22 Julho 2024, Segunda-feira

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Fernando Negrão: “Não se antevêem maiorias absolutas nestas eleições”

Fernando Negrão: “Não se antevêem maiorias absolutas nestas eleições”

Fernando Negrão: “Não se antevêem maiorias absolutas nestas eleições”

Fotografia: Mário Romão

Cabeça-de-lista do PSD à Câmara de Setúbal avisa para a necessidade de uma solução pós-eleitoral e diz-se disponível para todos os cenários

 

Nasceu em Angola há 65 anos, vive em Setúbal há 60, casou com uma setubalense e tem dois filhos. Licenciado em Direito, foi juiz 18 anos, ministro por duas vezes e director nacional da PJ. É deputado há várias legislaturas e, actualmente, vice-presidente da Assembleia da República.

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Porque decidiu ser candidato?

Esta decisão já tem muito tempo. Fui candidato há cerca de 15 anos, não ganhei, mas tive um resultado muito interessante e agradeço de novo, como agradeci na altura, aos setubalenses por esse resultado. Fiquei como vereador, durante um ano, se for preciso eu depois explico por que não continuei.

A CDU acusa-o de ter abandonado Setúbal.

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Não. Fui vereador na oposição durante um ano e quem ganhou as eleições foi Carlos Sousa [CDU]. Ao fim de um ano de ser presidente, aconteceu qualquer coisa de estranho e Carlos Sousa é pura e simplesmente empurrado para fora da Câmara Municipal de Setúbal. Ninguém percebeu porquê. Eu tive um sentimento de revolta enorme, ao ver o que estavam a fazer àquele homem. Deviam ter feito eleições intercalares, para legitimar quem veio a seguir.

Fernando Negrão: "Não se antevêem maiorias absolutas nestas eleições"

Na altura não defendeu eleições intercalares. Aliás, foi às intercalares de Lisboa.

Já lá vamos. E, entretanto, isso coincide com um convite para ir às eleições intercalares em Lisboa. E o meu sentimento de revolta relativamente àquilo que fizeram a Carlos Sousa, juntamente com a oportunidade de poder ser candidato à Câmara de Lisboa, não por ser Lisboa, mas por ter outra função, ter pensado ‘não é nestas circunstâncias que eu quero estar na Câmara de Setúbal’, levaram-me a aceitar o convite para candidato à Câmara de Lisboa.

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Mas era líder da oposição. Isso não foi abandonar a confiança que lhe tinha sido dada?

Não, não foi abandonar. Pior do que isso foi o presidente da Câmara eleito ter sido chutado para fora. Qual é a legitimidade de se fazer uma coisa destas e qual é a legitimidade de quem a seguir assume as funções de presidente de Câmara? Este é o problema que se me pôs. Eu já estava num processo de saída enquanto vereador e, com este acontecimento consumado, decidi definitivamente deixar a Câmara de Setúbal. Depois surgiu o convite, coincidiu no tempo, para ser candidato à Câmara de Lisboa.

Estava a explicar porque decidiu voltar a candidatar-se a Setúbal.

Nessa altura [em 2007] pensei, “vou ser de novo candidato à Câmara de Setúbal”. Mas, entretanto, a presidente da Câmara foi a eleições, ganhou, adaptou-se às funções, e percebi que era o tempo da CDU, que cumpriu três mandatos. E agora, em termos democráticos, a mudança é fundamental. Se em democracia não há mudança, é porque não há democracia. Este é o momento em que terminou o tempo da CDU e virão novos tempos.

Acha que desta vez vai mesmo ganhar?

Nunca parto desse princípio. Do ponto de vista democrático, nós temos de ter a humildade de lutarmos para vencer, mas acharmos que podemos não vencer. Estou confiante, vou fazer por isso, mas quem decide, é soberano, são os eleitores.

Pode adiantar alguma coisa sobre as suas listas?

Isso é sempre o grande problema de qualquer candidato, principalmente às câmaras municipais. Não queria adiantar, porque estamos num processo de feitura das listas. Já temos as das juntas de freguesia e Assembleia Municipal muito avançadas, no que diz respeito à Câmara Municipal, estamos a escolher as pessoas mais adequadas para cada uma das áreas. As pessoas estão zangadas com a política, pelo que é difícil atraí-las, mas nós estamos a fazer esse esforço e vamos insistir para termos as mais capazes.

