De 24 a 26 de junho ocorreu, em Haia, a cimeira da Aliança Atlântica. Ficou acordado um incremento da despesa com a defesa até aos 5% do PIB até 2035. Desses 5%, preconizam-se 3,5% em despesa direta com defesa e armamento e 1,5% em despesa com infraestruturas com utilidade para suporte em funções de defesa. Portugal gastou, em 2024, cerca de 1,58% (ou 4,48 mil milhões de euros) do seu PIB com a defesa, uma das percentagens mais baixas da aliança.
Já agora, em 2014 em Gales, os países da aliança tinham-se comprometido a chegar aos 2% do PIB com gastos em defesa (compromissos leva-os o vento). Este novo acordo firmado em Haia prevê que gastemos cerca de 14 mil milhões de euros em defesa (valores calculados com base no PIB de 2024). Tudo estaria bem, não fosse este novo compromisso representar um esforço de 15% da despesa programada pelo Orçamento do Estado de 2024. Havendo crescimento económico até 2035, estes valores crescerão.
Estamos a falar de uma diferença de cerca de 10 mil milhões de euros. Estamos a falar de um esforço financeiro de, pelo menos, mil milhões de euros por ano até 2035. De onde virá todo este dinheiro? Para onde irá todo este dinheiro? É a indústria de defesa portuguesa assim tão capacitada que consiga dar resposta a tamanha procura? Terá esta despesa um grande efeito de fomento industrial e arrastamento da economia? Em parte, tenho as minhas dúvidas. Muita desta despesa sairá do nosso país. Ainda outra pergunta: estão as Forças Armadas, na sua situação atual, capacitadas para executar tamanha despesa?
A Cimeira da OTAN em Haia foi um triste espetáculo. “A Europa vai pagar à GRANDE, como deveria, e será sua a vitória.” A bajulação fica mal a qualquer pessoa, mas do Sr. Rutte já não se pode esperar que tente conciliar os interesses dos diversos Estados-membros da OTAN. É penoso, vindo de um europeu. E, caro leitor, o absurdo é que nem os EUA gastam tamanha percentagem do PIB em defesa, nem com tal se comprometeram em Haia.
Adiciono um terceiro facto que é de interesse: a totalidade dos países europeus membros da OTAN gasta, em conjunto, mais em defesa do que a Rússia. E não são duas vezes. São três. Mas por que não quatro? Ou cinco? Ou dez? Façamos da Europa uma Prússia da modernidade. Vários exércitos com Estados. Em Haia, os países europeus agiram contra o seu próprio interesse e, com a culpa dos penitentes, comprometemo-nos com algo muito difícil de cumprir.
Si vis pacem, para bellum. “Se queres a paz, prepara-te para a guerra” é um adágio atribuído a Flávio Vegécio, um general romano do século IV. O conceito central da OTAN é a defesa coletiva, onde um ataque a um membro é considerado um ataque a todos. Neste sentido, o fundamental é que Portugal cumpra os Objetivos de Capacidade da OTAN e, para isso, deve alocar a despesa necessária. Tenho dúvidas de que sejam necessários 5% do PIB para tal.
Dois? Não. Três! Cinco! Quem dá mais? Esta cimeira da OTAN foi um autêntico leilão de desnorteamento. Um embaraço. Uma peça de teatro gerida ao milímetro para não causar enfado ao presidente norte-americano, Donald Trump. O desenlace já estava escrito à partida, desde a Sala Oval, e os países europeus não souberam — ou não quiseram — bater o pé (a exceção foi Espanha).
Portugal é membro fundador e um parceiro comprometido com a OTAN e, sim, a despesa com defesa precisa de aumentar para garantir o regular funcionamento das Forças Armadas e o cumprimento da sua missão. Nesse sentido é necessário cumprir a Lei de Programação Militar para capacitar as Forças Armadas dos meios necessários ao desempenho das suas funções. Dito isto, 5% do PIB parece-me uma irresponsabilidade, uma aleatoriedade e uma desnecessidade.
O compromisso para com os nossos aliados nunca poderá colocar em causa as contas públicas nem o regular funcionamento das funções sociais do Estado. Sem estas precauções, caminharemos para um país mais pobre, desigual e endividado. Caminharemos para o abismo, sim. Felizes, nem por isso — mas entretidos e ao som da fanfarra.