Há alguns anos atrás, quando estudava em Itália, conheci uma israelita de nome Ziva. Pertencíamos ao mesmo grupo e fomos estabelecendo uma relação de amizade.
Um dia, Ziva contou-nos a sua história, rodeada por um pequeno grupo de amigos. História ancestral de um povo que foi inúmeras vezes morto e expulso das terras onde viviam.
“Cristãos-Novos” disse-me ela. “Judeus convertidos à força”. Olhou para mim a falou-me da “Matança da Páscoa”, perante a minha estupefacção.
Perguntou-me se sabia o que era; disse-lhe que sim.
Lisboa. 1506. Reinado de D. Manuel I. Cerca 2000 judeus assassinados. Rios de sangue tingiam as ruas.
Depois Ziva avançou para a sua história pessoal; família levada para Auschwitz, proveniente de França. Quase todos exterminados. Cerca 40 pessoas ao todo.
Falou do colaboracionismo francês. Das denúncias por todo o lado. Das estrelas de David ao peito.
O avô materno foi dos poucos a escapar; escondeu-se e no fim da 2ª Guerra Mundial, conseguiu atingir “Eretz Israel” (a Terra de Israel). Lá conheceu a avó que tal como alguns membros da sua família, já tinham vindo para a Palestina, antes do eclodir da guerra.
Enquanto falava, lembro-me de estarmos todos à mesa no mais completo silêncio.
Ziva falou longamente dos nazis. Fria, objectiva e eficazmente. Uns perfeitos monstros.
Qualquer vestígio de humanidade que pudesse existir, escapou-se, inexorável e criminosamente, pelas chaminés dos fornos crematórios.
Depois fez algumas reflexões que eu nunca esqueci. O que disse foi os judeus foram como carneiros para o matadouro, para os campos de extermínio e que se tivessem resistido, o número de mortos teria sido bem inferior aos seis milhões.
E, portanto, segundo Ziva, o que a História ensinou aos judeus é que nunca se deve dar a outra face. Os israelitas respondiam invariavelmente sempre que eram atacados.
Deu exemplos. A fundação do Estado de Israel, a Guerra dos Seis Dias, o assassínio da equipa olímpica israelita em Munique, a Guerra de Yon Kippur, o desvio do avião da Air France, os atentados, etc.
Com este massacre do Hamas ocorrido recentemente, recordei-a.
Para mim, nem se discute o direito à existência quer do estado de Israel, quer do estado palestiniano.
Claro que as minhas preferências e simpatias pessoais vão para Israel, devido a um motivo fundamental que quase ninguém menciona e que para mim é de extraordinária importância: os direitos das mulheres.
A esmagadora maioria dos países islâmicos consideram as mulheres cidadãs de classe inferior, submetidas à vontade do homem.
Exceptuando a Tunísia e a Turquia onde já existe um apreciável número de mulheres em cargos de poder, de chefia e de responsabilidade, nos restantes países, o nível de discriminação é bastante mais acentuado, nomeadamente na Cisjordânia, bem como na Faixa de Gaza, local onde partiram os militantes do Hamas.
Na Argélia as mulheres são muitas vezes violadas e mortas pelos fundamentalistas islâmicos; no Afeganistão, as mulheres permanecem “sepultadas” numa burka, uma roupa vergonhosa e indigna que não permite sequer ver os olhos.
É a sharia, a lei islâmica que relega a mulher para uma condição de total inferioridade.
Contra esta lei se movimentaram numerosas associações femininas; todavia, muitos dos seus membros pagaram com a vida a sua coragem, não tendo conseguido ainda fazer cair regimes totalmente patriarcais e machistas, comuns à esmagadora maioria dos países islâmicos.
Muito mais graves são as condições das mulheres que vivem em países governados por teocracias, tais como o Irão ou o Afeganistão.
Shirin Ebadi e Narges Mohammadi são duas mulheres iranianas a quem lhes foi concedido o Prémio Nobel da Paz.
Seja como for, nos restantes países islâmicos, onde as condições e dignidade das mulheres são menorizadas de forma recorrente, constituem fortes motivos de preocupação em pleno século XXI.
Com todos os defeitos, Israel é uma democracia, onde as mulheres desempenham um papel vital na sociedade.
Não nos devemos esquecer de Golda Meier, Dalia Itzik e Tzipi Livni.
Sociedades e países que considerem as mulheres seres inferiores, serão sempre condenados ao fracasso.
Quanto a esta guerra, não confundamos ataques militares com massacre de civis. Dos dois lados.
A rejeição da barbárie será sempre o denominador comum numa comunidade civilizada.
Venha de onde vier.