20 Abril 2024, Sábado
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Nuno Maia: “Precisamos de um programa operacional de 3,5 mil M€ para a Península de Setúbal”

O director-geral da AISET faz as contas ao volume de fundos comunitários de que a península necessita e tem capacidade para executar a partir de 2027

 

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Tem 56 anos, vai num segundo mandato como director-geral da Associação da Indústria da Península de Setúbal (AISET) e foi o principal rosto da “luta” encetada e ganha pela libertação da região do espartilho de Lisboa no que toca ao acesso a fundos comunitários. Nuno Maia foi o ponta-de-lança do território da margem sul no processo que levou à criação da NUTS Península de Setúbal.

Em entrevista à Popular FM/O SETUBALENSE, passa em revista alguns desses principais momentos, reparte méritos e projecta o trilho que deve ser percorrido num futuro próximo para que a região possa encetar um desenvolvimento económico-social que lhe é devido.

Foi escolhido por O SETUBALENSE como figura do ano do distrito. Que significado tem para si este reconhecimento?

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Embora o simbolismo destas nomeações seja significativo, ainda para mais quando vem de uma instituição como O SETUBALENSE, o jornal mais antigo do continente, uma referência para gerações de habitantes daqui da região, que é muito lido e considerado, esta nomeação mostra sobretudo a valência, a importância do que está por detrás da nomeação. Não é a nomeação que é importante. O importante aqui é termos conseguido vencer esta etapa, por termos de novo possibilidade de haver financiamento comunitário relevante para Setúbal. Neste processo, sou aquilo que se poderia dizer: um herói acidental, nada mais do que isso.

Em algum momento pensou que a luta pela criação da NUTS Península de Setúbal poderia tornar-se inglória?

(…) O meu silêncio não é ocasional, é propositado porque houve alguns dias em que pensei que seria extraordinariamente difícil que o processo avançasse. Concretamente umas semanas após as eleições autárquicas de 2021. Fizemos um grande esforço para que este fosse o tema central ou um dos temas centrais da campanha autárquica, percebemos que todos os candidatos e todos os autarcas estavam focados nisto e que atribuíam o devido peso a este processo político. Embora o tema fosse talvez demasiado árido para a população e para entrar no discurso principal das campanhas. Foi um tema mencionado, mas de segunda ordem. Depois das autárquicas, tinha muita dificuldade em o colocar na agenda [política] e havia também um certo cansaço mediático. Quando se fala 20 vezes sobre o mesmo tema, chega-se a um momento em que o próprio ciclo noticioso começa a não responder. Portanto, tinha sempre de haver alguma novidade no processo. No final de Outubro princípios de Novembro, fiquei um pouco mais desalentado.

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Até que…

Houve a queda do Governo e novas eleições, o que veio então colocar o assunto completamente na agenda. Com um movimento de antecipação, politicamente muito inteligente, o primeiro-ministro numa visita à Autoeuropa, ainda na pré-campanha, anunciou unilateralmente que este processo iria decorrer e a partir daí a questão foi muito mais saber como e quando, porque sabíamos que havia um “deadline” para isto acontecer. Tinha de acontecer a comunicação ao Eurostat até 1 de Fevereiro de 2022. Acho que foi uma decisão sábia e do ponto de vista político, do primeiro-ministro, no caso candidato do Partido Socialista, foi inteligente tomar uma medida de política pública que tinha vantagens económicas duradouras para a região e vantagens eleitorais. Acho que foi um trunfo eleitoral bastante bem jogado.

E qual foi o ponto em todo este processo, ainda antes do anúncio de António Costa, em que considerou que os esforços desenvolvidos tinham causado verdadeiramente efeito?

Quando cheguei à AISET, em 2018, já havia a Plataforma por Setúbal que juntava a AISET, a ACISTDS, o movimento Pensar Setúbal e a Cáritas Diocesana. Estava já em curso um estudo estatístico e econométrico elaborado pelo doutor Carlos Martins, que era à altura colaborador da AISET, para demonstrar a variação de rendimento e riqueza que havia entre a península e as outras NUTS do País.

