“Os amigos não morrem: andam por aí, entram por nós dentro quando menos se espera e então tudo muda: desarrumam o passado, desarrumam o presente, instalam-se com um sorriso num canto nosso e é como se nunca tivessem partido. É como, não: nunca partiram.”
António Lobo Antunes
Um qualquer encontro de amigos, constitui sempre uma ocasião especial.
Desta vez, fomos ao encontro do nosso passado comum, com os queridos amigos da Praça do Brasil, que engloba geográfica e afectivamente a Estrada dos Ciprestes, a Av. de Goa, rebaptizada mais tarde Av. Guiné-Bissau e a rua Olavo Bilac.
São os nossos espaços físicos e emocionais da primeira infância que se prolongou até à adolescência.
E, portanto, reunimo-nos numa unidade hoteleira de Setúbal, os amigos Artur Ribeiro, Hélder Justo, João Mário Pato, Manuel Palma (Troiano), Paulo Soares e eu próprio.
Estes encontros de amigos possuem um encantamento e um sortilégio a que nenhum de nós fica indiferente.
Para além disso, acresce a alegria, a satisfação, o regozijo, o gosto, o privilégio, de convivermos, ainda que por pouco tempo, com um conjunto de pessoas que foram importantes nos nossos primeiros passos comuns.
E estes são mesmo os primeiros passos comuns, onde iniciamos as nossas amizades com os amigos do nosso bairro.
Pertencemos todos a uma geração de rua, que fazia da dita cuja um prolongamento natural da própria casa, com as brincadeiras inerentes.
Jogar à bola, ao pião, ao prego, ao berlinde, ao lá-vai-alho, às escondidas nocturnas, às corridas de bicicleta, aos carinhos de rolamentos, aos roubos inocentes de fruta nas quintas limítrofes, etc.
A rua era um local perfeitamente seguro; hoje, infelizmente, os garotos passam a vida em casa, agarrados aos telemóveis e às novas tecnologias, que lhes retiram o carácter genuíno daquilo que eram os nossos contactos relacionais.
Os nossos amigos de infância são pessoas que povoam o nosso imaginário ao longo das nossas vidas.
Com eles, iniciamos a nossa autonomia, nessa altura ainda trémula, bamboleante e insegura, que vai continuando e consolidando progressivamente ao longo da vida, com estradas, cruzamentos, sentidos proibidos, becos sem saída, auto-estradas, numa “metáfora rodoviária”, que constituem os nossos percursos de vida.
Trilhamos caminhos diversos; profissões, amizades, amores, opções, mas, passados todos estes anos, reencontramos um fio condutor coerente que nos une, uma linguagem similar; em suma, recordações comuns, que nos enchem de uma enorme alegria.
No convívio, eramos poucos, mas bons. O Covid tem vindo, infelizmente, a deixar as suas marcas relacionais e a condicionar comportamentos e atitudes.
Nós somos todos vitorianos genuínos, do coração, que exultaram com o resultado com o Caldas, que tinha decorrido durante o repasto.
Relembrámos futebolistas lendários e desafios do Vitória Futebol Clube, que permanecem ainda muito vivos nas nossas recordações comuns. Vitórias com o Spartak de Moscovo, Fiorentina, Inter de Milão, Liverpool, Leeds, Hadjuk Split, etc.
Todos assistiram a todas. Todavia, existe a tristeza de não estarmos no lugar que merecemos.
As caras evidenciavam todas o mesmo: alegria genuína pelo reencontro. Um brilho intenso em todos os olhares.
Ficaram combinados novos encontros. Com mais gente.
Assim permita o Covid.
Quanto a mim, foi um enorme prazer e privilégio poder usufruir, ainda que por breves e fugidias horas, com gente que preenche os nossos espaços afectivos e emocionais.
Até já criámos um grupo no Facebook.
Grande categoria.
Bom Ano de 2022 para todos!