Fernando Malão: “A cultura pode fazer de nós melhores pessoas, mais tolerantes, mais sociáveis, mais benevolentes”

Fernando Malão: “A cultura pode fazer de nós melhores pessoas, mais tolerantes, mais sociáveis, mais benevolentes”

Fernando Malão: “A cultura pode fazer de nós melhores pessoas, mais tolerantes, mais sociáveis, mais benevolentes”

Com concertos esgotados, repertório arrojado e um coro renovado, o Coral Luísa Todi tem reconquistado Setúbal sob direcção do maestro

Fernando Malão tem 30 anos de experiência em música coral. Em 2016, foi convidado a assumir a direcção do Coral Luísa Todi e, com mais de uma centena de concertos e participações com maestros internacionais, tem conseguido consolidar o colectivo.

- PUB -

Em entrevista a O SETUBALENSE, esclarece que foi convidado a integrar o grupo numa altura em que este estava a passar por sérias dificuldades. Hoje, com quase 70 elementos, o coral representa Setúbal dentro e fora do País.

Fundado a 25 de Outubro de 1961 é hoje uma referência nacional na prática do canto coral amador com um repertório adaptável, com diferentes géneros que vão desde obras clássicas até à ‘Broadway’ e rock-pop. No entanto, Fernando Malão entende que faltam apoios por parte da autarquia para que o grupo tenha mais envolvimento nos projectos da cidade.

O que é que distingue o Coral Luísa Todi de outros grupos corais?

- PUB -

Não direi o que distingue, ou a diferença entre este coro e outros grupos, mas o Coral Luísa Todi é uma referência nacional, porque capitalizou milhares de horas de ensaios, milhares de pessoas por aqui passaram – que fizeram da música profissão, na produção, no canto e até na representação. O historial deste coro, nesta cidade e no País, permite essa distinção.

Logo no início, passou por várias casas de ensaio e teve problemas políticos, porque nasceu ainda no antigo regime. Teve muitos êxitos, muitas batalhas também, e está de pé. Estamos na casa do Coral Luísa Todi – um prédio é uma coisa única. Não sei quantos coros existem em Portugal com este privilégio.

Existe um património físico muito grande, feito ao longo de muitos anos por muita gente que aqui passou. Sobretudo por um homem muito importante nesta casa, o presidente do coral, que soube sempre inovar, procurar novas valências, novas opiniões, e a partir daí permitiu que o coro nunca parasse. Continua a promover encontros de coros, para permitir trazer à cidade coros de outros lugares, não só de Portugal, mas também do estrangeiro.

- PUB -

Que objectivos traçou ao entrar no coral e que balanço faz até hoje?

Vim quando o coro mergulhou numa das suas maiores crises, uma crise existencial, uma crise directiva, e uma crise económico-financeira. O actual presidente desafiou-me a vir montar este projecto. Disse-me que tinha um coro falido para me oferecer, mas tinha esperança de que fizéssemos uma grande equipa. Vim tentar pôr de pé um coro que começou com 12 pessoas e, neste momento, vamos a caminho das 70.

Já fiz mais de uma centena de concertos. Muitos projectos temáticos com a participação de maestros estrangeiros. Temos trabalhado com praticamente todas as instituições da cidade. Temos feito muito a pensar nesta cidade. São anos de muito trabalho, de muitas dificuldades financeiras, como já referi, mas sempre com uma matriz, trabalho, perspicácia, criatividade e respeito pelo próximo.

Como escolhe as peças para o repertório dos concertos?

Tenho 30 anos de experiência na música coral, e uma das coisas que sempre me deu muito prazer é realizar um estudo de quantos ensaios são necessários para fazer um determinado programa. Tenho uma característica que muitos músicos não apreciam, modifico as partituras todas e é raro não as transformar. Isto tem a ver com processo criativo, com a adaptação das partituras à realidade que o coral tem naquele momento. É uma combinação do meu conhecimento técnico como maestro, mas também da pedagogia musical, que me permite fazer esta ligação e isso tem-me ajudado até na minha postura em palco e a perceber o que é que o público quer. Faço concertos para o público, sempre fiz.

