PENSAR SETÚBAL: Curdistão: Uma história esquecida (2ª Parte)

PENSAR SETÚBAL: Curdistão: Uma história esquecida (2ª Parte)

PENSAR SETÚBAL: Curdistão: Uma história esquecida (2ª Parte)

, Professor
29 Novembro 2022, Terça-feira
Professor

Esta crónica vem na sequência da redigida na outra semana  sobre o Curdistão, na sequência da minha visita a Birmingham, onde a minha filha Leonor me apresentou um colega e amigo, Twana Kamal Haji, um curdo iraquiano.

Em 2019, os curdos, ao terem derrotado o Daesh na Síria, provocaram um alarme na Turquia, onde o seu presidente Recep Erdoğan refere que a democracia é como um comboio em movimento; quando chegamos ao destino, saímos.

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Grande parte do território curdo encontra-se na Turquia, pelo que estes têm procurado conduzir acções de limpeza étnica, substituindo as populações curdas, por milhões de 8árabes sunitas.

Uma das mulheres curdas mais conhecidas e prestigiadas, era Hevrin Khalaf, engenheira civil e secretária-geral do Partido do Futuro sírio, activista pelos direitos das mulheres e pela coexistência pacífica. Dadas as suas enormes habilidades diplomáticas, tinha sido definida como uma das principais vozes curdas no estrangeiro.

Em 2019, Hevrin Khalaf foi assassinada por forças milicianas turcas, numa zona da Síria ocupada pelas tropas de Ancara.

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Em 2020, Michelle Bachelet, Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, exortou a Turquia a desenvolver um inquérito imparcial sobre as violações e possíveis crimes de guerra cometidos pelas forças turcas e congéneres.

A comunidade curda representa cerca 20% da população da Turquia e durante séculos cultivaram o sonho de constituir uma nação independente, nomeadamente o direito de se exprimirem na própria língua, o curdo. Esta aspiração colide com o nacionalismo turco alicerçado desde Mustafa Atatürk, fundador em 1923 da moderna Turquia, até chegarmos a Erdoğan que durante décadas negaram o direito de expressão desta minoria, apelidando-os de “turcos de Este” ou “turcos das montanhas”, em vez de simplesmente “Curdos”.

Em 1977, as reivindicações de independência dos separatistas curdos foram explicitadas num manifesto escrito por Abdullah Öcalan, líder do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), uma organização nacionalista curda de inspiração comunista, numa primeira fase, depois convertida num partido democrático.

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Em 1984, o PKK comete um dos seus principais erros estratégicos, iniciando um conjunto de atentados terroristas contra a Turquia. Classificado pela Turquia, União Europeia e Estados Unidos, como uma organização terrorista, é fortemente condicionada, Öcalan é preso em 1999 e condenado a prisão perpétua.

Em 2012, Öcalan e Erdoğan, na altura primeiro-ministro, procuraram, através de uma reforma da Constituição, resolver a “questão curda” eliminando as referências étnicas, definindo o turco como “língua oficial”, mas possibilitando a existência de outras.

Contudo, nada disto ocorreu e prosseguem acções judiciárias contra jornalistas, por alegadas cumplicidades com o PKK, entre os quais quarenta e quatro de origem curda, acusados de terrorismos e grande parte deles na prisão.

Se, de facto, o recente atentado na Turquia foi da responsabilidade do PKK, tal não augura nada de bom.

Este atentado deu o pretexto a Erdoğan bombardear recentemente os curdos na Síria.

Com a guerra na Ucrânia e com a vontade de aderir à NATO por parte da Finlândia e da Suécia, Erdoğan obteve a possibilidade de imiscuir-se na política interna alheia, um dos seus jogos políticos favoritos.

É pura chantagem. Ou os dois países nórdicos adequam as próprias leis e extraditam cerca setenta e três curdos procurados por terrorismo, ou então a sua adesão não será ratificada. Na Suécia, em particular, o governo social-democrata é acusado de ter traído os curdos, de ter pisado os valores constitucionais e de ter colocado nas mãos de Ancara a sua política externa.

Quando aos curdos, estão desiludidos, ressentidos e preocupados. “Negociou-se de novo nas nossas costas”, afirmam.

Seja como for, se existe algo que a História nos ensinou é que o desejo de independência de um povo constitui uma força motriz extremamente poderosa e que não se deixa nem subjugar, nem acantonar, nem condicionar por violência arbitrária, proibições de língua, deportações forçadas, ou políticas de cosmética. Mais tarde ou mais cedo, essa força irrompe mais forte que nunca e inunda desenfreadamente os espaços físicos, políticos, sociais, afectivos e emocionais.

Fica aqui assinalada de uma forma particularmente intensa, o desejo do povo curdo pela sua independência, por um Curdistão livre e democrático.

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