A pandemia demonstrou que o modelo escolar atual está esgotado. No contexto pandémico em que vivemos, pode afirmar-se que «não há nada de novo, mas tudo mudou». Os primeiros sinais que indiciam a mudança do paradigma educativo podem ser considerados pouco felizes, nomeadamente a hipervalorização das novas tecnologias, assim como a ideia de que o ensino aprendizagem pode ser garantido à distância. Estas evidências não podem deixar de ser associadas à desvalorização da classe docente, iniciada com Maria de Lurdes Rodrigues e continuada pelos seus sucessores. Sobre o uso exagerado das novas tecnologias, uma professora amiga comentava: «consigo motivar os alunos através do relato de uma pequena história, mas não com o visionamento de um filme; eles começam a estar fartos de écrans na sala de aula.» Quanto ao ensino à distância, é tempo de recordar que a escola é um espaço de socialização, o que não acontece em frente a um ecrã na casa de cada aluno.
António Nóvoa alerta: «Nós, educadores, somos uma espécie de impertinentes otimistas. Acreditamos que pode não ser. Mas o retrocesso pode dar-se também- e está a dar-se durante a pandemia- na questão do modelo escolar. O modelo está a ser transformado, mas da pior maneira. Com uma crença de que a escola talvez não seja necessária, de que provavelmente possamos educar as crianças em casa, ou em outros espaços com recurso às tecnologias e ao digital. Pode haver uma transformação do modelo, mas num sentido profundamente negativo.»
Se a porta da mudança está entreaberta, o que se deve fazer? Ouvir os professores- o que esta tutela tem demonstrado não querer ao contrário dos tempos dos governos de António Guterres-ouvir os alunos, os encarregados de educação, os sindicatos e outras instituições. Definir linhas orientadoras para um período de, pelo menos, 10 anos, não esquecendo que é fundamental garantir a equidade, já que a escola para todos- marca de Abril – é hoje uma evidência. Ao longo desses 10 anos, deve fazer-se a avaliação contínua do novo modelo e os respetivos reajustamentos, sem, contudo, se alterarem as suas linhas mestras sempre que se muda de governo.
Sempre que seja publicada nova legislação, a tutela deve ser bem cuidadosa na seleção do contexto temporal. Veja-se um péssimo exemplo: terminado o período de adoções de novos manuais para os 7º e 10º anos, é publicada legislação sobre os documentos orientadores, onde são revogados os programas e as metas curriculares. Ora, quase todos os novos manuais- pelo menos os de História- incluem conteúdos descontextualizados da nova legislação. Assim, os conteúdos obrigatórios aparecem misturados com opcionais, o que não contribui para que os alunos desenvolvam as suas capacidades de organização e de saber estudar.
Outra questão colocada- e bem- pelo professor António Nóvoa tem a ver com a previsível redução das verbas para a educação, em benefício da saúde e da segurança. Refira-se que o alarmismo provocado por certas forças políticas sobre «o perigo» que representam os imigrantes e os refugiados propicia o desvio de verbas da educação para a segurança.
Embora reconhecendo que tem de haver mudança na escola, é oportuno dar voz ao poeta: «sim pr’a melhor está bem, está bem, pois pr’a pior já basta assim.»