A necessidade de atribuir culpas continua a ser um dos grandes fastios da nossa sociedade.
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Parece queĀ ao encontrarmos um culpadoĀ fica sanado o problema; mas nĆ£o fica. O problema mantĆ©m-se e nĆ£o se resolve por si sĆ³ porque alguĆ©m foi responsabilizado. Ćs vezes atĆ© Ć© ao contrĆ”rio; a atribuiĆ§Ć£o de uma responsabilidade faz com que o responsĆ”vel, por sua vez, aponte o dedo a alguĆ©mā¦ E aĆ comeƧamos a correr o rosĆ”rio dos culpados. No final, a culpa morrerĆ” solteira, porque, no meio de tanta gente culpada, nĆ£o hĆ” como responsabilizar, e o problema continuarĆ” por resolver. Mas no meio disto tudo, ofuscados por este festival de culpas, ninguĆ©m mais se lembrarĆ” do problema; atĆ© que ele surja de novo.
Ocorreu-me que talvez seja aquelaĀ a principal razĆ£o porque se Ć© rĆ”pido a apontar o dedo; principalmente quando o problema Ć© grave. Todos preferem desviar a atenĆ§Ć£o do problema ā por razƵes diversas ā a resolvĆŖ-lo. E, enquanto todos nĆ³s formos coniventes com isto, nunca isto vai mudar. As culpas sĆ£o atribuĆdas ā sem consequĆŖncias, entenda-se ā e os problemas nunca sĆ£o resolvidos.
Estou certo de que alguns de vĆ³s se lembrarĆ£o de alguns casosā¦
Todavia, tambĆ©m na esfera pessoal ā especialmente no Ć¢mbito do trabalho ā isto acontece. A primeira coisa que se faz, quando se identifica um problema ou uma falha, Ć© perguntar:
Ā«Quem foi?Ā»
Mas o que interessa isso?!
O que interessa Ć© resolver a situaĆ§Ć£o.
Uma entidade patronal ā seja, ela, de que Ć”rea for ā paga-nos para resolver problemas, nĆ£o para achar culpados. Ouvi vĆ”rias vezes, dos meus chefes e atĆ© de entidades formadoras, que nĆ£o devemos levar problemas para as salas de reuniƵes; devemos levar soluƧƵes. Mas nunca ouvi – de absolutamente ninguĆ©m –Ā tragam-me os culpados.
Esta mentalidade de caƧa Ć s bruxas, em pleno sĆ©culo XXI, jĆ” deveria ter sido ultrapassada. Cada vez mais, os valores associados Ć noĆ§Ć£o de comunidade e partilha falam mais alto; e, neste contexto, nĆ£o hĆ” espaƧo para a culpa.
NĆ£o estou, contudo, a dizer que as pessoas nĆ£o devem ser responsabilizadas pelos seus actos. Devem sĆŖ-lo. Mas devem sĆŖ-lo como parte de um processo e nĆ£o como o fim desse processo.
Actualmente aponta-se o dedo, estigmatiza-se uma pessoa e pronto; estĆ” tudo feito. E essa pessoa apenas tem duas soluƧƵes: ou assume a culpe e vive sob o seu peso, ou resolve empontar a culpa para outros. Seja qual for a sua atitude, o problema nĆ£o se resolve e vai-se protelando a sua soluĆ§Ć£o. E, quando o problema ressurgir, outro culpado serĆ” apontadoā¦
O facilitismo da culpa Ć© que hĆ” sempre um culpado; pode sĆŖ-lo muito ou pouco, mas hĆ” sempre alguĆ©m responsĆ”vel para culpar. E por ser fĆ”cil apontar o dedo, parece ser sempre melhor fazĆŖ-lo do que encontrar ā ou tentar encontrar ā soluƧƵes.
Sempre que hĆ” um erro, hĆ” uma pessoa responsĆ”vel por esse erro ā Ć© verdade; mas deve ser nossa obrigaĆ§Ć£o ā como seres humanos ā ajudar essa pessoa a corrigir esse erro ā se possĆvel āĀ ou ajudĆ”-laĀ corrigir os comportamentos e atitudes que a levaram a errar. Desta forma, tanto o problema como a origem do problema se resolveā¦
De outra maneira, nunca nĆ£o passaremos do que temos sido: uma sociedade geradora de problemas e, por consequĆŖncia, de culpadosā¦