No passado mês de Janeiro, completaram-se 700 anos sobre a primeira referência documental à actual cidade do Montijo, anteriormente designada de Aldeia Galega do Ribatejo.
O documento mais antigo, até agora encontrado, que lhe faz menção, uma carta de aforamento da Colegiada de Santa Marinha do Outeiro de Lisboa, tem a data de 5 de Janeiro do ano da Era de César de 1359, o que corresponde, na nossa Era do Nascimento de Jesus Cristo, ao ano de 1321. Nele se pode ler: “feita a carta em Aldeia Galega do Ribatejo cinco dias de janeiro, Era de mil trezentos e cinquenta e nove anos” (Francisco Correia – Aldeia Galega do Ribatejo: Séculos XIII a XV. Montijo: Câmara Municipal, 2001, p. 27).
Assim, contam-se já em 700, pelo menos, os anos de existência desta localidade, assim designada, até 1930, de Aldeia Galega do Ribatejo, e hoje denominada de Montijo.
Seria motivo para festejar não fora esta terrível pandemia, conhecida por Covid-19, que nos assola a todos e a que o Montijo não está imune, e só comparável com a que sofrera com a chamada pneumónica.
Há um século, mais precisamente nos anos de 1918-1919, e perante esta emergência médica, é criada na então Aldeia Galega do Ribatejo, em sessão da Câmara Municipal de 9 de Outubro de 1918, uma comissão para minimizar as suas consequências.
Dos seus elementos, gostaria de destacar a abnegação e a coragem do Dr. César Ventura, durante esta pandemia: contam testemunhos coevos que o Dr. César Ventura percorria as ruas da vila, dia e noite, em socorro dos doentes, dando-lhes, não só os necessários cuidados médicos, mas, acima de tudo, o apoio psicológico e financeiro, tirando do seu bolso para lhes dar os medicamentos e os alimentos.
E não se pense que era de sua obrigação funcional este seu exercício médico, ao longo da pneumónica: ele tinha desistido do exercício profissional da Medicina, para se dedicar aos negócios familiares, e só a exercia, de forma benemérita.
Maior ainda o valor do seu contributo nesta causa, esquecendo desistências antigas e empenhando-se, como médico e como cidadão, no socorro dos demais e no bem comum, como se dele se tratasse. E já no rescaldo desta calamidade, vê a concretização do que viria a ser o mais importante projecto da sua vida: a criação, no ano de 1919, do Orfanato de Aldeia Galega, instalado numa propriedade que adquiriu para o efeito, numa tentativa de recolher os órfãos da pneumónica.
Deste mesmo heroísmo se têm imbuído os nossos profissionais da saúde, no actual contexto de pandemia pelo novo coronavírus e aqui deixo este meu testemunho.
Que o exemplo do Dr. César Ventura lhes possa servir de estímulo, e que pelos poderes públicos e pelos cidadãos do concelho do Montijo lhes sejam prestadas as justas homenagens, os desejos do autor desta crónica que, a pretexto da efeméride, muito se quer associar.
A antiguidade da cidade do Montijo é garantia que a sua população está preparada para estes novos desafios e para outros 700 anos, com saúde.