Para a Assembleia Municipal, também ainda não pode adiantar o nome?

Para a Assembleia Municipal, posso-lhe dizer que quem vai encabeçar a lista será o agora deputado Nuno Carvalho.

Temos conhecimento de que a relação com a concelhia tem causado desconforto a algumas pessoas. Queixam-se da sua forma de tratar estas coisas. O que diz sobre isso?

De uma vez por todas, temos de começar a assumir uma atitude profissional no exercício da política, porque esse profissionalismo é importante para o exercício das funções. Tenho uma atitude profissional, sem deixar de ser uma atitude também afectiva, de proximidade com as pessoas. Agora, em primeiro lugar, preciso de ter uma organização que funcione, e ter pessoas adequadas ao funcionamento dessa organização. Disso, eu não prescindo e acho que ninguém deve prescindir para que as coisas corram bem.

Com essa postura e com a forma como foi escolhido o seu nome, um pouco à margem das estruturas locais, não receia perder a organização de que fala?

Não receio, por uma razão. Porque as primeiras pessoas a contactarem-me para me recandidatar foram precisamente as pessoas das estruturas locais. Eu sei que tenho essas pessoas do meu lado e é com elas que conto, elas contam comigo, e nós temos o partido local organizado para avançar comigo enquanto candidato.

Quais são as linhas principais do seu projecto para dar a Setúbal a modernidade de que fala?

Todos nos recordamos do que aconteceu durante estes anos, do anúncio de projectos megalómanos. Em 2006, a ideia de Setúbal com uma grande centralidade, com cultura, hotéis, restaurantes, escritórios, mais habitação… Não se concretizou. Em 2011, a grande proposta foi a Cidade da Música, igualmente com as respectivas infra-estruturas. Não se concretizou. Em 2016, o projecto, que tinha como autor um cidadão de nacionalidade Chinesa, que iria cercar o Clube Naval, com arranha-céus. Uma coisa mesmo megalómana. Não se concretizou. Em 2020, o anúncio do grande projecto para a Cidade do Conhecimento, em que se anunciava praticamente uma nova cidade no Vale da Rosa. Mas nós não sabemos nada, não há informação nenhuma aos cidadãos.

Houve progressos no turismo, nos equipamentos culturais e na restauração. Acha mesmo que nada se concretizou?

Era inevitável isso acontecer, porque Setúbal é uma cidade que atrai qualquer pessoa, atrai os turistas, pela qualidade gastronómica, pela beleza da sua paisagem, pela sua serra, pelas praias. Diria mesmo que até por inércia isso aconteceria, mas a Câmara obviamente que fez trabalho no sentido de melhorar a restauração em Setúbal, na área da cultura, que saiu um pouco do Fórum Luísa Todi e criou as estruturas de polos de cultura. Foram 12 anos, alguma coisa tinha que acontecer e aconteceram também coisas boas. Eu não percebo qual é a razão do anúncio de grandes projectos, para depois não os concretizar.

Ainda não disse que ideias tem para nessas áreas haver mais modernidade.

Antes dos turistas, temos que pensar na população local e organizar a cidade para os que aqui vivem e trabalham. Setúbal é segunda cidade do sul da Europa onde o esforço económico para o arrendamento é maior, a seguir a Milão, e acima de qualquer outra em Portugal. Isto diz tudo da inexistência de uma política de habitação em Setúbal. Não há uma política nem para as pessoas mais desfavorecidas, nem para a classe média, não há…

Qual é a mudança que preconiza para a habitação?

Por exemplo, no centro da cidade, temos de controlar os custos do solo e a especulação, ter uma política de controlo de preços, no sentido de atrair jovens.

Como pode fazer isso sem colocar em causa o direito de propriedade?

Através de uma acção da Câmara no sentido de adquirir edifícios e reconstruí-los, para depois pôr à disposição dos jovens em arrendamento ou mesmo venda.

Sobre o novo PDM, que avaliação faz?