Depois há um primeiro momento definidor em Setembro de 2019, quando fizemos um fórum empresarial no Luísa Todi em Setúbal em que convidámos os cabeças-de-lista dos cinco partidos que na altura tinham representação parlamentar pelo distrito e o assunto nesse dia passou da segunda para a primeira divisão. Porque tiveram de se pronunciar publicamente sobre isso e a sessão foi encerrada pelo ministro da Economia, na altura Pedro Siza Vieira, que percebeu perfeitamente o problema. Presumo que terá industriado junto do Governo para que as coisas começassem a andar de outra forma. Isso marcou uma maioridade do processo.

Depois em Julho de 2021 também fizemos um evento muito significativo na Faculdade de Ciências e Tecnologia [FCT] da Nova, com a apresentação de uma carta aberta ao primeiro-ministro em que dizíamos que havia um grande consenso social e partidário, por favor actue. Foi um momento de escalada muito significativa do processo.

Destacou, em artigo publicado na sexta-feira, o papel de algumas pessoas que considerou preponderantes no processo.

Achei por bem evidenciar Ana Catarina Mendes e Eurídice Pereira, foram as principais interlocutoras que tive neste processo. Depois os académicos, o professor Pedro Dominguinhos, foi um companheiro de longa duração nesta maratona, a professora Ângela Lemos [que substituiu Dominguinhos à frente do IPS], e o professor Cruz Machado, que era à época director da FCT. E depois evidencio duas pessoas que, não sendo titulares de cargos públicos nem tendo mandatos para exercer em nome da população, tiveram uma actuação muito relevante. Maria Amélia Antunes, que fez um estudo jurídico para elaborar legislação que depois distribuímos aos grupos parlamentares, e Guy Villax, da empresa Hovione, que teve um posicionamento estratégico muito activo.

O acesso a fundos comunitários só poderá efetivar-se daqui por uns anos. Até lá acha que as démarches do Governo podem promover uma discriminação positiva que ajude o desenvolvimento económico da região?

Essa é talvez a primeira reflexão que temos de fazer. Não podemos descansar por termos vencido uma etapa, que só começará a surtir efeito prático no território e na economia a partir de 2029 ou 2030. Até lá, achamos fundamental haver um conjunto de medidas do Governo. É o Governo que tem de encontrar dentro dos fundos que estão disponíveis, quer do PRR quer do PT 2030, maneira de fazer alguma reprogramação que permita ao longo destes próximos seis ou sete anos que cheguem alguns fundos à região. Temos a experiência de que o País devolve sempre a Bruxelas ao final de cada quadro comunitário de apoio algum dinheiro que não foi gasto. Não temos nenhuma razão para tornar o PT 2030 e o PRR uma vaca sagrada, em que não se pode mexer numa alínea.

Do PT 2020 para o PT 2030 há uma grande queda de fundos, praticamente de metade para a área da Grande Lisboa. Para a NUTS II que existe neste momento para o PT 2030 há apenas 400 milhões de euros a dividir por sete anos e por 18 municípios. Isto não chega bem a dois milhões de euros por ano por município, o que não dá sequer para uma boa rotunda. Tem de vir dinheiro de outro lado e estes 400 milhões têm de ser repartidos de uma forma mais equitativa. Os municípios mais ricos provavelmente terão de ser limitados na capacidade de usar estes fundos.

Com tantos anos que a península esteve sem investimento comparticipado, temos a certeza de que os fundos que vierem serão rapidamente candidatados e aparecerão projectos para os utilizar. Ao contrário do que parece estar a acontecer no resto do País, em que há dinheiro do PRR mas que não há projectos ou capacidade de execução para consumir esses fundos.

É caso para dizer: mandem para cá os fundos que sabemos o que havemos de fazer.

