Num destes dias, fui ver o filme intitulado “1917”, do realizador Sam Mendes, que retrata um dos episódios ocorridos durante a 1ª Guerra Mundial, em França.
Este gigantesco conflito bélico a nós, portugueses, diz-nos directamente respeito, uma vez que participámos, através do Corpo Expedicionário Português, em França e destacamentos de tropas, em África.
O meu avô Carlos, deixou a família aqui em Setúbal, para comandar um destacamento do exército, em Angola, na província de Kuando Kubango, junto à fronteira com a Namíbia, na altura território ultramarino alemão.
Mas regressemos ao filme; Sam Mendes é descendente de portugueses. Os seus bisavós eram madeirenses que professavam a religião protestante. Por esse motivo foram perseguidos, tendo tido necessidade de abandonar o arquipélago e refugiar-se nas ilhas Trinidad e Tobago, nas Caraíbas. Aí nasceu Alfred Mendes, avô de Sam Mendes.
O argumento de “1917” foi inspirado nos relatos verídicos do avô Alfred, que também foi mensageiro na 1ª Guerra Mundial, com apenas 19 anos, a quem o filme é dedicado.
Baseado na história verídica de dois soldados ingleses a quem é atribuída a difícil missão de transmitirem uma mensagem a um dos batalhões, para impedir um ataque britânico que estava há muito a ser previsto pelas tropas alemãs.
Sam Mendes utiliza uma técnica inovadora de planos de sequência, dando a sensação que o filme nunca sofre cortes e que o espectador se encontra “dentro” do filme, fazendo parte intrínseca da história, e não como observador exterior.
Um dos aspectos que considero muito bem conseguidos, foi o facto de “1917” conseguir retratar com exactidão, os espaços físicos e emocionais do conflito. As trincheiras, a lama, a paisagem “lunar” repleta de crateras, os ratos, os cavalos e vacas mortos, com as moscas a rodeá-los. E, sobretudo, o cheiro permanente da morte, com os sucessivos cadáveres de jovens soldados ingleses e alemães, mutilados, inchados, decompostos e deformados, que nos surgem regularmente no filme, ilustram-nos com muita intensidade e extremo realismo, a crueza, inumanidade e o horror absoluto da Guerra.
Ao longo das duas horas, “1917” segue um ritmo intenso, dinâmico, que cola o espectador à cadeira e nos faz sentir como parte da história. A rapidez da acção, os planos de sequência, a permanente tensão e perigo, com a morte sempre presente ao virar de um canto, de uma casa, uma parede, ou de umas ruínas, conjugam-se numa narrativa que nos deixa ficar frenéticos, pela violência física e psicológica a que os dois protagonistas são permanentemente sujeitos e que nos tira o fôlego.
No filme, não existem tempos “mortos”. Esses surgem-nos literalmente, com a rapidez e brutalidade habituais nestes conflitos.
“1917” é um dos melhores filmes de guerra que tenho assistido. Com uma qualidade técnica notável, Sam Mendes proporciona-nos cenas marcantes e inesquecíveis, aliadas a uma grande cinematografia e banda-sonora, sem nunca abandonar a história que nos faz reflectir sobre a Guerra e a Humanidade.
Relativamente à 1ª Guerra Mundial, todos pensavam que iria ser uma guerra rápida, fulminante, com o objectivo de regressar o mais rapidamente possível para casa.
Aquilo que foi pensado para durar cinco meses, durou quatro anos. O mundo novo prometido não passou de uma ilusão.
Contudo, com a 1ª Guerra Mundial, a Humanidade atingiu seguramente um dos seus pontos mais baixos de sempre.
A Dor, a enorme Dor Humana, individual e colectiva, essa é, de facto, a característica que perdura.
“1917” é, quanto a mim, um dos melhores filmes dos últimos tempos, que recomendo vivamente.