O deputado do PSD eleito por Setúbal, de quem não conhecemos nenhuma posição clara sobre a localização do aeroporto, vem agora considerar que não é admissível inviabilizar um investimento de interesse nacional só porque duas autarquias comunistas se lhe opõem.
A política foi, é ― e será fundamental que continue a ser ― a arte mais nobre de servir o bem público, a comunidade.
Fazer política é assumir a responsabilidade de agir de forma empenhada em prol do bem comum, para que haja democracia e para que do confronto de ideias possa haver progressos na construção de um futuro melhor.
O respeito por ideias diferentes e por quem as manifesta é o reconhecimento de que é sempre possível aprender mais e fazer melhor. Na política, como na vida, é fundamental respeitar os adversários políticos de forma elevada. Ser sério nos argumentos. Como se costuma dizer, na política não vale tudo.
Infelizmente, existe hoje a ideia, cada vez mais generalizada, de que a política, os políticos e os partidos políticos existem mais para se servirem do que para servir o bem público, o povo.
O descrédito de um político não se deve apenas ao não reconhecimento das ideias que promove e causas que defende. O descrédito vem, muitas vezes, da forma como o faz. Vem isto a propósito de um texto publicado no jornal “O Setubalense” em que um deputado da nação, à falta de argumentos e na expectativa de esconder debilidades suas e do partido que representa, se dedica a confundir os factos.
A realidade é que todos sabemos que a falta de investimento na Península de Setúbal se deve a duas razões fundamentais: falta de vontade política de sucessivos governos e anulação da NUT lll em que este território estava incluído, reduzindo os fundos comunitários a que agora pode recorrer, e que esse facto se deve a uma decisão de 2013 do Governo do partido que este deputado representa, ou seja, o PSD.
Todos sabemos que antes dessa decisão, em 2011, havia sido deliberado localizar o novo Aeroporto Internacional de Lisboa em terrenos do chamado Campo de Tiro de Alcochete, no concelho de Benavente.
Todos sabemos que essa decisão está baseada em estudos de ordenamento do território, de impactes ambientais, sociais e económicos e até que tinha aprovada uma DIA – Declaração de Impacte Ambiental, que, em termos legais, é determinante para viabilizar a localização e a obra.
Todos sabemos que foi o Governo do PSD que decidiu não avançar com este investimento.
Todos sabemos que foi o Governo do PSD que decidiu privatizar a ANA aeroportos. A empresa pública mais rentável do País foi vendida à multinacional francesa Vinci, ao mesmo tempo que ficou acordado que ficava com a responsabilidade de construir o aeroporto no Montijo.
Todos sabemos que, quando veio o novo Governo do PS, o atual primeiro-ministro assumiu o compromisso de realizar essa obra, com o argumento de que não se podia perder mais tempo.
Todos sabemos que esta decisão, incompreensivelmente, foi tomada em 2019, quase um ano antes de estar concluída a avaliação do impacte ambiental. Isto quando ficaram claros os efeitos negativos para o ambiente, para a avifauna, para a segurança aeroportuária e para a saúde e qualidade de vida das populações circundantes.
Todos sabemos que as autarquias da Moita e Seixal, em representação das populações, deram parecer negativo àquela localização, e assim, nos termos da legislação em vigor está inviabilizado o projeto do aeroporto no Montijo.
Todos sabemos que, desde logo, o Partido Socialista colocou a hipótese de alterar a lei e só não avançou porque o PSD na altura não esteve de acordo.
O senhor deputado do PSD eleito por Setúbal, de quem não conhecemos nenhuma posição clara sobre a localização do aeroporto, vem agora considerar que não é admissível inviabilizar um investimento de interesse nacional só porque duas autarquias comunistas se lhe opõem.
Em ano eleitoral, para alguns, tudo serve para atacar os adversários políticos.
O senhor deputado omite os factos e não tem qualquer pejo em fazer afirmações e tirar conclusões que poderiam fazer acreditar na sua história aqueles que andam mais distraídos, ainda que ela esteja tão mal arquitetada.
É que as autarquias locais são realidades territoriais e sociais e como tal devem ser consideradas, independentemente da cor política eleita para as dirigir e representar. Acresce que os estudos feitos são bem claros sobre os impactos negativos na saúde das populações dos territórios envolventes ao projetado aeroporto do Montijo. A saúde das pessoas não é algo menosprezável.
O que não se compreende é que a Câmara Municipal do Barreiro tenha dado parecer favorável, quando a sua população é, provavelmente, a que sofrerá maiores impactos negativos. O mesmo se pode dizer da Câmara de Alcochete, que nem chegou a apresentar parecer, pelo menos que seja público.
Importa referir que o investimento público de interesse nacional não fica posto em causa. Existem alternativas, com estudos feitos, com impactos menores e com custos inferiores, para um projeto de dimensão idêntica ao que se propõe para o Montijo.
É caso para dizer que em política não vale tudo. Não pode valer tudo.