Para mim, as comemorações do 25 de Abril de 1974 começaram em 2021, quando interpretei, como coralista da Associação Setúbal Voz, a música Bella Ciao, para assinalar as comemorações dos 47 anos do 25 de Abril.
Com efeito, a União das Freguesias de Setúbal e a Associação Setúbal Voz estabeleceram uma parceria, através da elaboração do projecto intitulado “47 Bandeiras de Liberdade”.
Esta foi a primeira co-produção entre a União de Freguesias de Setúbal e a Associação Setúbal Voz.
A Associação Setúbal Voz inclui o Coro Setúbal Voz, o Ateliê de Ópera de Setúbal e a Companhia de Ópera de Setúbal.
Num tempo em que ainda subsistem inúmeras ditaduras por esse mundo fora, este projecto evoca os ideais de Abril, percorrendo 47 canções de diferentes épocas e culturas do mundo que encontram denominadores comuns na temática da liberdade.
Foram publicados vídeos – 47 no total – nos quais 47 cantores de Setúbal interpretaram as músicas, através de apresentações individuais em locais distintos da União das Freguesias de Setúbal.
O projecto teve a concepção e direcção do maestro Jorge Salgueiro, director artístico da Associação Setúbal Voz.
A mim coube-me, como vimos anteriormente, a apresentação da música italiana Bella Ciao.
Em plena Lota de Setúbal, completamente vazia de peixe e de gente, endossando um fato de mergulho completo, com barbatanas, botijas e tudo (Apa Soce, deves apanharr muito pêxe assim, deves!!!), colocado em equilíbrio instável no topo de um dos muros e munido de uma bandeira grande, confeccionada pela minha querida amiga Paula Pinheiro, lá cantei a dita música.
Sempre com um drone a perseguir-me.
Aquele foi um momento absolutamente intenso e libertador, artística e pessoalmente falando.
Quanto à música Bella Ciao, não existe uma referência directa relativamente à autoria (letra e música). Terá sido composta no século XIX.
É uma música popular cantada pelas trabalhadoras rurais temporárias, provenientes das regiões italianas da Emília Romagna e do Veneto, que se deslocavam sazonalmente para as plantações de arroz da planície Padana, uma região fértil em torno do rio Pó.
Esta melodia começou por ser uma canção de protesto contra a Primeira Guerra Mundial, mas, anos depois, em contexto da Segunda Guerra Mundial, foi usada e generalizou-se, tornando-se um símbolo da Resistência Italiana contra o Fascismo.
O Venticinque Aprile é também um feriado em Itália, denominando-se “Festa della Liberazione”, festejado todos os anos, a 25 de Abril, quando se recorda a libertação da Itália do governo fascista e da ocupação nazi, ocorrida em 1945, pelas tropas anglo-americanas.
Os ideais de Abril são os da Democracia e Liberdade. Nesta música as palavras-chave são partigiano (combatente), invasor (Alemanha).
Embora fale de morte, menciona simultaneamente a Democracia, através das flores e da montanha, entendidas metaforicamente como dimensões de Liberdade.
Aliás, um dos partigiani mais importantes, chegou a ser um dos presidentes mais importantes e amados da República Italiana: Sandro Pertini.
Durante a sua intensa vida política, Sandro Pertini reafirmou a necessidade de completar a liberdade com justiça social, considerando os dois valores como um binómio indissociável para uma democracia sã e moderna.
São famosas as imagens da sua alegria quando a Itália venceu a Alemanha por 3-1, nos Mundiais de Futebol de 1982, realizados em Espanha.
Quanto ao Bella Ciao, é uma música muito bonita, carregada de significado.
A música também se generalizou devido à serie da Netflix “A Casa de Papel”.
Bella Ciao teve também um significado histórico-social a nível internacional, a saber:
• Em 2013 foi entoada em Istanbul pelos manifestantes contra o presidente turco Erdoğan.
• Em 2015 foi cantada por ocasião das comemorações das vítimas do jornal satírico francês Charlie Hebdo e durante o funeral de um dos seus jornalistas.
• Em 2024, no Parlamento Europeu, foi também interpretada como forma de protesto, após o discurso do primeiro-ministro húngaro Viktor Orban.
Deixo-vos a ligação para poderem apreciar uma forma diferente de comemorar o 25 de Abril, utilizando uma das armas mais belas, sublimes, eficazes e mortíferas contra todas as ditaduras: a Música.
VIVA O 25 DE ABRIL