André Martins: “O PS, enquanto esteve no Governo durante oito anos, deixou isto ao abandono”

André Martins: “O PS, enquanto esteve no Governo durante oito anos, deixou isto ao abandono”

André Martins: “O PS, enquanto esteve no Governo durante oito anos, deixou isto ao abandono”

Os nove municípios da península de Setúbal contestam a escalada dos preços do serviço de recolha e tratamento dos resíduos, que é fornecido pela AMARSUL. O presidente da AMRS, que preside também à Câmara de Setúbal, disseca a posição da CDU e responsabiliza o PS pela situação

Os cinco municípios do PS tomaram uma posição conjunta contra os aumentos do serviço de recolha e tratamento dos resíduos urbanos, centrando críticas na entidade reguladora, a ERSAR. Os quatro municípios da CDU também vieram a terreiro, em uníssono, contestar a situação, mas com uma nuance que há muito defendem: a de que a gestão da AMARSUL, que foi privatizada, regresse à esfera pública.
Em entrevista a O SETUBALENSE e à Rádio Popular FM, André Martins, que preside à Associação de Municípios da Região de Setúbal (AMRS) e, em simultâneo, à Câmara de Setúbal, explica a posição dos municípios da CDU e critica os municípios socialistas por só agora terem erguido a voz.

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O facto de a CDU pedir a reversão da AMARSUL para a esfera pública impediu uma tomada de posição conjunta, em uníssono, com os municípios do PS sobre os custos da recolha e tratamento de resíduos ou foram as diferenças políticas que se sobrepuseram a um interesse que é comum a todos?
Enquanto presidente da Associação de Municípios da Região de Setúbal, lamento esta divisão. Os municípios da CDU, na península, têm desde 2015, pelo menos, tomado posições muito fortes sobre a gestão dos resíduos sólidos urbanos. O que é de lamentar, logo à partida, é que os municípios do PS, aqui na península, só agora, quando há uma mudança de Governo, é que venham tomar posição contra esta situação que se arrastou desde 2015 até agora e que se tem vindo a agravar.
Há uma empresa de maioria de capital privado, a AMARSUL, que tem como objectivo o lucro. Nós, somos contra, achamos que a gestão deve ser de capitais públicos. Isso, cabe ao Governo resolver.
Ao longo destes anos, temos exigido que o Governo tome uma posição no sentido de a AMARSUL voltar à gestão pública. Em 2013, 2014, a AMARSUL, quando ainda tinha capitais públicos, tinha cerca de 6 milhões de euros que eram o resultado da actividade e que serviriam para fazer investimento.

Mas é possível reverter essa gestão para a esfera pública na actual conjuntura?
É uma questão de vontade política. Olhe o caso da SIMARSUL, num Governo anterior ao do PS houve uma deriva de a retirar como uma empresa a funcionar na península de Setúbal e houve uma decisão de alargar a gestão de uma outra entidade para todo o território de Vale do Tejo. Foi um resultado desastroso e quando o PS foi para o Governo novamente houve, com a influência dos partidos que constituem a CDU, um compromisso da SIMARSUL, que é o sistema de saneamento básico, se voltar a situar na península de Setúbal. Houve a decisão e ela foi concretizada. Portanto, é tudo uma questão de opção política. E nós consideramos que a melhor solução para ajudar a gerir melhor estes problemas, que têm a ver com a saúde pública, o ambiente e também com a penalização nos bolsos dos cidadãos do nosso território, é voltar à esfera pública. E os números são bem elucidativos do que estamos a dizer.

Já lá vamos a esses números, resultantes de um estudo da AMRS, que solicitou agora audiências à ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, e também ao Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, para lhes dar conta dos custos e da qualidade do serviço praticados pela AMARSUL. O que traz de novo esse estudo para cima da mesa?
Para simplificar, direi que em 2018 os municípios pagavam um pouco mais de 8€ da Taxa de Gestão dos Resíduos [TGR], que foi implementada e é cobrada directamente pelo Estado, para investimentos futuros. A taxa de deposição de resíduos na AMARSUL directa era 20,08€, em 2018. Em 2024, a TGR era de 30€ e a taxa de deposição de resíduos dos municípios foi de 77,04€ por tonelada, quando em 2018 era de 20,08€. Isto é qualquer coisa de insustentável, de injustificável. No próximo ano, tudo isto vai aumentar outra vez. Estamos ainda a ver onde é que isto vai parar, mas certamente que estes valores vão aumentar.

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E os municípios não fazem reflectir a totalidade desses aumentos nas facturas dos munícipes…
… Não podemos aumentar desta forma as tarifas do custo do serviço às populações. De ano para ano aumentamos sempre alguma coisa, mas são valores muito pequenos comparativamente com estes que, de facto, são incompreensíveis e injustificáveis.

