Por entre um ataque feroz à esquerda, o candidato revela as medidas que considera prioritárias para a região, relegando para segundo plano investimentos de maior monta, como o aeroporto – Beja deveria ser a primeira opção a ser equacionada, considera –, a terceira travessia sobre o Tejo e o novo terminal de contentores
O número um por Setúbal da Iniciativa Liberal – partido recém-criado que se estreou em eleições nas últimas Europeias – é cáustico em relação ao actual Governo de António Costa, sem deixar de lado PCP e Bloco de Esquerda (BE), ao mesmo tempo que não poupa críticas às sucessivas gestões autárquicas socialistas e comunistas no distrito.
“As pessoas que levaram o país à bancarrota estão de novo na lista do PS, João Galamba, Eduardo Cabrita e Ana Catarina Mendes”, acusa, adiantando que PSD e CDS-PP não têm sido oposição.
Baixar impostos (IRS, IRC e IMI, por exemplo) e apostar forte em áreas como a saúde, os transportes, a educação e a justiça são os objectivos traçados. Redefinir a integração do distrito de Setúbal enquanto NUT na Área Metropolitana de Lisboa, construir o Hospital do Seixal, reverter a subconcessão da Soflusa, disponibilizar ADSE para todos e privatizar a Caixa Geral de Depósitos e a RTP são bandeiras eleitorais. Projectos como aeroporto, terceira travessia sobre o Tejo ou terminal de contentores na região “não são prioritários”. Até porque, defende, com o actual “crescimento económico anémico” esses projectos serão feitos “em cima de dívida”.
O que leva um médico em início de carreira a aceitar ser cabeça-de-lista às legislativas? Por que aceitou este desafio?
Vejo poucas pessoas da minha idade interessadas em política e vejo Setúbal, ao fim de 40 anos de comunismo e socialismo – todas as câmaras municipais são PS ou PCP –, ser o quarto distrito mais pobre do país e o terceiro em número de beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI). Acho que é triste, ao fim de quatro décadas, vermos o nosso distrito pobre, com pessoas a viverem do RSI, e, sobretudo, sem concretizar o potencial que tem. Sou ambicioso e acho que o distrito e o país devem ser também mais ambiciosos.
Toda a gente diz que estamos a crescer muito em termos do Produto Interno Bruto (PIB). Crescemos menos do que a Espanha, a Irlanda, a República Checa, a Eslováquia, países do nosso campeonato. Só podemos dar às pessoas melhor educação, melhor saúde, melhores serviços públicos com crescimento do PIB.
Quer dar um exemplo?
Este Governo de esquerda – temos até vários outdoors do BE a dizer ‘vamos salvar o Serviço Nacional de Saúde – investe hoje menos, em PIB per capita, na saúde do que aquilo que investia o Governo anterior [de Passos Coelho] no período da troika. Investe menos do que aquilo que é a média da União Europeia. Os serviços públicos nunca estiveram tão mal como estão hoje: o Hospital do Litoral Alentejano funciona sem o número mínimo de pediatras na urgência pediátrica; a urgência pediátrica do Hospital Garcia de Orta ameaçou fechar alguns dias da semana… e pouco ou nada se ouviu em termos de contestação, nem de PSD nem de CDS. Vejo que não temos oposição. Todos querem ser a muleta de António Costa e ninguém quer ser alternativa ao Governo do PS. Estamos fartos de qualquer Governo com coligação com o PS.
E a IL admitiria integrar uma geringonça com outros partidos como, por exemplo, PSD e CDS?
É possível uma plataforma de entendimento à direita com esses partidos, mas nunca à esquerda com o PS. Assumo já que sou de direita e liberal. Há o mito de que a esquerda defende os pobres e que a direita defende os ricos. Neste Governo, de esquerda, apoiado pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda (BE), os impostos indirectos aumentaram, atingindo a classe média e as classes mais baixas. É falso que seja a esquerda quem defende os pobres. Quem os defende somos nós, que defendemos menos impostos, sobretudo indirectos, e que os mesmos possam reflectir-se no rendimento das pessoas.
Tendo em conta que a IL se estreou em eleições nas últimas Europeias, registando pouco mais de 29 mil votos, ou seja 0,88%, em termos globais, dos quais 1.683 foram alcançados no distrito de Setúbal, até que patamar percentual pode o partido crescer nestas Legislativas?
