A perda dói!

A perda dói!

A perda dói!

9 Abril 2021, Sexta-feira
Cristina Rodrigues - Deputada não inscrita

É certo que todos reagimos de forma diferente à dor da perda, mas a morte de alguém, em particular a que acontece de forma inesperada ou violenta, impacta a vida de quem perde, mudando-a de forma permanente. Para quem fica, inicia-se uma dolorosa resposta natural de adaptação, tanto à perda em si como à nova realidade a que esta perda dá origem: o luto.

A perda de um bebé, ainda por nascer, não será diferente. A construção de laços afectivos, o investimento de si naquela relação, inicia-se com o reconhecimento da nova vida que se desenvolve no útero – muitas vezes mesmo antes quando ainda se planeia a sua concepção – e não apenas no momento do nascimento. Em causa estão sentimentos e projectos de vida que necessitam de tempo e espaço para se reorganizarem, num processo de luto que, embora seja natural, parece menos real e com menor aceitação por parte da sociedade em geral quando comparado com outras situações envolvendo a perda de alguém. Segundo revelam muitas mulheres, a falta de empatia para com quem vive a perda gestacional e a falta de aceitação social condicionaram profundamente a forma como sentiram e viveram este luto, como se o facto de se perder um filho, ainda que não nascido, fosse de menor importância. Por vezes, na tentativa de ajudar a superar, os mais próximos acabam também por minorar essa dor que tem todo o direito a existir e que se manifesta de formas tão distintas como tristeza, solidão, culpa, raiva, ansiedade, apatia, choque, insónia, entre muitas outras possíveis, na medida em que cada um de nós vivencia as emoções à sua maneira.

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Importa reconhecer a legitimidade destes sentimentos e dar-lhes enquadramento legal específico para lá do que existe neste momento: a mãe trabalhadora pode pedir uma licença, com uma duração entre os 14 e os 30 dias, sem qualquer perda de rendimento. Mas esta licença parece não ter necessariamente relação com o luto em si, tanto que, conforme o disposto no artigo 38.º do Código do Trabalho, é prerrogativa da mulher na sequência de uma interrupção da gravidez, voluntária ou não, e terá de ser solicitada ao médico. Por outro lado, em caso de perda gestacional também o pai sofre a perda mas não tem qualquer direito a falta justificada. E de igual forma, futuros pais por gravidez de substituição também não têm o benefício de falta justificada ao abrigo do direito ao luto. Ora isto, parece-me, é profundamente injusto.

Foi nessa crença que apresentei muito recentemente uma iniciativa que visa precisamente o direito ao luto em caso de perda gestacional, traduzido em três dias com falta justificada e sem perda de remuneração.

É certo que o processo de luto é longo e vai muito para além dos períodos contemplados na

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lei. Contudo, é fundamental garantir que dentro do possível, existem as adequadas condições de saúde mental para enfrentar a pressão e o desgaste associados ao trabalho. E tendo os progenitores o direito a vivenciar o sofrimento, de forma mais liberta e reconhecida, ganham ainda a oportunidade de se apoiarem mutuamente numa situação de dor que poucos entenderão sem a terem vivido, mas que nem por isso merece menos o nosso respeito.

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