Em Outubro de 2022, a Inspectora-geral da Administração Interna, afirmou algo muito perturbador: “Deve fazer-nos reflectir que em Portugal, como noutros países, mais polícias morrem por suicídio do que em serviço. Isto reflecte as dificuldades do trabalho, o stress a que estão sujeitos e até problemas emocionais e físicos de saúde que são sintomáticos de burnout”.
Vamos por partes. Não obstante o aumento de 14,4% na criminalidade violenta e grave, em 2022, por comparação a 2021, verificou-se uma descida de 7,8%, em 2022, face a 2019. Podemos, por isso, continuar a afirmar que Portugal é um país seguro. Desta forma, o número de polícias mortos em serviço é, felizmente, baixo. O factor perturbador é, então, o fenómeno dos suicídios nas forças policiais. E afinal, o que se passa?
Assumindo que esta é uma realidade transversal às várias forças policiais, o que justifica que, precisamente, entre os escolheram proteger o bem-estar físico e material dos cidadãos, muitas vezes com risco para a própria vida, se verifique uma taxa de suicídio que quase duplica a da população geral?
Será que estes suicídios resultam das tensões e frustrações geradas pela convivência diária com a criminalidade, a pobreza e a degradação humana? Será que resultam de tensões e frustrações acumuladas por terem de lidar, sem os meios mais adequados, com situações que a maioria de nós não julga serem possíveis?
Sentimentos, estes, agravados por carreiras pouco atractivas, remunerações baixas, instalações obsoletas ou viaturas inoperacionais? Sentimentos que muitos suportam sozinhos, por estarem deslocados das suas zonas de residência, longe da sua família ou dos seus amigos?
Será que resultam de tensões e frustrações que os agentes não sabem como gerir e que, por isso, não conseguem suportar ou ultrapassar, em consequência da falta de recursos do Estado para garantir apoio psicológico?
Entre as funções soberanas e exclusivas do Estado está o monopólio da violência para a defesa do bem-estar das pessoas, dos seus bens, da lei e da ordem pública. E, nesse sentido, é urgente melhorar as condições de trabalho das forças de segurança, para que seja possível resolver os muitos problemas já aqui identificados.
Será a conjugação destes factores, associada a uma reorganização ou, eventualmente, reforço de meios que permita aliviar a quantidade diária de solicitações a que um agente tem de responder, que fará baixar a taxa de suicídio?
Honestamente, não posso dizer. Porém, dificilmente os números vão piorar por o Estado cumprir com o seu papel, perante aqueles que o representam, diariamente, nas mais perigosas situações.
Cada vez menos pessoas estão dispostas a ser polícias. É compreensível. Apenas um elevado altruísmo ou uma coragem física e psicológica grande podem fazer com que alguém, hoje, se voluntarie para tal.
Este é o resultado do desinvestimento e do esquecimento, muito em consequência dos preconceitos ideológicos dos anos da “geringonça”, mas não só, que apoucaram, diminuíram e desautorizaram as forças e os serviços de segurança nacionais.
De acordo com a comunicação social, nos primeiros três meses do ano, cinco agentes da PSP puseram termo à própria vida. É por isso que temos de perguntar: O que se passa? Por respeito aos próprios, às suas famílias, aos que hoje vestem a farda e aos que ainda sonham ser polícias.