Os eleitores é que terão de decidir. Queremos, obviamente, ter mais votos do que nas Europeias. Os nossos dois grandes objectivos são conseguirmos eleger um deputado por Lisboa e outro pelo Porto. Dos partidos que se apresentaram pela primeira vez a eleições, o PAN foi o único que fez melhor do que nós. Esperamos crescer. As pessoas dizem-me que tive azar por me candidatar pelo círculo de Setúbal, que é muito difícil. Mas entendo o contrário. Não é difícil, porque ao fim de 40 anos as pessoas podem ver ao que nos levou este caminho de esquerda no distrito. É muito fácil fazer campanha aqui. As pessoas estão descontentes com os serviços públicos que lhes são dados, nomeadamente na saúde, nos transportes, na segurança social… Temos uma grande oportunidade para crescer aqui.
Quais as medidas que elege como prioritárias para o distrito?
Desde logo baixar impostos (IRS, IRC, IMI, por exemplo). Apostar claro nas áreas de saúde, transportes, educação, justiça. Redefinir a integração do distrito de Setúbal enquanto NUT na Área Metropolitana de Lisboa, de forma a podermos receber mais fundos estruturais da União Europeia e reverter a subconcessão da Soflusa, abrindo o transporte fluvial a operadores privados, o que fará diminuir o preço e melhorar a procura.
Em termos mais gerais, defendemos ADSE para todos. Estas são as nossas bandeiras. Mas também privatizar a Caixa Geral de Depósitos, que não pode ser um banco onde o regime mete os “boys” para andar a fazer negócios. Precisamos de um banco de fomento que apoie as empresas e as pessoas, mas que deixe de ser esta porta giratória entre governantes para se andar a fazer negócios e a estoirar milhões. Este Governo, com PCP e BE (que foram tão críticos), gastou mais com bancos do que o anterior. E privatizar também a RTP.
Como é possível disponibilizar ADSE para todos?
Não é nada que não exista noutros países. Defendemos o alargamento da ADSE a todos os portugueses, criar um seguro de saúde público, facultativo e naturalmente pagando, ao qual as pessoas possam aderir, para que tenham liberdade de escolha onde querem ser tratadas. Como médico defendo mais investimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas uma coisa não impede a outra. Podemos abrir o sistema a todos e abrir o SNS. Outra bandeira nossa é aumentar o número de médicos de família. Para isso, pretendemos reabilitar as Unidades de Saúde Familiares modelo C, que permitia a cooperativas de médicos abrirem clínicas contratualizando directamente com o Estado. Foi uma medida boa lançada pelo Governo PSD/CDS e esta maioria acabou com ela.
Mas qual seria a ginástica orçamental para conseguir abranger todos com ADSE?
Os funcionários públicos pagam uma percentagem do salário, 3 ou 4%, para a ADSE, portanto quem quiser usufruir terá de pagar, aderindo ao seguro. Não é nada de extraordinário. O que é extraordinário é não defender isto e não investir no SNS.
Facto é que, no distrito, os concursos públicos para admissão de médicos ficam, nalguns casos, desertos e, noutros, com vagas por preencher. A falta de médicos é ou não o problema real?
É um boa questão. Só há dois caminhos: ou se dá incentivos às pessoas ou obrigam-nas. Esta maioria de esquerda quer obrigar as pessoas a ficar no SNS. Nós defendemos o outro caminho. Temos de dar incentivos fiscais e monetários. Repare-se no Alentejo, por exemplo, uma área desertificada, é óbvio que estas zonas têm de ser diferenciadas, do ponto de vista fiscal, para atrair as pessoas. Este Governo gastou mais dinheiro em bancos do que o anterior e investe menos no SNS.
Qual é o seu posicionamento sobre a construção do novo aeroporto no Montijo?
É preciso um novo aeroporto? Temos um em Beja. Há muitos aeroportos bem fora das cidades. Construiu-se aquele elefante branco em Beja para quê? Temos de tirar proveito desta infra-estrutura. Se tirarmos proveito do aeroporto de Beja e ainda assim for preciso mais uma infra-estrutura aeroportuária, devemos questionar quanto é que o Estado vai gastar nesse investimento? Se todos os custos forem suportados por privados, faça-se o aeroporto. Mas, precisamos de investimento em muitas outras áreas. O Hospital do Seixal, que este Governo prometeu e não construiu, é muito mais prioritário, tal como esquadras e escolas neste mesmo concelho, por exemplo.
E quanto à terceira travessia sobre o Tejo?