O que causa constrangimentos financeiros aos municípios.
Naturalmente, o Orçamento Municipal tem de pagar a diferença. No caso de Setúbal, estamos a falar de um diferencial de 8 milhões de euros em 2024, que saem do Orçamento Municipal para pagar à AMARSUL pela deposição dos resíduos e também para pagar a TGR. Os municípios são penalizados indirectamente por este diferencial de milhões de euros que não são investidos em benefício dos munícipes. No fundo, somos todos nós que pagamos as consequências desta política desastrosa dos resíduos sólidos urbanos.

Ou seja, é uma verba que deixa de poder ser usada para investimento público em obras necessárias para aumentar a qualidade de vida das populações.
É isso que está em causa. Mas, neste momento, ainda mais preocupante é: qual a alternativa? Para haver alternativa tem de haver projectos, programas, uma ideia de como é que vai ser o futuro. Ora, o que nós hoje temos em cima da mesa é que os dois aterros [Palmela e Seixal] estão esgotados e o que é que a AMARSUL já pediu? Pediu aos municípios para poder ampliar um pouco mais os aterros, para que os resíduos sejam depositados. Seixal e Palmela estão a ver quais são os terrenos ainda disponíveis para poder aumentar alguma coisa, mas isto são mais dois ou três anos. E a seguir?

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A co-incineração seria solução?
Que nos apresentem soluções. É preciso que quem tem esta responsabilidade tenha planeamento, olhe para o futuro. E o que nós verificamos é que não existe. Nem há investimento nem existe planeamento com uma visão de futuro para este problema, que é um problema, como eu digo, um problema ambiental e um problema de saúde pública. E de contas públicas.
E nós consideramos que há aqui uma questão que é central também. É que a AMARSUL faz também a recolha dos resíduos separados, que são separados pelos munícipes. Os munícipes, nas suas casas, é que têm a grande parte do trabalho. Estamos a falar dos resíduos de embalagens que são separadas pelos munícipes. Qual é o retorno que os munícipes têm pelo serviço púbico que prestam? É preciso que haja incentivos para que as pessoas façam esse trabalho. Hoje não há incentivos. Agora, a questão é esta: como é que entra neste processo quem produz as embalagens e que ganha por as pôr no mercado?

Está a falar dos valores das contrapartidas financeiras. Antes disso, como analisa a qualidade do serviço que é prestado pela AMARSUL, tendo em conta estes aumentos sucessivos?
As contas da empresa não têm resultados positivos, mesmo assim. O que quer dizer que isto é uma política desastrosa do ponto de vista financeiro, do ponto de vista ambiental, do ponto de vista da saúde pública.

Na prática, no serviço de recolha, a qualidade do serviço tem gerado fortes críticas em todos os municípios.
Sim, a AMARSUL envia os seus carros, fazem a recolha dos contentores e em volta dos contentores ficam montes de lixo acumulado. No caso de Setúbal, tem de ser o município ou as freguesias a fazerem essa limpeza. Os munícipes, indirectamente, são os mais penalizados.
Quem produz as embalagens tem também de ter a obrigação de encontrar sempre melhores soluções para as produzir [mais ecológicas e recicláveis]. Essa parte não está incluída neste processo e é fundamental que seja incluída.

Isso tem a ver com a aplicação dos denominados valores de contrapartidas financeiras, que vão ser aplicados a partir do próximo ano. Isto não deveria implicar uma redução de custos para os municípios? Até porque os munícipes vão ter de pagar esta taxa sobre as embalagens.
Volto ao princípio para dizer o seguinte: Setúbal tinha uma concessão há 25 anos da água e do saneamento. O município de Setúbal decidiu no início deste mandato que a gestão da água e do saneamento voltasse a ser pública. Criámos os Serviços Municipalizados de Setúbal, que fazem hoje a gestão da água e do saneamento em baixa, porque a SIMARSUL faz o tratamento em alta. Conseguimos reduzir, em média, continuando a prestar serviço às populações no abastecimento da água e no saneamento, 20% na tarifa da água. Isto significa que nós passámos de uma empresa privada para um sistema público. Conseguimos reduzir 20%. Se a AMARSUL passar a ser uma empresa de capitais públicos, naturalmente que vamos ter uma redução dos custos. Suponhamos que uma empresa de capitais públicos a gerir os resíduos reduz 20% os custos de operação, esses 20% são para reduzir na tarifa. Há logo aqui à partida uma questão que é a nossa proposta, que a gestão, no caso da AMARSUL, passe a ser pública. Uma empresa privada tem de ter lucros, porque senão não faz sentido. Um investidor, quando vai fazer o seu investimento, está a pensar em ter retorno. Se não tiver, a empresa não funciona.

