Escrevo este artigo no rescaldo do Conselho de Ministros extraordinário, realizado no sábado passado, e que aprovou o decreto n.8/2020 regulamentando a aplicação do novo estado de emergência.
No dia anterior, em Plenário da Assembleia da República, havia manifestado o meu acordo com a decisão de retornar a esta situação por confiar que, apesar de duro, este é um caminho necessário. Paralelamente, contudo, importa dar atenção a diversos aspectos que podem facilmente cair no esquecimento numa perspectiva global e mais abstracta, acabando por serem tomados como meros detalhes.
Comecemos pelo óbvio: sim, é preciso fazer de tudo para evitar um novo confinamento total a menos que este se mostre absolutamente imprescindível. Mas não me parece que medidas como a do recolher obrigatório a partir das 13 horas aos fins-de-semana seja útil nesse sentido, quanto muito irá concentrar ainda mais as pessoas nos locais durante as horas em que podem sair, nomeadamente aquelas que, trabalhando durante a semana, fazem ao sábado as suas compras domésticas. Acresce que agrava profundamente a situação da restauração – já de si bastante afectada pelas alterações que têm vindo a ser implementadas como a redução de horários e o acautelar do distanciamento social entre os clientes -, sector que sustenta tantas famílias no nosso país.
Por outro lado, as excepções à circulação condicionada acabam também por fazer pouco sentido, sobretudo aquela que diz serem permitidas “deslocações por outros motivos de força maior”. Aqui cabe de tudo um pouco, sendo imprescindível o uso do bom senso pela população.
E enquanto isso, há pessoas em situação extremamente frágil, angustiadas pela incerteza em relação ao mais básico: à sua alimentação e das suas famílias, ao direito à habitação e à saúde, à manutenção do seu posto de trabalho, à sua segurança…
Em relação aos profissionais de saúde, há que acautelar que estes consigam cumprir as suas funções, manterem-se seguros e conseguirem ter tempo para os seus, bem como assegurar que têm à sua disposição todos os meios necessários para o combate à pandemia.
É também de extrema relevância que o foco dos serviços de saúde não se limite ao tratamento da Covid-19. Há relatos de pessoas com outras condições, desde doença oncológica a perturbações mentais, que esperam consultas e tratamentos há meses. Urge assegurar o tratamento atempado de outras doenças!
É preciso promover o teletrabalho e o desfasamento de horários, mas assegurar também o respeito pela dignidade dos trabalhadores. É preciso reforçar os transportes públicos, para que as pessoas possam deslocar-se em segurança. É preciso promover práticas preventivas, seja o uso da máscara ou a manutenção do distanciamento social.
Mas é preciso, também, transmitir confiança aos portugueses para que estes possam manter a suas vidas dentro da normalidade tanto quanto possível. É importante que as pessoas saibam que, respeitando certas condições, é seguro continuar a ir ao mercado, às aulas, ao teatro ou ao restaurante. Importa saber que há vida para além da Covid-19!