Eu penso que desde pequeno, localizo em mim esta vontade de considerar, antes de opinar, a posição defendida pelos outros. Há quem veja nisso, interpretando-me mal, apenas vontade de contrariar: ir contra o senso comum. Ser, como se costuma dizer: o “advogado do diabo” e dar comigo em contra corrente, a contrariar o que todos parecem querer e a defender o que parecem recusar. Talvez…! Mas antes assim, do que hoje contra e amanhã a favor, conforme bate o vento ou me leva a maré do conveniente.
Ora, se com o vento se foram as vozes críticas, que a pandemia despertou contra os “ovos todos no mesmo cesto”. Consentida por ela, a maré do verão os trouxe de novo, de ouro e no mesmo cesto e cheio demais os arruma, tratando a pão de ló a galinha chamada turismo que os botou.
As televisões digladiam-se com programas de promoção. E se aqui são os vinhos, provas e restaurantes, ali as praias, acolá os trilhos, estâncias, passadiços, numa acérrima promoção de um país que se quer vender, em clima, serviços e sorrisos. Esperando e cada vez mais dependentes dele, que o conseguido com a sua venda nos permita agora, importar tudo aquilo que deixámos nós de produzir. Sacrificando deste modo e em seu nome, como desesperados de mão estendida, tudo e todos os que que dele não vivam, no paradigma de que: residente hoje e aqui, turista amanhã acolá. E apostando todas as fixas num mercado que a pandemia fez tremer ontem e que qualquer desequilíbrio mundial, pode fazer tremer de novo amanhã. Surdos a esse erro de gestão económica, surdos também ao descontentamento de quem assim o considera e suas consequências receia, e no exagero de algumas regiões, se entristece e revolta.
Ou apenas, porque nem todos estando de férias, ver o seu descanso diário prejudicado e em nome do mesmo turismo, as mais bonitas ruas e avenidas da sua localidade, cheias de gente, movimento, ruido e cheiros. Sujas de copos e garrafas de plástico, entre os cacos das que eram de vidro e cuja violência do desentendimento, ou apenas, divertimento alcoólico quebrou, e a que as autoridades, tolerantemente fecham os olhos ou minimizam, em nome da dita fonte de rendimento, que subservientemente e de passadeira vermelha recebemos. Pondo os outros, filhos residentes da terra, a pagar mais caro pelo café, almoço ou jantar, em cima da inflação, no local que sempre frequentaram e a onde agora, veem na disponibilidade do funcionário sazonal, a vénia e sorriso oferecidos ao turista, em troca do educado, mas seco e apressado: “diga lá o que quer?”, reservado para si, depois de horas de espera. E a quem, nalguns casos as autarquias, agora e muito bem, face á extrema seca, desligam regas e chafarizes públicos, esvaziam e fecham piscinas municipais, e pedem recomendando, senão proibido mesmo, o uso de água para lavagens, ou rega da sua pequena e doméstica horta, fonte de apoio á parca reforma rural. Isto, paredes meias, com a sempre cheia piscina do hotel, ou os frescos e verdinhos campos de golfe. A onde, mesmo já poupando com sistemas inovadores, tendo o Algarve como exemplo e seus 31 campos, o equivalente ao consumo de 240 mil residentes é gasto. Ou seja, 60% da população, a quem, por mais bonitos, brilhantes e aparentemente valiosos “ovos de oiro”, resultam hoje, numa omelete para poucos, a pagar amanhã por todos, não caia o cesto e se quebrem os ovos.