O tema da descentralização tem sido recorrente no discurso político ao longo dos anos mas a verdade é que os diversos processos desenvolvidos, com maior ou menor expressão, souberam a pouco.
Eis que, no verão de 2018, é publicada a nova lei quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, diploma que produziu efeitos após a publicação dos que clarificavam as áreas a transferir. Foi na aproximação do final desse ano que começaram a ser publicados os decretos-lei setoriais, após consensualizados, com diálogo aprofundado, com as associações representativas dos municípios e das freguesias, ANMP e ANAFRE, respetivamente.
Portanto, este processo que sempre foi uma bandeira maior do Governo socialista anterior, e que este novo executivo pretende aprofundar, teve projeção em vários documentos estruturantes como o Programa Nacional de Reformas, o Programa de Estabilidade e, obviamente, o Programa de Governo, assume caráter bem distinto das experiências anteriores. E ainda bem. O desempenho positivo das autarquias locais justifica o seu aprofundamento tanto mais que é fundamental, mesmo urgente, que demos passos sólidos na desconstrução do Estado centralizador que caracteriza Portugal. Para mais, nós não temos desconfiança da capacidade autárquica.
Recordo que foi grande o momento, em 1976, quando da instauração do poder local na Constituição. Está nas nossas mãos fazer do momento presente, outro grande momento com o aprofundamento da diversidade de competências sob a alçada da autonomia do poder local democrático.
Quatro décadas passadas é mais que chegado o tempo de dotar a administração pública local dos poderes que reconhecemos serem possibilitadores de maior governação de proximidade baseada no princípio da subsidiariedade. É isto que o processo em curso representa. E representa também uma forma de aprofundar a reforma do Estado. Essa reforma não se esgota na descentralização para municípios e freguesias, mas passa por ela.
A Ministra da Modernização do Estado, que tutela o tema, passado pouco mais de um ano da publicação dos primeiros diplomas setoriais desenvolve, e bem, um amplo contacto com os autarcas, reunindo com/por Comunidades Intermunicipais e Áreas Metropolitanas para avaliar dos ajustes que se venham a apurar serem necessários. A construção de processos amplos como este apelam à avaliação permanente para perceber-se o que se justifica ajustar, mesmo que tenha havido empenho no processo de concretização.
Há, como aliás em todos os processos de mudança, quem insista no ‘contravapor’. Sem sentido. A descentralização de competências para as autarquias locais – municípios e freguesias –, opção deste Governo, nesta fase, é incompatível com visões centralizadoras disfarçadas até de regionalistas.
A maturidade do processo democrático trouxe-nos até aqui e é recomendável a disponibilidade de todos, com posicionamento político sereno e sério, até porque Portugal é, repito, dos países mais centralizadores da União Europeia.