A maioria absoluta de Costa foi por causa da geringonça ou para se livrar dela? Esta é a pergunta a que é preciso tentar dar uma resposta racional, pois, vai depender dela o sucesso ou a derrota do PS nas próximas eleições. Na disputa interna, parece que esta é a linha de corte, estar ou não estar a favor da possibilidade de se reeditar a solução política que Costa tirou da cartola e lhe permitiu governar até hoje.
“Derrotar a direita” é o slogan de quem não acredita que o PS consiga uma nova maioria absoluta e veja como única alternativa usar o PCP e o BE para chegar à governação. Há, no entanto, dois problemas.
Um, saber se o PCP e o BE estão disponíveis para se voltarem a meter na boca do leão, pois à primeira qualquer um cai, mas à segunda a coisa fia mais fino; vejam-se os resultados eleitorais que ambos obtiveram depois daquela aventura. Que preço teria o PS de pagar para conseguir o apoio de ambos para construir uma alternativa de poder?
A segunda, se os militantes, os simpatizantes e os votantes de ocasião estão mais disponíveis para votar no PS se o objetivo for “derrotar a direita” na expectativa de uma aliança pós-eleitoral com PCP e BE ou, pelo contrário, se o que estiver em causa for construir uma alternativa sólida de governo construída numa ampla base de diálogo com todas as forças políticas interessadas em fazer progredir o país.
Com todo o respeito pelo PCP e pelo BE importa perguntar se os exemplos de Cuba, da Nicarágua ou da Venezuela, países que parecem constituir os seus modelos preferenciais, são o que os portugueses desejam para si próprios e a solução que os eleitores socialistas estão desejosos de sufragar? A sabedoria popular aplica-se aqui na perfeição “Diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és”.
É evidente que esta questão é fraturante dentro do PS, mas não é estratégica para o desenvolvimento, nem para o futuro do país, a Geringonça teve o seu tempo, mas a história avançou muito rápido, o mundo transformou-se e o país também e não é líquido que os eleitores estejam muito satisfeitos com a situação atual e com a perspetiva de se voltar atrás.
Mais do que “derrotar a direita” o que o PS precisa é de reconquistar a confiança dos portugueses e isso não se faz com as mesmas pessoas, os mesmos chavões, as mesmas políticas, é preciso avaliar o que correu mal e porquê e fazer agulha para novas realidades.
O mais importante nas eleições internas do PS não é se um candidato é geringonço e outro não, é se tem experiência de vida e compreende as dificuldades dos mais frágeis, se sempre viveu na bolha partidária ou manteve atividade profissional que o tenha posto em contacto com os problemas reais da sociedade, se apenas ocupou lugares no Parlamento ou se se candidatou com sucesso a autarquias e lá deixou obra, se nas experiências governativas em que interveio fez avançar o país ou deixou a imagem de descuido e de polémicas e, sobretudo, se é pessoa confiável.
O futuro líder do PS tem de ser encarado na sua dimensão mais relevante, a de potencial primeiro-ministro, e para isso exige-se mais do que uma escolha por impulso, é importante uma reflexão ponderada sobre as personalidades em confronto e sobre as respetivas capacidades para dialogar à direita e à esquerda, já que muito dificilmente se chegará a uma solução matematicamente simples.
Em Setúbal ganha ainda maior expressão a necessidade de uma solução clarificadora, a concelhia do PS tem como principal ação política derrotar o PCP na autarquia, logo nova Geringonça só podia atrapalhar.
Dos três candidatos em disputa José Luís Carneiro é o único que assegura pontes à esquerda e à direita e tem a humildade necessária para conseguir fazer as pazes com os descontentes com a governação do PS.