29 Março 2024, Sexta-feira
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Banalização, eleitoralismo e partidarite deslustram medalhas do Município de Setúbal

Com medalhas atribuídas assim, a dignidade dos munícipes e do município, em vez de exaltada, é (quase) humilhada

 

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A última reunião pública da Câmara Municipal de Setúbal, em que foram aprovadas as medalhas municipais a entregar este ano, expôs à evidência o estado a que chegou o sistema local de funcionamento deste importante instrumento de reconhecimento municipal.

Os nomes aprovados receberam pouco mais de metade dos votos da vereação (6 votos a favor em 11) e a polémica instalou-se, com CDU e PSD a acusarem o PS de não permitir o consenso sobre a matéria – por ter apresentado a sua proposta de nomes sem articulação prévia com os demais partidos – e o presidente da Câmara, André Martins, a considerar o “comportamento” do PS “indigno e inadequado”.

Esta forma de atribuir medalhas cria vários problemas. A discussão dos nomes e respectivos méritos na praça pública inibe a livre e sincera apreciação dos eleitos, o conhecimento das propostas por partido partidariza o processo de decisão e rotula os nomes propostos, e a falta de consenso enfraquece o tributo e expõe a estrutura de votação – neste caso de 6 votos a favor e 5 contra percebe-se logo o voto de cada força e de cada eleito – anulando o sigilo que se impõe na votação de nomes de pessoas.

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O grave é que estes problemas têm consequências muito nefastas para pessoas e instituições cuja honorabilidade a instituição de medalhas pretende enaltecer. Os agraciados desta forma recebem um “reconhecimento com amargo de boca” e quem agracia faz uma “distinção com reserva”. Com medalhas atribuídas assim, a dignidade dos munícipes e do município, em vez de exaltada, é (quase) humilhada.

Os vícios deste processo municipal, em Setúbal, ficaram mais visíveis agora que deixou de haver uma maioria absoluta – a partidarite veio ao de cima e o eleitoralismo agravou-se ainda mais – mas já existiam nos mandatos de Dores Meira.

No entanto, a antiga presidente da Câmara permitiu a banalização completa dos títulos municipais, com uma atribuição massiva quer de medalhas quer do estatuto de Embaixador de Setúbal. Só nas três últimas edições foram atribuídas três centenas de títulos.

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Em 2017, foram “nomeados” 92 embaixadores (e, desses, apenas 73 estiveram presentes), e, em 2019 (último ano desta cerimónia) foram mais 106. Em 2020, último ano de entrega de medalhas municipais por Dores Meira, foram atribuídas 103.

Esta quantidade de distinções, tendo em conta que é cíclica, anual, torna a sua atribuição demasiado alargada, banalizando o gesto e desvalorizando os seus efeitos. Isto para não falar na insuficiente e até inadequada tipologia de medalhas municipais instituídas pelo regulamento de Setúbal em que a Medalha da Cidade se sobrepõe à Medalha de Honra da Cidade e em que não existe a Medalha – aquela verdadeiramente única, pela raridade da sua atribuição – que, noutros municípios, é designada de Chave da Cidade.

Perante este quadro, impõe-se uma revisão do procedimento de atribuição destas distinções municipais, com vista ao seu aperfeiçoamento técnico e moral. Como está a fazer Alcácer do Sal, por exemplo.

É necessário um novo regulamento, que introduza recato na proposta e debate e eleve a decisão para a maioria qualificada ou unanimidade (importante para todas as pessoas a distinguir e até determinante para pessoas em certas condições, como, por exemplo, um jornalista, em que uma medalha aprovada por um único partido pode deixar duvidas sobre a sua isenção e independência). No Montijo, para dar outro exemplo da região, a decisão é por unanimidade e a atribuição é muito menos alargada (provavelmente demasiado rara).

E é desejável, também, a criação de uma comissão que, pela respeitabilidade da sua composição, submeta à aprovação pelos eleitos, nomes servidos numa bandeja de idoneidade em que não cabe o que é partidário, eleitoral ou banal.

 

Nota: Texto rectificado no dia 27.07.2022, às 15h39, com corte deste trecho, que estava no final do 5.º parágrafo: “(Para que também conste e honra seja feita, diga-se que, mesmo com maiorias absolutas, nesses mandatos houve procura de consensos, com reuniões prévias e maior recato na discussão)”. Este trecho foi retirado porque se confirmou, entretanto, que nos mandatos de Maria das Dores Meira não houve reuniões prévias nem consensualização com a oposição. O autor, que não esteve presente na reunião de câmara em que as medalhas foram votadas, reconhece que se enganou, porque fez fé nas afirmações proferidas pelo vereador Carlos Rabaçal (CDU), reportadas pela noticia do jornal sobre o tema, que não incluiu o desmentido feito pela oposição, nomeadamente pelo PS. Pelo erro, pedimos desculpa aos leitores. F.A.R.

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