2019/2020, um ano lectivo pouco ou muito produtivo?

2019/2020, um ano lectivo pouco ou muito produtivo?

2019/2020, um ano lectivo pouco ou muito produtivo?

2 Julho 2020, Quinta-feira
Francisco Cantanhede

Perante o alastrar da pandemia, o Governo decidiu encerrar as escolas em meados de março. Os responsáveis pelo Ministério da Educação optaram- e bem- por uma solução que garantisse que os estudantes continuariam ocupados a nível intelectual, logo a desenvolver aprendizagens. A educação à distância entrou, então, como um raio pelas portas de milhões de portugueses, e um conceito, por vezes, debatido, mas pouco implementado em Portugal, passou a fazer parte do nosso dia a dia.

Ao ler uma entrevista de um reputado pedagogo fiquei surpreendido com uma das suas afirmações: «o terceiro período foi tempo perdido.» Numa perspetiva conteudista da educação, poderá ter alguma razão, embora, obviamente, ninguém de bom senso acreditasse que, através das aulas à distância, fosse possível «dar todos os conteúdos» como se de aulas presenciais se tratasse; já no que respeita ao desenvolvimento de aprendizagens significativas, muito úteis no futuro, estou certo que o «terceiro período» correspondeu a um tempo muito, mesmo muito, produtivo, quer para professores, alunos e pais, quer para todos os que estiveram atentos à educação a partir da segunda quinzena de março.

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Muitos alunos desenvolveram a capacidade de autonomia alcançando um desempenho talvez superior ao conquistado em toda a sua vida de estudantes, sentiram saudades da escola- aprenderam a valorizar mais os professores, as aprendizagens e os amigos-, aproximaram-se dos seus familiares- apenderam a valorizar mais a família. Muitos pais reconheceram que precisam de encontrar tempo para estarem com os filhos e passaram a valorizar muito mais o trabalho dos professores, pois estar com crianças um dia inteiro não é tarefa fácil. Os professores arregaçaram as mangas e foram à luta. A sua capacidade de resiliência brotou como água de nascente. Abriram as portas da imaginação. Muitos descobriram o mundo online, outros avançaram nas descobertas já realizadas; a partilha de experiências, de materiais, de frustrações, de alegrias e fracassos, proliferou. Alguns, ao procurarem transferir para a sala de aula o modelo de aula expositivo, aperceberam-se que o mesmo não era funcional, procurando depois respostas que resultassem no ensino/aprendizagem à distância. A comunidade educativa concluiu que o mundo online é um recurso educativo, mas não é o recurso educativo, já que contribuiria muito mais para desenvolver o ter do que para aprender a ser, e que a escola não é só sala de aula, é também brincar, discutir, reivindicar, cair, levantar-se, ou seja a socialização, que é fundamental para a formação global dos estudantes, não se promove apenas através da realização do trabalho elementar dentro da sala de aula. Outra aprendizagem evidente é a possibilidade de algumas reuniões de professores poderem realizar-se à distância, não obrigando os docentes a permanecerem horas na escola. Também não passou despercebido que, no futuro, a ausência prolongada de estudantes ou de professores poderá ser amenizada através de recursos online para promover a real autonomia dos estudantes que, através da orientação dos professores, se tornarão cada vez mais capazes de realizar as tarefas propostas.

A sociedade em geral descobriu que ainda há imensas famílias sem um único computador, estudantes sem telemóvel que lhes permita beneficiar do ensino/aprendizagem à distância, e que para educar uma criança pode ser necessária toda a aldeia, pois, por exemplo, as forças de segurança, as autarquias locais e outras organizações deram o seu contributo para que esses estudantes tivessem acesso a materiais escolares enviados pelos seus professores. As aulas à distância também contribuíram para que a função dos professores passasse a ser muito mais valorizada pela sociedade em geral, reconhecendo-se o esforço de reinvenção da escola num contexto desconhecido, logo, jamais testado; os mais atentos talvez se tenham apercebido de que aqueles que, aparentemente nunca têm dúvidas, pouco ou nada fizeram para que o terceiro período não fosse tempo perdido- e esta foi mais uma aprendizagem significativa!

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