A nomeação de Hélder Rosalino para secretário-geral do Governo pode ter sido feita entre o Natal e o Ano Novo, mas nem assim o Governo conseguiu que passasse sem controvérsia. Polémicas há várias – o facto deste cargo ser de nomeação direta em vez do normal processo de recrutamento de dirigentes públicos, o atraso na nomeação deste dirigente e, ainda, a alteração à medida do decreto-lei para lhe permitir receber um salário superior.
A principal questão, todavia, que qualquer português razoável teve com esta nomeação é, mesmo, o volume do salário que Rosalino aufere e que iria manter. São 15.900€, aproximadamente 4 vezes mais que os seus adjuntos e mais de 10 vezes o que ganha um técnico superior. É um desfasamento salarial que não é suposto acontecer e que iria naturalmente gerar dificuldades de liderança para além da reação mediática inicial. Isso era particularmente assim com este indivíduo que foi um rosto dos cortes durante o período da troika.
O argumento de que Rosalino apenas manteria o seu salário do Banco de Portugal vale de pouco. Tal apenas sucede porque esta instituição vive num regime de exceção em termos de remunerações e não só, onde o dinheiro de todos é (há décadas, diga-se) esbanjado em luxos de reduzida ou nenhuma utilidade pública, justificados meramente pela equiparação desta instituição aos demais bancos centrais europeus. É assim nesta e noutras entidades reguladoras com menor grau de competição internacional e cuja moralização administrativo-financeira já há muito tempo se impunha.
De qualquer modo, Rosalino foi uma nomeação política. Sabe bem que a política é uma missão que não aceitamos para nos servirmos ou para enriquecermos, mas para servirmos o bem comum. Por isso muitos deputados e ministros já aceitaram funções que implicaram perda de rendimentos. Mesmo se reajustarmos os rendimentos dos políticos e dirigentes públicos, devemos perder qualquer ilusão que estes vão ser competitivos com os salários dos altos quadros das empresas. Não é, mesmo, para isso que servem e não pode, mesmo, ser essa a motivação de quem faz política.
Em última instância, devemos recordar-nos que há gente além de Rosalino: milhares de assistentes operacionais, assistentes técnicos e técnicos superiores, para não falar das carreiras especiais. São eles, muito mais do que um dirigente, quem faz os serviços públicos e dá a cara perante os cidadãos.
São profissionais cujos salários estão, esses sim, gravemente desajustados a funções equiparáveis no privado e para os quais, nem concursos de recrutamento abrem. Não são mandriões à procura de emprego para a vida (alguns serão, como também os há no privado). Nalguns casos, são pessoas com funções que só existem no Estado. Em todos os casos, são pessoas que estão em carreiras instáveis e de lenta progressão. Ser funcionário público pode não ser um fator de prestígio como era mas continua a ser, para muitos de nós, uma missão pessoal em prol de todos. No meio desta polémica, é também deles que devíamos estar a falar.