26 Abril 2024, Sexta-feira
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500 palavras : Memórias dos Bairros dos Pescadores e do Grito do Povo

Os Bairros dos Pescadores e do Grito do Povo, na Anunciada, alojando cerca de seis centenas de famílias, alimentam a história da pesca e das conservas em Setúbal. Desde há meia dúzia de anos, uma acção preocupada com a cidadania e a qualidade de vida nestes bairros tem sido levada a cabo sob orientação da Câmara sadina e, desde 2017, têm estado em marcha as Oficinas Colaborativas, método de partilha, de apropriação e de aprofundamento da identidade, em trabalho coordenado pela Divisão de Direitos Sociais da autarquia. O resultado dessa construção identitária foi agora publicado sob o título “Caminhos com História – Memórias dos Bairros dos Pescadores e do Grito do Povo”, obra coordenada pela socióloga Joana Iglésias Amorim e pela antropóloga Vanessa Iglésias Amorim, setubalenses do Bairro dos Pescadores, em edição da Câmara Municipal de Setúbal.

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Em centena e meia de páginas desfiam-se vidas de intervenientes nascidos entre 1933 (Cremilde Dias) e 1999 (Rogério Conceição), num verdadeiro cruzamento inter-geracional, com número de citações quase igualmente repartido entre homens e mulheres, destacando-se na quantidade das intervenções figuras como Conceição Sobral (n. 1949), Nuno Simões “Espuma” (n. 1945) e Rogério Silva “Velhinho” (n. 1955).

Conhece-se o confronto com a dureza, a falta e a dificuldade: a habitação em barracas e depois em casas de tijolo até à construção dos bairros, as lutas pelas melhores condições de trabalho entre a resistência política e a repressão, a guerra colonial e as deserções, o 25 de Abril e as reivindicações, os alojamentos do projecto SAAL (Serviço Ambulatório de Apoio Local), a vida associativa… rumo a melhores condições de vida, com criação de laços de afecto ao lugar, como desabafa “Espuma”: “Desde que vim para aqui, gostei sempre disto. E vês a malta lá de baixo… está toda a morar aqui em cima. O bairro foi melhorando. Então não ‘tá aquilo que era antigamente. Nem pensar nisso.”

Narra-se também a ocupação das horas: o trabalho a dias, a pesca, a fábrica e o seu apitar, com horários longos e idades nem sempre recomendáveis – “Eles metiam a gente, mas quando sabiam que havia a fiscalização éramos escondidas dentro de um armazém. Não era só eu, era mais pessoas nessa altura a trabalhar assim. A gente só podia trabalhar aos 14 anos, ainda andei um ano escondida.”, relembra Conceição Sobral. E assiste-se à fuga para a alternativa que era a emigração – “O meu filho foi uma vez ou duas comigo à pesca, nunca mais quis ir. Nunca mais lá pôs os pés. ‘Eh, não vou mais ao mar’. Olhe, lá foi para França, está para a França, têm melhor vida. ‘Tão melhores.”, conta “Espuma”.

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Evoca-se também a infância e a passagem pela escola (com histórias boas e menos boas), rapazes e raparigas separados e exames na quarta classe. Assiste-se às brincadeiras, muitas vezes improvisadas, e aos passeios para roubar fruta nas quintas, às idas a festas e à praia, aos bailes. E saboreia-se o gosto que o peixe tem, aprendendo a escolha criteriosa e a ementa da caldeirada ou dos pastéis de ovas de sardinha.

Quatro capítulos, fortemente ilustrados pelas fotografias de Américo Ribeiro (maioritariamente), constituem o corpo deste livro, verdadeira reportagem de formas de viver, de estar e de se conhecer, em que os moradores têm voz e contam a(s) sua(s) história(s), em sintaxe genuína, cimentadas pela explicação equilibrada de conjunturas e por referências históricas e sociais, ficando o leitor com a sensação de que circulou por todos aqueles encontros, esteve presente nas conversas e conheceu todos os intervenientes.

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