No Verão passado, ao visitar o Panteão Nacional, detive-me a observar e a meditar junto aos túmulos de alguns dos nossos escritores mais sublimes, a saber: Sophia de Mello Breyner Andresen, Aquilino Ribeiro, Almeida Garrett, Guerra Junqueiro e João de Deus.
Sem desprimor para ninguém, tenho uma especial predilecção por Aquilino Ribeiro. Acho-o um escritor genial, eivado de regionalismos, com uma intensidade narrativa forte e exaustiva.
Revisito-o muitas vezes. “Quando os Lobos Uivam”, de 1958, é um livro absolutamente magistral e que lhe acarretou imensos problemas com Salazar e o Estado Novo.
Escrita difícil; por isso mesmo, não é tão conhecido pelos nossos alunos do ensino secundário, o que é uma pena.
Mas voltemos às minhas meditações. Estava nessa ocasião precisamente a constatar que faltava no Panteão Nacional a presença de Eça de Queirós; e Fernando Pessoa; e José Saramago.
José Maria Eça de Queirós nasceu em 1845, na Póvoa de Varzim.
Em 1861, ingressou no curso de Direito da Universidade de Coimbra, onde se formou em 1866.
Nessa época, manteve contacto com os movimentos estudantis dos quais pontificavam Antero de Quental e Teófilo Braga.
Após a licenciatura, foi para Lisboa residir com os pais. Exerceu por algum tempo advocacia.
Em 1867, Eça de Queirós iniciou sua carreira literária, com “Notas Marginais”, folhetins publicados na “Gazeta de Portugal”. Nesse mesmo ano, dirigiu na cidade de Évora, o jornal de oposição “Distrito de Évora”.
Em 1869, como jornalista, assistiu à inauguração do Canal de Suez, no Egipto, que resultou na obra “O Egipto”.
Publicou em folhetins a novela policial “O Mistério da Estrada de Sintra”.
Eça de Queirós, Antero de Quental, Oliveira Martins, Guerra Junqueiro, Ramalho Ortigão, Teófilo Braga, Jaime Batalha Reis e Guilherme de Azevedo fizeram parte da geração de 70, um grupo de intelectuais, que em Portugal no final do século XIX, procuraram impulsionar uma profunda revolução literária e cultural, com base numa mudança nas bases da estrutura política e social portuguesa.
Pretendiam aproximar Portugal da restante Europa, com os novos pensamentos emergentes.
A Geração de 70 constituiu uma pedrada no charco na intelectualidade portuguesa.
Em 1872, Eça de Queirós ingressou na carreira diplomática ao ser nomeado cônsul em Havana.
Em 1874 foi transferido para o consulado de Newcastle-on-Tyne, na Inglaterra.
Em 1875 publicou “O Crime do Padre Amaro”, no qual Eça faz uma crítica violenta da vida social portuguesa, denunciando a corrupção do clero e a hipocrisia dos valores burgueses.
É um dos meus livros favoritos.
Em 1878, Eça de Queirós foi transferido para o consulado de Bristol, também na Inglaterra. Nesse mesmo ano, publicou “O Primo Basílio”, no qual coloca como tema o adultério, colocando o acento tónico na decadência da família burguesa do seu tempo. A crítica social unida à análise psicológica aparece também no romance “Mandarim”.
Eça casou-se em 1886, com 40 anos, com Emília de Castro Pamplona Resende. O casal teve dois filhos: Maria e José Maria.
Em 1888, foi nomeado cônsul em Paris, ano que publicou “Os Maias”, um romance profundo e contundente da sociedade lisboeta da época.
O escritor abandona os elementos realistas e lança-se nos princípios moralizantes deixando transparecer que o valor da existência reside na simplicidade. É desse momento “A Ilustre Casa de Ramires” e “A Cidade e as Serras”, o conto “Suave Milagre” e as biografias religiosas.
Em 1990, Eça de Queirós morre na sua casa em Neuilly, França.
José Maria Eça de Queirós é um dos escritores portugueses mais importantes e fundamentais da nossa literatura. A sua escrita, incisiva e penetrante, retrata de forma soberba a vida quotidiana da sociedade portuguesa da sua época.
O seu estilo inconfundível, pleno de ironia, tendo sempre subjacente uma crítica social implacável, fazem da sua escrita um deleite, um verdadeiro prazer, mantendo-se constantemente actual, 124 anos que são passados sobre a sua morte.
Após muitas polémicas, finalmente os restos mortais de Eça de Queirós serão transladados para o Panteão Nacional.
Em muito boa-hora.
A sua presença, juntamente com a de outros portugueses ilustres, aí sepultados, serve para sabermos, conhecermos, reconheceremos, valorizarmos e homenagearmos a nossa História colectiva.
Um povo que sabe quem foi, sabe também quem é, o que quer e para onde vai.