Desde setembro de 2014 que a organização dos tribunais judiciais de comarca passou a assumir uma configuração diferente daquela que se verificava até então.
Resumindo, a noção de comarca passou a abranger um território mais alargado, em regra coincidente com o distrito administrativo, aumentou o grau de especialização dos tribunais e atribuiu-se uma maior importância à gestão por objetivos, procurando reduzir o número de processos pendentes e o tempo de duração desses processos e foram criados órgãos de gestão dos tribunais sem que estes possam na independência do processo de julgar, que constitui um princípio fundamental do nosso sistema judicial.
Após a reorganização judiciária, com exceção de alguns processos que fazem a capa dos jornais, pela sua dimensão e duração, a esmagadora maioria dos processos judiciais vem observando uma significativa redução nas pendências e uma diminuição dos seus tempos de duração.
Contudo, importa lembrar que esta nova organização judiciária também impõe um compromisso dos poderes legislativo e executivo no sentido de disponibilizar os meios e os critérios da sua afetação.
Sejamos justos.
Nos últimos anos, verificou-se um investimento substancial nos equipamentos informáticos e nos respetivos sistemas de suporte o que contribuiu para que a paragem forçada pela pandemia fosse menos sentida em Portugal do que noutros países da Europa.
Todavia, subsiste a falta de investimentos nas estruturas edificadas ou a edificar, de que é exemplo gritante, na nossa Comarca de Setúbal, o caso do Tribunal de Sesimbra e de outros edifícios a carecer de manutenção.
Subsiste ainda a falta de investimento no rejuvenescimento e reforço dos quadros de oficiais de justiça, com uma média de idades a aproximar-se perigosamente da rutura total.
Ao mesmo tempo, subsiste alguma dificuldade em ter a coragem de retirar dos tribunais aquilo que não é uma verdadeira função jurisdicional, mas sim um ato de chancela quando o Estado não confia nos seus próprios instrumentos de controlo ou ainda simplificar atos e procedimentos aproveitando as potencialidades já existentes.
Finalmente, subsiste a falta de investimento nos serviços de apoio quando um relatório demora meses a chegar, um pedido a uma autoridade estrangeira eterniza-se até chegar uma resposta ou um processo fica “parado” à espera de uma perícia especializada que não encontra alternativas viáveis.
Os recursos são, em regra, escassos e há que estabelecer prioridades, mas esta política do “chapeuzinho estendido” quando se trata de um poder soberano do Estado não pode continuar a ser a realidade com que os tribunais lidam todos os anos.
Esta expressão não é minha, mas da representante da Justiça nas Nações Unidas quando visitou Portugal há alguns anos e, pelos vistos, desde então, pouco ou nada mudou.
Ao reclamar estes investimentos ou estas alterações, não o fazemos por nós mas sim pelo Povo em nome de quem é administrada a Justiça.
É esta noção que ainda não foi devidamente assimilada pelos decisores políticos.