O PDM volta a tocar no IMI, mas numa porção muito pequena, e nós temos uma pandemia de saúde gravíssima, que contamos que esteja a terminar, mas a seguir à pandemia da saúde vem a pandemia social. É preciso tomar medidas para apoiar as pessoas, e essas medidas passam também pelo IMI. É preciso ter mais coragem e ser mais ousado na diminuição dessa taxa que muitas pessoas pagam com muito sacrifício. Mais, o PDM traz-nos uma novidade que é um investimento de quase 70 milhões de euros para o saneamento básico. Em 2021 ainda são necessários 70 milhões de euros para o saneamento básico em Setúbal? Durante estes 12 anos, não se resolveu o problema do saneamento básico. Sabemos que não, as nossas freguesias rurais não têm saneamento básico, tudo vai para as linhas de água ou para o nosso rio.

O contrato de concessão da água termina dentro de meses. Deve ser repensada?

Tudo tem que ser repensado, porque a água de Setúbal não pode continuar a ser a mais cara do País, e as dificuldades de a água chegar ao seu destino não podem continuar. Tudo tem que ser posto em cima da mesa e voltarmos a ter novos serviços municipalizados. Porque não? Desde que tenhamos uma estrutura bem organizada, suficientemente flexível, para poder dar resposta a estes problemas. As prioridades são a qualidade e o custo da água para os utentes.

Concorda que é necessário disciplinar o estacionamento e tarifá-lo nalgumas zonas da cidade?

Concordo que deve ser disciplinado, porque os carros têm sempre uma tendência para tornar tudo mais complicado. Não tenho nada contra os carros, também tenho carro e uso, embora prefira andar a pé na cidade. Temos 1 500 lugares pagos na cidade e a Câmara aprovou um alargamento para 9 000 lugares pagos. Isto quer dizer que uma parte substancial da cidade vai ficar com o parqueamento pago. Os problemas desta solução são que vamos ter um estreitamento de vias. Já vemos isso na Avenida dos Combatentes, em que houve um estreitamento de vias, por via do aumento dos lugares de estacionamento pagos. Tudo isto prejudica o peão e as ciclovias. Solução é avaliar o estacionamento vertical.

Está a dizer que deve reformular-se o plano de estacionamento?

Claro que tem de ser reformulado. Tem que ser estudado, olhar-se para o planeamento da cidade e ver qual a melhor solução, que, na minha opinião, tem de passar essencialmente pelos parques de estacionamento verticais.

Há outros aspectos do seu projecto que queira destacar?

Temos que organizar a cidade, de maneira que cada uma das zonas, dos bairros, tenham, no seu interior, tudo aquilo de essencial que é importante para os residentes. Um pequeno supermercado, farmácia, tudo a cerca de 15 minutos, como em Paris. A cidade tem que se organizar para dar esta resposta, até porque está a envelhecer e a perder população. Na última década, perdeu 5 500 pessoas. Braga, São João da Madeira, Cascais, são cidades que atraem gente, e a população, em vez de estar a diminuir, está a aumentar. É preciso criar uma cidade em que a qualidade de vida seja o ponto central da gestão. A Câmara tem que intervir para controlar os preços da habitação no sentido de criar condições para atrair pessoas para viverem, especialmente os jovens.

As dragagens foram necessárias e bem feitas?

As dragagens estão feitas. Vimos, pela primeira vez em Setúbal, manifestações espontâneas de pessoas e ninguém levou isto em consideração, a Câmara calou-se, e o Porto de Setúbal manteve a sua posição sem dar mais explicações do que as poucas que tinha dado.

Acha que o processo não foi bem conduzido?

Não foi bem conduzido, nem pelo Porto, nem pela Câmara Municipal. A Câmara Municipal não se pode calar quando vê os seus cidadãos tomarem uma posição.

Dores Meira considera que esteve do lado certo.

Não esteve do lado certo, não esteve do lado da população. Não quer dizer que a população tenha sempre razão, mas não foi explicado o porquê das dragagens nem os benefícios que ela poderia trazer, e isso foi uma omissão grave por parte da Câmara Municipal.

Sobre o futuro do Vitória, qual deve ser o papel do município?