Os concertos temáticos são escolhidos especialmente para chegarmos ao público e tentar que esse seja muito vasto – os coros, por norma, têm um público com uma idade avançada. Nos nossos concertos, conseguimos, muitas vezes, ter um público jovem quando tenho programas mais apetecíveis, não só para os familiares.

A escolha do repertório é muito complexa, mas é sempre com a finalidade do público a que quero chegar. Essa é uma das coisas que, também para os meus cantores começa a ser aliciante, porque nunca nada é igual ao concerto anterior e é isso que os agarra

Que papel tem o coral na cultura e na formação de novos públicos?

O coral tem um papel muito grande na cultura e na inclusão. Tenho no coral gente de 10 países diferentes e são, neste momento, cerca de 30%. Nós temos um leque muito variado. Pessoas, algumas delas muito jovens, que estão a trabalhar em Setúbal, através da tecnologia, outros no nosso mercado de trabalho.

A cultura pode fazer de nós melhores pessoas, mais tolerantes, mais sociáveis, mais benevolentes. Um coro pode sensibilizar. Penso que a cultura, a saúde e a educação são os motores principais de qualquer civilização moderna. Portanto, esse é o contributo maior, através da música, a música é apenas um motivo para nos levar a outras situações.

Como funciona a entrada e a formação de novos coralistas?

A entrada nos coros amadores, por norma, faz-se com uma pequena audição para avaliar a capacidade auditiva e a capacidade de execução musical dessa pessoa. Naturalmente, sendo um coro amador, há pessoas que entram aqui sem qualquer experiência. Depois são orientadas por algumas pessoas que ajudam na integração, na preparação de repertório fora do coro.

Alguns entram também paralelamente nas aulas de canto e começam a desenvolver essa aptidão. Depois é-lhes distribuída uma partitura, aquela partitura convencional que toda a gente conhece – muitos não a sabem ler, mas olham para a partitura como um gráfico. Ajudamos a fazer essa leitura.

Quais foram os concertos sob a sua direcção mais impactantes?

Os concertos que fazemos no Fórum Luísa Todi são muito importantes – têm muita gente a assistir. Gosto muito de fazer estreias na cidade, mas também internacionalizações. Os concertos fora do País têm uma dimensão muito grande, porque representamos não só uma cidade, mas também um País.

Os concertos do fórum demoram muitos meses a preparar, às vezes mais de um ano. Cada um tem uma fase de investigação, uma fase de escolha de repertório, uma fase de planificação, e depois a construção até à data.

Que projectos têm a decorrer de momento?

Temos a estreia de um projecto, em Julho, que vai ser um concerto de Gospel. Até lá, temos alguns concertos que vamos fazer aqui na cidade, outros fora, e mais não temos, porque os apoios são escassos.

Esta última autarquia teve um papel muito importante, na parte da variação da cultura, nós não tivemos nenhum envolvimento em projectos da cidade, portanto, nunca houve uma proximidade, tem sido sempre uma relação um pouco difícil, e que dificulta o desenvolvimento de alguns destes projectos. Não faço política, não assino política de ninguém, mas precisamos que os políticos estejam atentos a este tipo de instituições.

Gostava que em Setúbal existisse uma avaliação do associativismo, das necessidades de cada um dos grupos, que ajudem aqueles grupos que mais dificuldades têm e que podem ser extintos, que ajudem também os outros que têm um trabalho feito e continuam a trabalhar sem rede e que têm dificuldade em dar um salto maior.

Partilhe esta notícia
- PUB -

Notícias Relacionadas

- PUB -
- PUB -

Apoie O SETUBALENSE e o Jornalismo rumo a um futuro mais sustentado

Assine o jornal ou compre conteúdos avulsos. Oferecemos os seus primeiros 3 euros para gastar!

Quer receber aviso de novas notícias? Sim Não