião dois empréstimos, no valor de 13 milhões de euros. A situação financeira está estabilizada.
Mas, herdámos a Câmara com uma situação muito complicada do ponto de vista orçamental. E se não fossem os 12,5 milhões que recebemos da garantia bancária da Águas do Sado e pagarmos dívida em vez de fazermos investimento, a situação hoje seria muito complicada. Isso permitiu até que a capacidade financeira da Câmara aumentasse e por isso é que temos 26 ou 27 milhões de euros de empréstimos bancários, para fazer estes investimentos que não têm condições para ir ao orçamento, que é, na sua grande parte, dedicado aos compromissos com projectos nas áreas do desporto, da cultura, com o pagamento dos salários e funcionamento dos serviços. E isso foi uma situação muito complicada que encontrámos e que em 2022 agravou-se do ponto de vista orçamental.
Mas, atenção, a situação tem vindo a agravar-se mais ainda. Porquê? Porque foi feita a transferência de competências na área da educação e da avaliação que tem sido feita dos relatórios da Comissão de Acompanhamento, nós, neste momento, já retirámos do orçamento da Câmara 4,6 milhões de euros, para suportar o funcionamento dessas competências.
Espera reavê-los?
Espero sempre reavê-los. Os nossos técnicos, os nossos juristas, trabalham no sentido de demonstrar, junto das entidades competentes, que esta despesa deveria ser suportada pelo Estado Central. Mas só mesmo para terminar este ponto, dizer o seguinte: de 2021 até 2025, o salário mínimo nacional aumentou 200 euros. Cerca de 60% dos trabalhadores da Câmara tem o salário mínimo. Isto é um custo que é feito à conta das Câmaras. Porque não há transferências da Administração Central para as Câmaras Municipais. Não estou a dizer que sou contra o aumento do salário mínimo. Pelo contrário. A questão é que alguém decide e as Câmaras Municipais pagam. Ainda agora, antes destas eleições, o Governo decidiu aumentar os salários dos bombeiros. Quem paga? A Câmara Municipal.
Depois, ainda temos outra questão relativa ao orçamento. É que a oposição tem maioria na Câmara e impôs a quem governa uma redução da receita significativa. Na estimativa que temos, no final do mandato, as decisões que foram impostas pela oposição ultrapassam os 20 milhões de euros.
Está a falar da redução do IMI?
Do IMI, do IRS…
… Mas a estabilidade financeira, não orçamental, não vem demonstrar que a oposição tinha razão quando propôs a diminuição do IMI e que era possível acomodar o impacto dessa perda de receita no orçamento?
Continuamos a aumentar dívida e a oposição tem acesso a toda a informação. Estou a falar dos orçamentos e do aumento da dívida e do aumento do tempo de pagamentos. Mas, os vereadores da oposição não tiveram isso em conta.
Os vereadores da oposição o que dizem é que se comprometeram, quando se candidataram, a reduzir o IMI e o IRS até um determinado valor. E continuaram a apresentar essas propostas na Câmara e, como têm maioria, a aprová-las. Também defendo que os impostos devem baixar. Mas defendo algo que é mais equilibrado: que seja a Assembleia da República a aprovar a redução dos impostos. Terá de haver a nível nacional um olhar para este problema da redução dos impostos.
Agora, quando, por exemplo, o PCP apresenta propostas de redução dos impostos, na Assembleia da República, tanto o PS como o PSD votam contra. Mas depois, quando estão na oposição, no caso da Câmara de Setúbal, vêm impor a redução de receitas que, pela informação financeira que têm, sabem que a Câmara fica com uma situação muito difícil com as empresas, com as grandes empresas, com as pequenas empresas.
A redução do IMI de 0,44 para 0,37 em três anos vai repercutir-se agora a partir de 2025. A redução do IRS de 5% para 3,3 vai continuar. E quais são as receitas que a Câmara tem? São essas. Por isso é que considero que o comportamento do PS na Câmara de Setúbal é de uma grande irresponsabilidade, desde o primeiro dia deste mandato até hoje, é dizer mal de tudo e de todos. E estar sempre disponível para se aproveitar das situações mais difíceis, para querer tirar proveito dessas dificuldades. Mais, o PS tem estado no Governo. O actual candidato do PS [Fernando José] foi deputado durante anos na Assembleia da República e vereador na Câmara. E pergunto: o que fez o PS no Governo por Setúbal?
Por exemplo, quando nós construímos o Centro de Saúde de Azeitão, o actual candidato à Câmara era então candidato a deputado e foi fazer um vídeo a dizer que aquilo era obra do Governo socialista, quando foi a Câmara Municipal que assumiu a responsabilidade da construção. Isto demonstra a falta de credibilidade que uma pessoa destas tem para gerir a Câmara ou para ter responsabilidades de gestão em qualquer sítio.
No início, lembrou a passagem da gestão da água para o município. Foi a grande conquista deste executivo?
Foi uma grande conquista. Não podemos ter, legitimamente, a água a ser gerida por uma empresa privada. A água deve ser gerida por uma empresa pública. Queria deixar isto bem claro, porque, já agora, dizer que não é o mesmo entendimento da candidata que se anunciou.
Maria das Dores Meira?
Sim. Tem um projecto diferente do da CDU e que, neste caso da água, teve, ao longo do tempo, uma posição diferente da minha. Em 2016, coloquei a questão de terminarmos o contrato com a Águas do Sado. Mas, a minha posição não vingou.
Recuperar a maioria absoluta é o objectivo da CDU para as próximas autárquicas?
Por todo o trabalho, todo o esforço que a CDU tem desenvolvido na Câmara e, em particular, neste mandato, entendo que se justifica que os setubalenses e os azeitonenses possam dar à CDU uma votação maior do que a dada nas anteriores eleições. Mas, a decisão é sempre dos cidadãos.