O Vitória é simbolicamente, uma instituição importantíssima na cidade, tendo em conta a sua história. Se o Vitória nos disser “já não estamos em condições para subsistir, precisamos da intervenção da Câmara”, nessa altura, a Câmara tem mesmo de tomar uma decisão com pés e cabeça. Tem de constituir um grupo com profissionais que percebam de planeamento e de futebol, e que nos digam “a solução para o Vitória é esta”. Depois, será avaliado.

Se surgir uma solução imobiliária, que implique aprovação municipal, tem alguma objecção?

Se o Vitória estiver disponível e desde que essa resposta do imobiliário seja consentânea com os interesses de Setúbal e com aquilo que é a política para a habitação a definir, estou de acordo.

Está satisfeito com o acesso da região aos fundos comunitários?

Temos um problema grave nisso. Não podemos comparar o rendimento per capita de Lisboa, por exemplo, que é muito mais do dobro do rendimento em Setúbal. Contudo, o não acesso aos fundos europeus é igual em Lisboa e em Setúbal. Isto não faz sentido nenhum. No Parlamento, estamos a trabalhar – ainda ontem [quarta-feira] tivemos uma reunião, com associações empresariais e sindicais, e a Associação de Municípios de Setúbal, no sentido de lhes apresentarmos aquela que é a nossa proposta para solucionar esse problema, que teve o acordo de todos eles. Essa proposta vai no sentido de se criar uma NUT específica na Península de Setúbal, que alargue o acesso a fundos europeus.

A ministra da Coesão diz que pode iniciar-se esse processo, se a região quiser, mas já não se vai a tempo do Portugal 2030.

Porque, entretanto, a senhora ministra ia recebendo as associações e dizendo que “sim senhor”, depois veio o primeiro-ministro e disse “não senhor”. O que eu diria aos membros do Governo é: “organizem-se, mas não prejudiquem as populações”. Foi o que eles fizeram, prejudicar as populações. O PCP já avançou com um projecto de resolução na Assembleia da República, nós vamos avançar igualmente com carácter de urgência e, portanto, há um conjunto de forças sociais, políticas, sindicais, empresariais, unidas nesse sentido, e esperemos que o Governo tenha isso em consideração.

A antiga NUT da Península de Setúbal foi extinta pelo governo do PSD, em 2013.

Na altura era preciso organizar o território e foi organizado nestes termos. Não concordei com tudo, nem foi da melhor forma. Por exemplo, a Área Metropolitana de Lisboa tem uma organização diferente da Área Metropolitana do Porto. No Porto, há excepções, que na AML não há. Isso foi um erro. Neste momento estamos a lutar para que as coisas mudem e se faça justiça.

Dores Meira diz que Fernando Negrão não conhece a cidade.

Quero fazer uma campanha eleitoral civilizada, porque não se antevêem maiorias absolutas nestas eleições. E, não se antevendo maiorias absolutas, precisamos pós-eleitoralmente de dar uma resposta às populações, criando um executivo camarário que possa gerir a cidade, de forma competente. Se vamos entrar neste discurso de passa culpas, vamos estragar aquilo que é mais importante, que é dar melhores condições às pessoas e às empresas que trabalham no nosso concelho.

Essa senhora pode inventar aquilo que entender, eu também posso dizer que ela não conhece Setúbal para além das horas de expediente, porque no resto do tempo vai para Almada, onde vive. Vamos agora entrar neste bate-bocas desagradável e sem sentido? Se ela quer entrar, que o faça em Almada, mas deixe Setúbal descansada.

Na perspectiva de apenas ser possível maioria relativa em Setúbal, quais são as suas linhas vermelhas? Admite a ajuda de todos ou dar ajuda a qualquer um?

Naturalmente, por isso lhe disse que a cidade precisa de ser governada. E para ser governada, não havendo maiorias absolutas, todos temos de estar disponíveis para trabalhar uns com os outros.

Como vê André Martins como adversário nestas eleições?

Foi uma surpresa para mim, porque vinha na expectativa de ter como oponente, da parte da CDU, um militante do PCP, e depois vejo um d‘Os Verdes’, um partido que nunca foi a um despique eleitoral. Ou vai pela mão do PCP, ou não vai. Este candidato, de alguma forma, desvaloriza a democracia e as próprias eleições em Setúbal.

Apoio à produção: B&B Hotel Sado Setúbal

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