O país anda há mais de 50 anos para decidir sobre o aeroporto. É inacreditável, mas é verdade: será possível levar esta gente a sério?
Sabemos que o país tem o principal aeroporto no centro da capital, rodeado de urbanizações, hospitais, escolas e universidades, instalações militares, etc., etc. A partir daqui qualquer localização é boa, melhor, pelo menos. Depois, no essencial, Alcochete e Montijo são a mesma coisa. Somos um país que ignora e despreza o seu enorme património e capital natural. O estuário do Tejo, um santuário ambiental único, é um palco vazio, esquecido e abandonado; só se fala dele pelo aeroporto. Também sabemos todos que o aeroporto do principal destino turístico do país fica no Parque Natural de Ria Formosa; isto, enquanto, sob a bandeira do ambiente, os estrangeiros que vivem e gozam sumptuosamente as suas reformas no Algarve se insurgem contra qualquer iniciativa que procure criar riqueza. Como se o Algarve fosse um bom exemplo ambiental nalguma parte do mundo. Convém lembrar que quando tratamos de aviões e aeroportos a escala é global. Ou seja, Lisboa é arredores de Madrid; no caminho em que estamos – desejo que reversível –, cada vez mais o será. Nesta escala e contexto, Beja não é interior, não é arredor ou tão pouco subúrbio de Lisboa; Beja é Lisboa. Acontece que o aeroporto de Beja existe porque, em determinada altura, a Força Aérea escolheu esta localização pelas suas condições aeronáuticas excecionais e instalou ali uma base aérea que, em termos de área ocupada, é a maior da Europa e uma das maiores do mundo. Foi essencialmente por esta razão, qualidade aeronáutica excecional, que a Força Aérea alemã ali se instalou desde muito cedo. Pelo que sabemos do povo alemão devia-nos bastar para considerar a coisa muito a sério. Mas não, andamos há 50 anos a fazer estudos e a ouvir tudo e todos de modo a justificar a inércia para a tomada de decisão.
Entretanto, surgiu mais um dado de capital importância: o vírus que nos bateu à porta. Esta ocorrência põe em causa o modelo de desenvolvimento vigente, designadamente o turismo do nosso contentamento – não muito mais que vagas de turistas a quem fazemos a cama, aparamos a relva dos hotéis e passeamos de tuk-tuk. Enquanto todo o país chama e reclama por turistas, António Costa já veio avisar que este ano ninguém conte com este turismo para a retoma económica, ou seja, o mentiroso, patético e hipócrita “ficamos todos bem” não vai ser pelos aviões e paquetes carregados de turistas. E um Secretário de Estado de qualquer coisa já disse que se calhar, com esta nova realidade, talvez seja melhor repensar o aeroporto. Talvez, longe do interesse de cada parte, e pelo país, fosse boa ideia pensar seriamente em Beja. Fica ainda uma pergunta: será que esperámos 50 anos por um dos piores contextos para decidir sobre o aeroporto?