6 Maio 2024, Segunda-feira
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João Pimenta Lopes: “A União Europeia não tem contribuído para valorizar a nossa região”

O eurodeputado do PCP ataca as políticas europeias que diz servirem apenas os grandes grupos económicos. Pequenos e médios empresários, produções agrícolas e sector da pesca continuam ao ‘deus-dará’

 

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“Dar voz às reivindicações dos trabalhadores e da população e intervir”, com propostas que permitam responder aos problemas e dificuldades sentidas na sociedade, tem sido o propósito das jornadas de trabalho que os dois eurodeputados do PCP têm vindo a realizar pelo País e que na última semana tiveram o distrito de Setúbal como destino.

Durante cinco dias, entre segunda e sexta-feira passadas, João Pimenta Lopes e Sandra Pereira desdobraram-se em contactos com trabalhadores, reformados e população, realizaram tribunas públicas, encontraram-se com promotores do movimento associativo e da cultura. Sentiram “in loco” o pulso à região. No último dia de uma agenda semanal sobrecarregada, João Pimenta Lopes, em entrevista a O SETUBALENSE e à rádio Popular FM, fez um balanço ao périplo comunista e realçou aquilo que mais o marcou, no conjunto das acções dinamizadas pelo distrito: a situação com que se deparou numa troca de turnos na Autoeuropa. “(…) uma expressão daquilo que é a intensificação de uma visão mais violenta, digamos mais cruel, da exploração dos trabalhadores”, resume, sobre os ritmos de trabalho impostos na fábrica de Palmela.

Além da indústria, do comércio, do sector produtivo, da pesca, a saúde e a mobilidade são áreas a merecerem destaque especial do parlamentar europeu. Tal como uma questão transversal a todos: o aumento do custo de vida e as suas consequências, sem deixar de fora o problema da habitação decorrente “das políticas da União Europeia”. Políticas que, sublinha o eurodeputado, têm vindo a servir “os grandes económicos” em detrimento do apoio “àqueles que mais precisam – micro, pequenos e médios empresários, pequenas produções agrícolas ou o sector da pesca”. Políticas que, critica ainda, “não valorizam o potencial do País e das regiões”.

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Como é a vida de um eurodeputado dentro e fora do Parlamento no dia a dia?

É uma grande intensidade, dependendo também da forma como levamos por diante esta tarefa e a quem servimos. Da nossa parte, do PCP, temos protagonizado sempre uma intervenção que tem, por um lado, o compromisso de ter sempre uma grande proximidade com a realidade do País, dos problemas concretos com que as pessoas, os trabalhadores, se confrontam no dia-a-dia e traduzir essa proximidade também na intervenção no Parlamento Europeu.

Tem estado a percorrer o País, juntamente com a eurodeputada Sandra Pereira, numas jornadas de trabalho que tiveram agora uma semana dedicada ao distrito de Setúbal, com acções de contacto com os diversos sectores de actividade. O que tem a dizer aos pescadores, tendo em conta as políticas em discussão e aprovadas na União Europeia?

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O sector das pescas tem vindo a ser cada vez mais condicionado pelas políticas da União Europeia que coincidem em fenómenos de facilitação da concentração da pesca em grandes operadores, reduzindo o que são os apoios direccionados à pequena pesca. É importante lembrar que, no nosso país, 90% do sector da pesca é de pequena escala, costeira, artesanal… Temos avançado com muitas propostas no Parlamento Europeu, nomeadamente em relação aos fundos para a pesca, para garantir verbas para a renovação, para garantir intervenção sobre a cadeia de comercialização, assegurando ou preços mínimos em determinadas espécies ou taxas máximas de lucro na cadeia de valor para valorizar precisamente o rendimento da pequena pesca. Também para garantir formação para os pescadores. Para o investimento na remodelação das embarcações e integração de motorizações mais favoráveis, do ponto de vista ambiental, e para um fundo de garantia salarial para os pescadores. Aliás, temos vindo a falar na questão da criação de um salário mínimo para os pescadores, de forma a que não haja uma incerteza tão grande como existe.

Nos vários contactos realizados durante estas jornadas, qual o momento que mais o marcou?

Há vários mas talvez assinalasse um contacto depois de uma acção directa à saída de uma troca de turnos na Autoeuropa, num contacto à tarde com trabalhadores, onde a questão da intensificação dos ritmos de trabalho é muito significativa ao longo dos últimos anos, nomeadamente aquando da introdução do horário nocturno. A permanente pressão sobre os trabalhadores para produzirem mais, inclusivamente num quadro de redução do número de trabalhadores… O crescente número de trabalhadores que, em função dessa pressão, dessa intensificação brutal dos ritmos de trabalho, se encontra hoje – cerca de 700 estão sinalizados – com doenças profissionais. Há inclusivamente algumas situações quase de desespero face à situação com que estão confrontados. Terá sido porventura um dos momentos que mais me marcou. Estamos a falar de uma expressão daquilo que é a intensificação de uma visão mais violenta, digamos, mais cruel da exploração dos trabalhadores.

O que retira deste périplo?