Mais uma vez… quanto é que o Estado irá gastar nisso? Acho que há investimentos mais prioritários. Essa conversa lembra-me Sócrates, um cheirinho a Sócrates e todos sabemos como isso acabou. Podemos realizar todos os investimentos se tivermos um verdadeiro crescimento económico que os suporte. Com este crescimento económico anémico, estaremos a fazer esses projectos em cima de dívida, que será paga por quem vier depois de nós. Não quero deixar dívida para os meus filhos e para os meus netos. Quero deixar o meu país a crescer. As pessoas que levaram o país à bancarrota estão de novo na lista do PS, João Galamba, Eduardo Cabrita e Ana Catarina Mendes. A tralha socrática está toda aqui outra vez e pronta para mandar de novo isto para o buraco.
Deduzo que aplique a mesma linha de raciocínio para a construção do terminal de contentores. Defende, por exemplo, que esse projecto deveria ir para o Barreiro ou para Setúbal?
Primeiro é preciso fazer contas. Saber quanto custa. A própria parceira de coligação deste Governo, Catarina Martins do BE, disse publicamente que se calhar o défice nem é bem aquele que está espelhado nas contas, que deve ser maior. Quando a própria parceira de coligação não acredita no défice, como é que podemos andar a pensar em investimentos desta natureza? Repito, quando crescermos a 4 ou 5% e não a 1% é que devemos debruçar-nos sobre esses projectos. Temos de investir é na sáude e na educação das pessoas. Em 40 anos deram-nos três bancarrotas e se continuarmos por este caminho vamos andar de bancarrota em bancarrota.
É a favor ou contra as dragagens no Sado?
Tem de se arranjar uma plataforma de entendimento entre o Porto de Setúbal e os pescadores, além de se ter em conta uma premissa muito importante que é o ecossistema do local. Se os técnicos disserem que têm de ser feitas as dragagens para melhorar a acessibilidade ao porto, nós não estaremos contra. Mas não se pode ir colocar as areias na zona da Restinga. Não estamos contra as dragagens, desde que sejam respeitados os interesses dos pescadores e o meio-ambiente.
O que não lhe foi perguntado e a que gostaria de responder?
Gosto muito de falar das assimetrias sociais. Não conheço outro distrito no país onde exista tanta assimetria social. Antes do 25 de Abril, este era o distrito onde se vendiam mais carros, agora somos o distrito com uma percentagem do PIB de 55% da União Europeia e a percentagem de Lisboa é 117% da nossa. Precisamos de investimento e só pela via fiscal é que o conseguimos atrair. Em 40 anos de socialismo e comunismo no distrito tivemos a Quinta da Princesa, o bairro do 2.º Torrão e o bairro da Jamaica. É disto que queremos continuar a ter?
Imaginando que nestas próximas Legislativas candidatavam-se apenas três partidos, em qual deles votava: PS, PCP ou BE?
Emigrava. Se só pudesse escolher entre esses três, seria uma ditadura. Felizmente existiu o 25 de Abril e o 25 de Novembro. Agradeço a Jaime Neves, e também a Ramalho Eanes, nunca ter de passar por isso.
Fertagus retira lugares sentados e recebe 500 mil por mês
Para responder ao aumento do número de passageiros, face a implementação do passe social único, a Fertagus “retirou cerca de 160 lugares sentados” nas carreiras. A revelação é feita por Diogo Prates, que cita a informação transmitida pela administradora delegada da empresa, Cristina Dourado, numa reunião realizada no passado dia 27 e na qual participaram ainda os elementos da lista da IL candidata por Setúbal, Diogo Ferreira e Mauro Santos.
Além do “prejuízo claro para a qualidade do serviço”, o cabeça-de-lista da IL pelo distrito sublinha ainda que a implementação do novo passe implica um pagamento mensal de 500 mil euros por parte da Área Metropolitana de Lisboa (AML) à Fertagus. “Naturalmente as receitas da AML vêm dos seus munícipes, não sendo portanto de admirar que Setúbal, Seixal e Almada tenham dos Impostos Municipais sobre Imóveis (IMI) mais altos do país, mais alto mesmo do que Lisboa, apesar de o PIB per capita em Lisboa ser 117% do de Setúbal”, lamenta o candidato.
De forma a baixar o preço e melhorar a qualidade do serviço, a IL defende que a Fertagus “tenha concorrência, nomeadamente do transporte fluvial, o que se conseguiria com a subconcessão da Soflusa e a abertura a entidades privadas nesse transporte. Os habitantes do distrito de Setúbal merecem melhores transportes e menos impostos e isso só se consegue com concorrência e mercado livre, uma matriz do liberalismo económico”, considera, a concluir.
Fotos – ARSÉNIO FRANCO