O Ordenamento do Território que nos últimos 50 anos foi preocupação maior de políticos e técnicos bem-intencionados acabou numa embrulhada de normas, leis e procedimentos que teceram um verdadeiro “colete de forças” para Políticos, Dirigentes e Técnicos da Administração Pública bem-intencionados.
Vamos por partes. Presentemente a atual Lei de Bases de Ordenamento do Território e Urbanismo está em vigor desde 2014. Entre os seus princípios está o da” segurança jurídica e proteção da confiança, garantindo a estabilidade dos regimes legais e o respeito pelos direitos preexistentes e juridicamente considerados”.
A lei de Bases consagra a Classificação do Solo como solo urbano e rústico e a respetiva afetação, qualificação. O desenvolvimento da classificação e qualificação do solo e seus procedimentos de reclassificação estão plasmados no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, RJIGT, desde 2015. Quer a Lei de Bases quer o RJIGT colocaram um ponto final na classificação de solo urbanizável que inundava os Planos Diretores Municipais, PDMs a que quiseram atribuir direitos adquiridos como se de solo urbano se tratasse, que entraram no mercado imobiliário como urbanos, mas continuaram com a inscrição matricial de solo rústico, ocultando as mais valias.
Esta situação foi grandemente responsável pela crise financeira de 2008 que levou à insolvência alguns bancos, que ainda estão na nossa memória, de consequências devastadoras para depositantes, e contribuintes em geral, em que o Estado teve de se chegar à frente com o dinheiro dos nossos impostos para salvar o sistema financeiro. Entretanto, foram anos a limpar o balanço dos Bancos “do lixo tóxico” de imóveis de reduzido valor, sem valor adequado de uma gestão de risco sã e prudente e auditorias que auditavam o que convinha para justificar os créditos concedidos. Os designados NPLs Aquele “lixo tóxico” foi posteriormente alienado em “pacotes” a preços de saldo a empresas do ramo imobiliário, posteriormente transacionados com excecional rentabilidade.
O sistema financeiro gradualmente recuperou, tendo sido instituídas novas regras donde sobressai o Aviso do Banco de Portugal nº3/2020. O Controlo Interno é exigente e as Auditorias Externas Igualmente. Até porque o regime se sanções aplicáveis por incumprimento, por ação ou omissão é pesado para os prevaricadores.
Acontece, que, não obstante ter sido dado um prazo de cinco anos inicial (2015-2020) aos Municípios para limparem dos PDMs os solos classificados como solos urbanizáveis, a maioria deles não conseguiu reconduzir o seu planeamento urbanístico até hoje, nos termos da Lei – Solo Rústico e Solo Urbano. O prazo de cinco anos inicial foi sendo prorrogado por diversas vezes e termina a 31 de dezembro de 2024.
A Proposta de Lei do Governo vai permitir aos Municípios a solução da reclassificação do solo rústico em urbano, a título excecional, sem ter de passar pela teia burocrática da CCDR respetiva. A competência é dos órgãos municipais, câmara e assembleia municipais, sem mais. Por outro lado, os procedimentos a seguir são mais simples desde logo com a revogação do número 3, do artigo 72º. do rjigt, que obrigava a estudos económicos e financeiros altamente complexos para demonstrar a necessidade de transformar solo rústico em solo urbano. A proposta de Lei introduz simplificação e coerência no novo artigo 72º, inclui e determina as áreas ou zonas proibidas de reclassificação do solo.
A alteração ao artigo 199.º da proposta de lei vai agora permitir aos municípios compatibilizar a classificação e qualificação do solo urbano e rústico desde qua a câmara municipal identifique e delimite áreas, devidamente fundamentadas, a comunicar à CCDR respetiva, para alteração do PDM a ser publicada.
Os municípios e os seus autarcas, por maior que fosse a sua vontade em cumprir a Lei, acredito que não foi por falta de vontade, mas o “colete de forças” que resulta da carga de procedimentos labirínticos, contraditórios nalguns casos nas várias instâncias a percorrer, tecem uma teia paralisante que não tem permitido decidir em tempo razoável, nem é dissuasor da corrupção.
A competência de planear, ordenar e urbanizar o território de cada município é dos órgãos municipais. (Intermunicipais se abranger mais do que um município). Os seus instrumentos de gestão territorial são o PDM, o PU e o PP.
Uma boa gestão do território, designadamente urbanística, confere mais transparência ao processo, mais responsabilidade e contribui para prevenir eventuais novas crises financeiras, acautelando o sistema financeiro.