Nos contactos em diversas unidades industriais, cada vez mais é frequente a indicação de que o salário mínimo nacional é referência. Ora, num contexto como o actual, é uma questão que tem marcado profundamente estas jornadas, o brutal aumento do custo de vida, da perda muito significativa de poder de compra por parte dos trabalhadores: o supermercado aumenta, a energia aumenta e agora, mais recentemente, fruto mais uma vez de políticas da União Europeia, o aumento das taxas de juro determinadas pelo Banco Central Europeu. Já vamos em oito aumentos das taxas de juro e ainda não terminou, dizem eles, com centenas de milhares de famílias a ficarem com o garrote ao pescoço. Falamos de 100, 200, 300, às vezes 400 euros a mais no crédito à habitação, situações verdadeiramente incomportáveis para muitas famílias. As pessoas hoje têm de fazer escolhas no supermercado, levando menos do que aquilo que levavam antes, muitas vezes até levando menos do que aquilo que necessitam. Os reformados, com um quadro das pensões miseráveis que temos no nosso país, vêem-se confrontados entre optarem na farmácia pelo avio da receita toda ou se esperam até ao próximo mês para aviar o resto.

A saúde também marcou a vossa agenda nestas jornadas…

A Península de Setúbal não escapa a uma realidade que tem expressão em todo o País e que resulta de um desinvestimento crónico nas unidades de saúde, sejam hospitalares ou de proximidade. São dezenas de milhares de utentes que não têm médico de família, isto de concelho para concelho. Aquilo que temos vindo a assistir é ao encerramento de especialidades nos hospitais, ao encerramento das urgências pediátricas ou de maternidades, portanto, todo um caminho de redução na capacidade do Serviço Nacional de Saúde [SNS] de responder, como constitucionalmente consagrado, àquilo que são as necessidades das populações.

E a solução é injetar dinheiro?

É evidente. A questão é o dinheiro que devia ter sido injectado e que não está a ser colocado no SNS. O dinheiro existe, está é mal canalizado. Num investimento para o SNS em 2022, a execução orçamental desse investimento ficou-se pelos 45%, o que quer dizer que mais de metade do que estava definido no Orçamento do Estado para o SNS – que poderia ter contribuído para a resolução de problemas concretos com que as populações hoje se confrontam – não foi executado. Já para não falar daquilo que é um caminho que tem vindo a ser acentuado também com o Partido Socialista, de benefício da privatização da saúde. Aliás, em Setúbal, tem sido protagonizado um conjunto de lutas importantes pelas populações, no sentido de garantir que os hospitais na Península de Setúbal respondam àquilo que são necessidades que, neste momento, não estão a ser respondidas.

Quanto à mobilidade, o que é que trouxe dos contactos efectuados e como vê esta questão na nossa região?

É fundamental dar um passo significativo no investimento no transporte público colectivo, cruzando esta questão com as questões ambientais. É importante recordar aquilo que foi o avanço quando se introduziu a questão do passe intermodal, reduzindo as tarifas e fazendo uma normalização na Área Metropolitana de Lisboa. Mas é necessário continuar a fazer esse investimento, reforçar a resposta no domínio da ferrovia, no domínio do transporte rodoviário e também no transporte fluvial, corrigindo situações caricatas, como a situação da aquisição de embarcações eléctricas sem baterias, com prejuízos para o erário público. Em cima da mesa esteve também o caminho para a construção da terceira travessia sobre o Tejo, fazendo a ligação Barreiro-Chelas, uma ponte rodoferroviária, com impacto não apenas na região, mas também com impacto nacional porque permitiria facilitar a ligação Norte-Sul.

O que pode esperar o distrito de Setúbal desta União Europeia?

Olhe, nós diríamos que o contexto da construção da União Europeia não tem contribuído para a valorização do potencial, e tão grande que é, do nosso país e das nossas regiões, porque quando se determinam as políticas em favor da concentração dos apoios nos grandes grupos económicos que vão, ao fim e ao cabo, agregando a riqueza sem reinvestir essa riqueza, a região perde. E nós temos contactado com muitas pequenas e médias empresas, no comércio e na produção dos pequenos e médios agricultores que são afectados por estas políticas de concentração de fenómenos produtivos. O que seria necessário era que os fundos comunitários que estão ao dispor e os fundos do próprio orçamento nacional fossem mobilizados no sentido de valorizar e dar apoio àqueles que mais precisam: os micro, pequenos e médios empresários, as pequenas produções agrícolas ou o sector da pesca.

Crédito à habitação “Lucros obscenos da banca deviam pagar aumento das taxas de juro”

O eurodeputado comunista considera que existem “medidas e propostas que poderiam ser implementadas” para dar resposta aos problemas da população. E dá o exemplo da habitação. “É um tema que levámos a discussão ao Parlamento Europeu, era possível adoptar medidas que salvaguardassem o direito à habitação, evitando que haja penhoras face a este aumento brutal das taxas de juro”, atira. A solução, diz, está na banca. “Se se garantisse, através do banco público, taxas de spread que obrigassem, de certa forma, a banca privada a acompanhar e a reduzir o spread dos créditos à habitação. E que se colocassem esses lucros obscenos que são feitos à custa das famílias a pagar precisamente os aumentos das taxas de juro”, defende. Mas é preciso mais. “É necessário promover o aumento de salários, promover o aumento de pensões e estas não podem ser medidas avulso”, remata.

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