Se for para a esfera pública, resolve o problema na sua globalidade?
Resolve uma parte significativa do problema. A outra parte é que quem produz embalagens e as vende no mercado comparticipe. É necessário chamar a este sistema os privados que ganham dinheiro com as embalagens, para que uma parte desse lucro entre no sistema. Depois, é necessário nós termos uma visão do que é que é uma estratégia de recolha e tratamento dos resíduos sólidos urbanos. Nós sabemos, por exemplo, que em outros países não se faz recolha todos os dias e os sistemas funcionam bem.

Se já é como é fazendo recolha praticamente todos os dias, como é que seria se não fosse feito…
… É necessário nós encontrarmos soluções tecnológicas, que resolvam o problema dos resíduos. Nós já não temos terrenos para continuarmos a ter aterros. Lisboa, por exemplo, tem um sistema em que tem uma incineradora. E, como podemos verificar, os preços das tarifas são mais reduzidos, comparados com a situação na península de Setúbal.
Entregaram a gestão dos resíduos sólidos urbanos a uma empresa privada e esqueceram-se que isso tinha problemas. Por isso é que chegámos a este ponto. Não podemos deixar de considerar que o PS, enquanto esteve no Governo durante oito anos, deixou isto ao abandono.

Acha que será possível retirar resultados práticos de uma futura reunião com a ministra do Ambiente?
O diálogo é muito importante. Quando os governantes se fecham e não querem ter diálogo com as autarquias, com quem está no terreno, com quem avalia o problema concreto das pessoas, naturalmente que as coisas depois não funcionam e vão-se arrastando.

Na Câmara de Setúbal, a oposição chumbou e teceu duras críticas ao Orçamento Municipal para 2025, considerando-o “megalómano e fantasioso”. O que é que vamos ter daqui para a frente?
O orçamento é de mais de 338 milhões de euros. Significa que tem mais 99 milhões de euros do que o de 2024. Agora, é preciso dizer que nós estamos perante o maior investimento garantido desde o 25 de Abril na Câmara Municipal de Setúbal. Ora bom, se nós temos o maior investimento de todos os anos desde o 25 de Abril na Câmara Municipal de Setúbal, naturalmente que esse investimento tem de passar pelo orçamento. O investimento não pode ficar fora do orçamento. E os partidos de oposição sabem do que é que nós estamos a falar.
Neste mandato nós temos o maior investimento nas áreas de educação, saúde, cultura, espaços verdes, ambiente, mobilidade e transportes, movimento associativo e habitação. Percebo que para um partido que é candidato a ganhar a Câmara de Setúbal seja difícil de vir a aprovar este orçamento. Mas essa forma de fazer política é altamente penalizadora para o desenvolvimento de Setúbal, para o bem-estar, a qualidade de vida das populações de Setúbal e de Azeitão. Os partidos da oposição têm os dados todos. Sabem as candidaturas que foram aprovadas. Nós temos candidaturas aprovadas só na área do PRR de mais de 150 milhões de euros. Queremos e vamos fazer esses investimentos.

Mas isso está em risco com a não aprovação do Orçamento Municipal?
Não havendo a aprovação do orçamento, para lançarmos as obras vamos ter de fazer alterações orçamentais. Algumas dessas alterações vão fazer com que se arraste um pouco mais estes procedimentos. As populações podem não ter bem a ideia destes processos morosos, até burocráticos, mas os partidos da oposição não podem dizer que não conhecem estas situações. E, portanto, temos de responsabilizar inteiramente os partidos da oposição pelos atrasos que possam vir a haver no cumprimento do nosso orçamento e nós vamos investir os 180 milhões de euros que estão comprometidos para este mandato, que têm projectos e que estão nestes processos de visto do Tribunal de Contas e outros que estão em concurso, e alguns que já estão em obra.
Acho que os partidos da oposição vão arrepender-se desta decisão de votar contra o orçamento, porque nós vamos continuar a apresentar as propostas para cada um dos projectos, para cada uma das obras, elas vão ter de ir a reunião de câmara.

Está disponível para se recandidatar à presidência da autarquia?
Tenho estado sempre disponível para servir as populações. Quando chegar à altura, se for convidado, avaliarei. Neste momento não vou avaliar nada porque nem sequer tenho essa informação da possibilidade de vir a ser candidato. Agora, o que eu posso dizer é que a minha responsabilidade neste momento é coordenar uma equipa por continuar a incentivar os nossos técnicos, os nossos trabalhadores, para continuarem a dar o melhor que podem para servir as nossas populações. Esse é o meu grande compromisso, o meu grande objectivo.

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