Se debruçarmos a nossa atenção à forma como decorre o julgamento penal, mormente em casos de impacto jornalístico, não temos dúvidas em aceitar que há uma dinâmica diferenciada.
Quanto maior impacto o caso tiver, maior é a tendência para se afirmar que o resultado processual não depende exclusivamente do desempenho de um dos jogadores, mas é o produto de interacção das estratégias e de tácticas utilizadas no limite temporal do processo. Esta conclusão firma-se na análise da Teoria dos Jogos, utilizada pelos jogadores do caso, que bem conhecem que ao jogo aplicado ao processo penal é necessário muito mais do que sorte processual. O bom jogador sabe que sem dominar as regras processuais, possuir a habilidade, a inteligência e o raciocínio, conhecer o ritmo e a harmonia da intervenção, em caso de estratégias mal calculadas, a falta de capacidade de improviso e de fair play dificultará o bom prognóstico. E tem de actuar nesta dinâmica de acção respeitando as regras do jogo temperado pela correcção profissional, num verdadeiro dom de alquimia em que os avanços se fazem também de chamados equilíbrios (de Nash, teoreticamente descritos).
Os juízes sabem que os sujeitos acusador/defensor são jogadores que orientam as suas estratégias aos resultados, a díade move-se tacticamente em busca de pay-offs e, em todas essas jogadas dinâmicas são escrutinados, estudados e levadas à medição em pormenor as decisões que proferiram num ou noutro sentido do direito ou a que factores atribuem maior preponderância na determinação de pena, porque esta análise faz parte do estudo das tácticas de cada jogador interno, a que o julgador está atento. Porém, por vezes, a oportunidade das jogadas envolve estrategicamente a divulgação do caso ou de alguns dos pormenores em discussão através da comunicação social, numa rea lidade em que os vieses que a falta de conhecimento apropriado se demonstra, de um lado, e o interesse e a parcialidade dos jogadores se demonstram, de outro. O contágio da informação jornalística traz com ele o prejuízo de valores como a objetividade e a mediação. Essa responsabilidade pela formação de “factos” transmitidos e partilhados com o público-alvo que, na maioria das vezes, nada tem a ver com os que, mesmo objecto de tensão, se discutem nos julgamentos, muito contribui para a inexplicabilidade das decisões e para a sua não aceitação quando “a verdade” se passa a jogar noutro campo em que não se observam as regras do jogo.
Juíza de Direito do Juízo Central Criminal