Em 2009, a península investiu 500 milhões de euros. Portanto, depois de estarmos 10 ou 12 anos com níveis de investimento mais baixos, porque a comparticipação foi caindo, é fácil de perceber que – e perante os desafios que temos de descarbonização, digitalização, etc. – conseguiremos investir esses 500 milhões outra vez, que conseguiremos manter esse nível. Em sete anos, se forem 500 milhões [por ano], são 3,5 mil milhões de euros. Temos aqui uma magnitude daquilo que precisaríamos para um programa operacional para a Península de Setúbal, a partir de 2027.

Do sonho diplomata à AISET com paixão pelos toiros

Ainda tem presente os motivos que um dia o trouxeram a Setúbal? Foi amor à primeira vista?

Tenho uma relação de longa memória com Setúbal. Ainda sou dos que andaram de hovercraft para Troia e tenho uma memória sempre muito grata, muito positiva, do princípio do empreendimento de Troia, de lá ir. O meu pai era fotógrafo e ganhou vários prémios de fotografia do Diário Popular, com direito a estadias em Alvor ou em Troia. Depois, trabalhei muito em várias áreas e umas semanas antes de começar a trabalhar na Secil, em 2004, passei a vir todos os fins-de-semana passear para a região, para perceber o seu contexto.

Não há fim-de-semana que não acabe por vir a Setúbal. Conheço bem a região, que tem um potencial fantástico. Por razões pessoais, também passo muito tempo em Alcochete. Toda a península tem um enormíssimo potencial, características únicas no País e pode ser um território de absoluta excelência. Assim nós queiramos e trabalhemos para isso.

Viria a enveredar pela área da comunicação institucional…

Sim. Fui dirigente associativo muitos anos enquanto estudei e isso levou-me inevitavelmente para funções de comunicação. Comecei a minha vida profissional nessa área, tive a felicidade de ser director do Cartão Jovem, no princípio dos anos de 1990, na altura era um projecto muito emblemático em Portugal e foi uma iniciativa muito meritória (lá está, uma política pública bem desenhada, bem pensada, bem aplicada, que ainda hoje existe). Pensava ser diplomata, mas acabei por me desinteressar. Estive também alguns anos numa das partes da actual Mota-Engil, acompanhei a obra do Oceanário desde as primeiras estacas até à festa de inauguração no dia 23 de Maio de 1998. Acompanhei a construção de autoestradas, de barragens… o que me deu alguma bagagem para o sector da construção. Depois comecei a representar a Secil e mais tarde foi decidido que eu poderia ser o director-geral eleito [da AISET] pelos associados, que aconteceu em Março de 2018 pela primeira vez. E pela segunda vez em Março de 2021.

E está na forja um terceiro mandato?

Temos de analisar. O mandato prolonga-se até Março de 2024. O mandato é da Secil e eu sou o seu representante. Mas posso não ser e pode não ser a Secil a manter-se. É algo que terá de ser decidido, em sede de assembleia geral pelos associados da AISET. A Secil é que determinará se continuo ou não [como seu representante]. Tenciono continuar na Secil, dá-me muito trabalho para fazer, um trabalho que gosto muito de fazer e acho que a empresa tem um perfil extraordinário nesta área da responsabilidade social, sustentabilidade e de relação com a comunidade. Vou estar na Secil, seguramente.

Dizia há pouco que passa muito tempo em Alcochete. Alguma razão em particular?

Uma razão sentimental, a minha namorada mora em Alcochete. Acho que é o local da Área Metropolitana de Lisboa onde se tem o mais fantástico Pôr do Sol e tem uma vivência muito interessante. É uma vila muito pacata e que tem umas fantásticas Festas do Barrete Verde [e das Salinas].

É adepto da tauromaquia?

Sou. Temos o saudável hábito de correr toiros bravos aqui na região, na Moita, no Montijo, em Alcochete, na Aldeia de Paio Pires, no Gaio e no Rosário. Acho que é uma tradição cultural. Independentemente das modas e das perspectivas divergentes, é algo que, enquanto houver pessoas que assim pensam e assim sentem, tem de ser preservado, mantido e defendido. Há valores culturais e comunitários muito importantes associados a isso. E parece-me que uma excessiva perspectiva animalista não se justifica. Sou um grande aficionado.

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