Há mais de uma semana que Setúbal tem estado nas bocas do mundo pelos piores motivos.
A história é sobejamente conhecida com toda esta trapalhada envolvendo a Câmara Municipal de Setúbal (CMS), russos, ucranianos e respectivo acolhimento.
Igor Khashin (presidente da direcção da Associação de Imigrantes dos Países de Leste) e Yulia Khashina (funcionária da CMS), marido e mulher, trabalham para a autarquia há alguns anos, já durante os mandatos de Maria da Dores Meira, nomeadamente num gabinete localizado no Mercado do Livramento, com outra funcionária da CMS, recebendo refugiados e respectiva documentação.
Uma portuguesa, dois russos; nenhum ucraniano.
O presidente da Associação Ucraniana em Portugal, Pavlo Sadokha indicou que foram “alertados pela comunidade ucraniana naquela zona de Setúbal que Igor Khashin, bem conhecido por ser pró-Putin, estava a apoiar e a recolher dados dos refugiados”.
O presidente da CMS André Martins afirmou que são pessoas “com provas dadas e da sua absoluta confiança”, na sessão pública realizada no dia 20 de Abril.
Na referida sessão, quer Fernando José do PS, quer Paulo Calado do PSD, chamaram a atenção para o carácter insólito desta situação referente ao acolhimento dos refugiados ucranianos.
Segundo fontes que não identifico por questões de deontologia profissional e de segurança, dado o contexto da guerra em curso, Igor Khashin terá solicitado explicita e reiteradamente informações pormenorizadas sobre os familiares que ficaram na Ucrânia, quase sempre sobre os homens que se encontram a combater as tropas russas. Terão sido também fotocopiados passaportes e certidões de nascimento.
Para além disso, os dois russos não falam ucraniano, mas sim russo (são línguas diferentes, tal como o português do italiano) e evidenciando um profundo desconhecimento da geografia da Ucrânia.
Foi necessário um artigo no jornal Expresso de 29 de Abril, para que toda esta história tivesse dimensão nacional; e aí propagou-se rapidamente, com informações diversas a surgirem em catadupa, adensando cada vez mais a narrativa.
A Câmara Municipal de Setúbal tem estado debaixo de fogo por culpas próprias, nomeadamente através da utilização de uma metodologia claramente inadequada para tratar estes assuntos de carácter absolutamente confidencial, com a gravidade acrescida de ter necessidade de recorrer a entidades externas.
É perfeitamente inadmissível o facto de refugiados ucranianos que fogem da guerra provocada pela Rússia, estarem a ser recebidos por russos, sendo que o primeiro dever de quem os recebe é garantir a sua segurança, serenidade, tranquilidade, protegendo os seus dados e os de quem se encontra na guerra.
Somente após terem sido tornadas públicas estas situações é que Yulia Khashina foi retirada dessas funções.
Apesar do Regulamento Geral de Protecção de Dados (RGPD) ter entrado em vigor em Maio de 2018, somente agora, depois de conhecido este caso, é que a CMS nomeou um encarregado de protecção de dados.
Voltando a Igor Khashin e de acordo com a SIC Notícias e com o Expresso, após a invasão da Rússia à Ucrânia (Crimeia), ocorrida em 2014, deslocou-se a Moscovo, onde terá assinado um documento de apoio à referida invasão, altura em que começou a ser monitorizado pelo Serviço de Informação e Segurança (SIS)
E, portanto, tudo aquilo que se relaciona com a actividade de Igor Khashin e Yulia Khashina em Portugal, deve ser investigado com o maior rigor e celeridade possíveis por quem de direito, quer estejam em conluio com as autoridades russas, quer não. A confirmarem-se as suspeitas, estamos a falar de espionagem, um assunto de Estado da maior gravidade, acrescida pela situação presente de guerra declarada.
Seja como for, conhecendo o modus operandi de Vladimir Putin, a existência de russos a receberem refugiados ucranianos, o percurso de Igor Khashin e o facto do Partido Comunista ser o único partido português que não condenou de forma clara a invasão russa, estamos perante uma confluência de águas turvas que geram suspeições; convém, repito que haja uma investigação rápida e eficaz, efectuada pelas autoridades competentes.
Este é um exemplo típico em que a Democracia sai reforçada com a existência de uma imprensa forte, livre, independente e responsável, induzindo o espírito crítico, motor das sociedades.
Algo que não existe na Rússia.